Como Potifar poderia ser eunuco se o seu estado civil era o de casado?

Como Potifar poderia ser eunuco se o seu estado civil era o de casado?

Lemos em Gênesis que Potifar, capitão da guarda do faraó, era um homem eunuco, mas ele também era casado. Afinal, o termo indicava apenas algum cargo administrativo ou identificava a sua condição física?

No antigo Oriente, os eunucos geralmente serviam os haréns, isto é, na parte dos palácios onde os reis mantinham as mulheres. Com o tempo, o termo passou a ser usado para o cargo de confiança do rei. No hebraico, o termo é saris, que literalmente significa “castrado”, mas também se refere a “oficial” e aparece 45 vezes no Antigo Testamento; no grego, é eunukos. A Septuaginta traduz saris por eunukos 30 vezes, mas também por spadon, “eunuco”; dunastes, “aquele em alta posição”; archieunukos, “chefe dos eunucos”; e nomes próprios como Pafis, “Rabsaqué”; Nabousaris, “Rabe-saris”. Vemos, então, que a palavra em português tem sua etimologia do grego.

Lemos em Gênesis 37.36 Potifar apresentado como saris, eunuco, e sar hatabachim, com sentido de ser o oficial chefe que executa as pessoas. Mais adiante, em Gênesis 39, a informação se repete com o adicional de que Potifar, além de eunuco, saris (v. 1) e capitão da guarda do faraó (v. 1), é casado (v. 7). Assim, diante do seu estado civil e tipo de trabalho, entendemos que o uso do termo o aponta como um funcionário do rei do Egito e não para sua condição física. As versões TB, NAA, NVI, NVT, NTLH e NBV traduzem saris por “oficial”; somente a ARC traz “eunuco”, mas com a nota do tradutor de que é “oficial” também.

No caso de Daniel e seus amigos, a Bíblia conta que Aspenaz, o chefe dos eunucos, rav saris, era o responsável por eles na corte babilônica. O nome Aspenaz aparece somente uma vez (Daniel 1.3), e sua posição em referência a ele, rav saris, se repete sete vezes (Daniel 1. 7-11, 18). Não há indicação de que seja uma alusão à condição física. Por outro lado, no caso da história da rainha Ester, provavelmente o uso do termo indica um oficial e castrado (Ester 2.14), porque ele cuidava das mulheres, mas também aparecem oficiais, responsáveis pelo tesouro real, que não eram necessariamente castrados (Ester 6.2).

No Novo Testamento, eunukos, “eunuco”, aparece oito vezes: três na passagem de Mateus 19.12 e cinco em Atos 8.26-40. Jesus usa o termo “eunuco” três vezes num contexto sobre casamento e divórcio (Mateus 19.12). Ao mencionar os que nasceram eunucos, então refere-se à esterilidade do homem. Aqueles que foram feitos eunucos são os castrados. E os que se fizeram eunucos são os que escolheram o celibato. Portanto, não há sentido em entender eunuco como um oficial nessa passagem. Em Atos, Filipe prega a um “etíope, eunuco, alto oficial de Candace, rainha dos etíopes, o qual era superintendente de todo o seu tesouro” (Atos 8.27).

Portanto, para entender melhor o significado de “eunuco”, ou mesmo de outra palavra no texto bíblico, é preciso conhecer o significado do termo em hebraico e no grego e analisar o contexto. Dependendo da versão da Bíblia em português, a tradução já traz o sentido apropriado do uso da palavra para ajudar na leitura.

por Daniele Soares

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