Reflexão sobre o livre-Arbítrio no Éden e na Eternidade

Reflexão sobre o livre-Arbítrio  no Éden e na Eternidade


De acordo com a Palavra de Deus, havia a possibilidade real para que Adão e Eva optassem pelo pecado, mas, para o povo de Deus no novo céu e nova terra, essa possibilidade será tão real como o foi no Éden?

No Éden, Adão e Eva exerceram livremente sua capacidade de escolha, optando por desobedecer à ordem divina. Já em relação ao estado eterno dos redimidos, surge a indagação: se o homem será dotado de livre-arbítrio, haverá ainda a possibilidade de queda?

1. Livre-Arbítrio como doutrina bíblica. O conceito de livre-arbítrio está presente nas Escrituras como a capacidade do ser humano de responder a Deus em obediência ou rebeldia. Desde o mandamento dado no Éden (Gn 2.16,17), passando pelas exortações de escolha (Dt 30.19; Js 24.15) até o convite evangélico à fé em Cristo (Jo 3.16; Ap 22.17), a Bíblia apresenta o homem como agente moralmente responsável.

Tomás de Aquino, em sua Suma Teológica (I, q. 83), afirma que o livre-arbítrio é um atributo natural do homem, pois este é dotado de razão e vontade. Para ele, a liberdade consiste na capacidade de escolher em conformidade com a reta razão, e não na possibilidade de optar pelo mal como fim último.

Séculos depois, Jacó Armínio reforçou essa visão ao afirmar que o livre-arbítrio é indispensável à responsabilidade moral. Em suas Declarações de Sentimentos (1608), ele sublinhou que Deus, em Sua graça preveniente, capacita o ser humano a responder ao chamado divino, preservando a liberdade humana sem negar a soberania divina. Na mesma linha, John Wesley, influenciado por Armínio, destacou que o livre-arbítrio é restaurado pela graça preveniente de Deus, de modo que todo homem pode aceitar ou rejeitar a salvação. Para Wesley, a verdadeira liberdade é a capacidade de escolher o bem em resposta à graça de Deus.

2. A soberania de Deus e a liberdade humana. A Escritura apresenta Deus como absolutamente soberano (Salmos 115.3; Isaías 46.10), mas, ao mesmo tempo, responsabiliza o homem por suas escolhas (Ezequiel 18.30-32). Essa relação complexa foi debatida ao longo da história teológica. Armínio rejeitou a ideia de que a soberania de Deus determinasse de forma absoluta todas as ações humanas. Para ele, a soberania divina é compatível com a liberdade da criatura, pois Deus soberanamente escolheu criar o homem livre e lidar com ele como agente moral. Roger E. Olson, em Arminian Theology: Myths and Realities (2006), ressalta que a tradição arminiana sustenta um modelo de soberania que não é determinista, mas relacional, onde Deus guia a história sem violar a liberdade humana.

Wesley, em sua teologia prática, ecoou essa mesma compreensão, ao afirmar que a graça de Deus “não anula a liberdade, mas a liberta para escolher o bem”. Assim, soberania e livre-arbítrio não são forças opostas, mas realidades que se harmonizam no plano redentor.

3. O tentador no Éden e a ausência do mal na Eternidade. No Éden, a possibilidade da queda esteve relacionada não apenas à liberdade de escolha de Adão e Eva, mas também à presença do tentador. Satanás introduziu a dúvida e a sedução (Gênesis 3.1-6), levando o homem a transgredir. Na Eternidade, essa condição será radicalmente diferente. O Apocalipse declara que o Diabo será lançado definitivamente no lago de fogo (Apocalipse 20.10) e que na Nova Jerusalém não entrará nada impuro (Apocalipse 21.27). A ausência do tentador elimina a possibilidade externa de corrupção. Além disso, como observa Wesley em seus sermões sobre a santificação plena, a redenção em Cristo culmina na transformação total da natureza humana, que será semelhante à de Cristo (1 João 3.2; Filipenses 3.21). O livre-arbítrio não desaparecerá, mas será plenamente conformado à vontade divina.

No Éden havia a real possibilidade de pecado devido à presença do tentador e à liberdade de escolha de Adão e Eva. Contudo, no Novo Céu e Nova Terra, o livre-arbítrio dos redimidos será preservado em um estado glorificado, sem a presença do mal e sem a inclinação interna ao pecado.

Referências

AQUINO, Tomás de. Suma Teológica. São Paulo: Loyola, 2005.

ARMINIUS, Jacob. The Works of James Arminius. Grand Rapids: Baker, 1986.

OLSON, Roger E. Arminian Theology: Myths and Realities. Downers Grove: IVP Academic, 2006.

WESLEY, John. Sermons on Several Occasions. London: Epworth Press, 1984.

por Esdras Cabral de Melo

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