Os batistas suecos eram em sua esmagadora maioria pré-milenistas e não calvinistas, e foram influenciados pelo pietismo
A história e a teologia das Assembleias de Deus no Brasil não apareceram no vácuo. Ou seja, seus conceitos e ensinos têm vínculos com antigos postulados teológicos adotados pelos pioneiros. Evidentemente, esses pioneiros pregavam e ensinavam sob a influência de sua formação bíblico-teológica inicial.
As experiências batistas de Gunnar Vingren (1896-1903) e
Daniel Berg (1899-1902) na Suécia
A denominação protestante batista da qual Gunnar Vingren,
Daniel Berg e outros missionários pioneiros faziam parte há tempo possuía sua própria
formulação doutrinária. Champlin e Bentes informam que a doutrina batista antecipada
na Assembleia de Londres (ou Segunda Confissão de Londres, de 1677) e a Confissão
de Filadélfia, de 1677, foram muito importantes para as igrejas batistas, bem
como para as igrejas presbiterianas e congregacionais.
Gunnar Vingren nasceu em 1879, em Östra Husby, Östergötland.
Por serem crentes batistas, seus pais procuraram, desde a sua infância,
ensinar-lhe a Bíblia. Quando Vingren ainda era bem pequeno, ia à Escola Dominical,
da qual seu pai era dirigente. Quando sentiu a chamada de Deus na sua vida,
Vingren era um menino de apenas 9 anos de idade. Ele sentia-se atraído por Deus
de uma forma especial e costumava orar muito. Às vezes, reunia outras crianças com
ele e orava com elas. Porém, com 12 anos de idade, desviou-se do evangelho. Segundo
narrou em seu diário, “caiu profundamente no pecado até os 17 anos, quando o Senhor
outra vez lhe chamou”. Isso aconteceu em 1896. Ele resolveu ir ao culto de
vigília de Ano-Novo e se entregar novamente ao Senhor. Foi com seu pai para
esse culto e fez o que havia resolvido.
Aos 18 anos, foi batizado nas águas numa igreja batista em Wraka,
Smaland em 1897. Neste mesmo ano, substituiu seu pai no trabalho da Escola
Dominical. “Isso aumentou muito a minha necessidade de Deus e de sua graça”,
conta. Ele continuou à frente da Escola Dominical até o fim de outubro de
1898. Depois de muitas orações dos crentes, foi para uma escola bíblica em
Götabro, Närke. Os dirigentes daquela escola eram os pastores Emílio Gustavsson
e C. J. A. Kihlstedt. Aquela escola bíblica durou somente um mês, porém foi-lhe
de grande proveito espiritual. Eram 55 participantes, homens e mulheres. A
escola fazia parte de uma Federação Evangélica que tinha como objetivo
conquistar pessoas para Cristo. Uns 15 alunos foram enviados como evangelistas.
Vingren declarou em sua autobiografia que os estudos ministrados pelos
profundos e fervorosos pastores-professores lhes fizeram bem por toda a sua vida.
Em 1903, ele se mudou para os Estados Unidos da América.
Daniel Berg nasceu em 1884, na pequena cidade de Vargön. Seus
pais eram batistas. Logo, procuraram educar o filho segundo os princípios
cristãos. Em 1899, quando contava 15 anos de idade, Daniel se converteu e foi
batizado nas águas na Igreja Batista de Ranum. Em 1902, aos 18 anos, pouco
antes do início da primavera nórdica, deixou seu país, rumo aos Estados Unidos
da América.
A experiência de Gunnar Vingren (1903-1904) e Daniel Berg
(1902-1908)
entre os batistas suecos nos EUA
Quando Gunnar Vingren chegou a Kansas City (Missouri),
Estados Unidos, em 19 de novembro de 1903, ele procurou seu tio Carl Vingren, que
havia sido missionário batista na China e que pastoreara a Primeira Igreja Batista
Sueca (atual Bemis Park Baptist) de Omanha, Nebraska, no período de 1898 a 1901.
Em Kansas City, Vingren pertenceu a uma igreja batista sueca da cidade, onde assistia
aos cultos regularmente.
Em fevereiro de 1904, Vingren viajou para St. Louis
(Missouri) e frequentou a igreja batista sueca local. Em 25 de março de 1902, Daniel
desembarcou em Boston. De Boston, viajou para Providence, Rhode Island, para se
encontrar com amigos suecos, que lhe conseguiram um emprego numa fazenda.
Permaneceu nos Estados Unidos por sete anos, onde se especializou como fundidor.
Com saudades do lar, retornou à cidade natal, na Suécia.
A formação teológica de Gunnar Vingren no Seminário
Batista Sueco de
Chicago (1904-1909)
Os irmãos batistas aconselharam Vingren a ingressar no
seminário da denominação batista sueca em Chicago, no ano de 1904. Seus mestres
no Seminário Batista Sueco nos EUA foram Eric Sandell, N. N. Morten, Olof
Hedeen e W. A. Peterson. Eric Sandell, além de ter sido notável pastor em três
igrejas e educador entre os batistas suecos, era destacado como filósofo e
profundo pensador. Ele colocava a Palavra de Deus em seu lugar supremo e a
mensagem do Cristo crucificado era o seu tema. Olof Hedeen, professor de Grego
e Interpretação do Novo Testamento, era um homem brilhante e fervoroso, do tipo
emocional e, segundo o historiador batista Adolf Olson, “inclinando-se para o pentecostalismo,
algumas vezes com o coração derramado, chegava ao topo da inspiração e
eloquência como professor e pregador”.
Vingren foi diplomado pelo Seminário Batista Sueco em 11 de
maio de 1909, após quase cinco anos de estudos teológicos. Este período da vida
de seminarista do pioneiro é tratado no livro O Tabernáculo e Suas Lições
por Gunnar Vingren, publicado em 2011 pela CPAD.
Gunnar Vingren pastoreia igrejas batistas suecas nos
Estados Unidos
De 1904 a 1909, Gunnar Vingren pregou muitas vezes em
diferentes igrejas e em diferentes lugares durante os seus estudos no Seminário
Teológico, como na Primeira Igreja Batista em Chicago, Michigan; e em Sycamore,
Illinois, e atuou
como pastor numa igreja batista sueca em Mountain, Michigan.
Em maio de 1909, após receber seu diploma de Teologia,
Gunnar Vingren entregou a solicitação para ser enviado como missionário da denominação
batista. Em
junho do mesmo ano, ele assumiu o pastorado da Primeira Igreja Batista de
Menominee, Michigan. Também visitou a Convenção Geral dos Batistas americanos,
onde foi resolvido que ele seria enviado como missionário a Assam, Índia,
juntamente com sua noiva, pela The Northern Baptist Convention. Após uma luta
interior, ele desistiu de ser missionário na Índia e, por este motivo, sua
noiva rompeu com ele. Uma irmã, que possuía o dom de interpretar línguas, foi
usada pelo Senhor e disse que Gunnar Vingren seria enviado ao campo missionário
somente depois de ser revestido de poder pelo batismo no Espírito Santo.
Em novembro de 1909, Gunnar Vingren foi à conferência batista
na Primeira Igreja Batista sueca em Chicago, com o propósito de buscar o batismo
com o Espírito Santo e com fogo. Após cinco dias de busca, Gunnar Vingren recebeu
o batismo no Espírito Santo e falou em outras línguas em Chicago. Várias irmãs oraram
para que Vingren recebesse o batismo no Espírito Santo.
Em fevereiro de 1910, Gunnar Vingren deixou o pastorado da Igreja
Batista de Menominee, Michigan, e assumiu o pastorado da Igreja Batista de
South Bend, Indiana, e esta igreja aceitou o ensino do batismo no Espírito, tendo
quase vinte pessoas sido batizadas. Em outubro deste ano, Gunnar Vingren deixou
o pastorado da Igreja Batista de South Bend, Indiana, para ser missionário no
Brasil juntamente com Daniel Berg.
As fortes convicções doutrinárias pietistas dos batistas
suecos dos quais
Gunnar Vingren e Daniel Berg fizeram parte
A maior parte dos batistas na Suécia e nos Estados Unidos partilhavam
do movimento evangélico petista, que foi um esforço em renovar as igrejas
protestantes luteranas, especialmente na Alemanha no século 17, um século após a
Reforma Protestante. Por essa razão, eles adotavam completamente as ênfases pietistas
no relacionamento pessoal com Deus de uma vida transformada, na Bíblia como autoridade
e guia, e acrescentaram uma nova intensidade no evangelismo. As principais características
e ensinos bíblicos dos batistas suecos com bases pietistas são:
1) Uma fé inabalável – Por ser considerado dissidente
religioso, o imigrante batista sueco nos Estados Unidos logo desenvolveu uma
robusta e destacada independência de fé e pensamento, uma característica que
encontrou solo fértil na região fronteira americana. Eles reconheciam a
“inabalável” fé de seus pais. Não há dúvida sobre a firmeza deles, mas o que
era tido como “fé inabalável” nem sempre foi crença, mas pura teimosia. Cada um
permaneceu inflexível em sua própria interpretação da Bíblia. Com convicções
tão intensas, não era estranho que muitos dos pioneiros acreditassem que só os batistas
eram o povo escolhido de Deus. A cooperação com outros, que não obedeciam às Escrituras,
nunca poderia ser considerada seriamente.
2) A Palavra de Deus – Os batistas suecos eram
estudiosos da Bíblia. Eles tinham uma fé inabalável na Palavra de Deus. Os ensinos
fundamentais do pecado e da graça, regeneração e justificação, céu e inferno,
eram debatidos. A pergunta mais importante era: “O que a Bíblia diz sobre isso?”.
O membro médio da igreja tinha um bom conhecimento da Bíblia. Esse foi
praticamente o único livro a ser encontrado na casa de um crente pioneiro. Ele o
havia lido como um dos livros de texto nas escolas públicas da Suécia, bem como
em sua casa e enquanto estava confinado na prisão por causa de sua fé. Muitos dos
veteranos poderiam repetir capítulo após capítulo de memória. De acordo com uma
declaração de Olof Bodien, as prisões estatais da Suécia foram os primeiros
seminários teológicos dos batistas suecos. “Um pregador naqueles dias não sabia
como dividir seu sermão adequadamente em primeiro, segundo e terceiro pontos
com subdivisões, mas seus sermões estavam cheios da Palavra de Deus. Cada
sermão era inundado, do começo ao fim, com citações da Bíblia”.
3) O pecado e a condenação eterna – O crente pioneiro
batista sueco era um diamante bruto que talvez não tivesse sido muito polido
nas coisas mais finas da vida, mas ele tinha um senso aguçado da terrível
realidade do pecado com sua culpa e a condenação eterna. Eles temiam a ira de Deus
e tremiam, como a
antiga congregação de Jonathan Edwards, enquanto ouviam o pregador em palavras
intensas retratando “o pecador nas mãos de um Deus irado”. Não é de admirar que
“a antiga rude cruz” se tornasse atraente. Foi colocada no centro
de sua teologia. Ouça Gustaf Palmquist em sua mensagem pastoral à igreja em
Rock Island: “Frequentemente nossos corações e línguas cantaram unidos o louvor
Àquele que morreu por nós, e com grande alegria lembro-me de nossas meditações
sobre o fato da redenção, as boas novas aos pobres pecadores perdidos – Jesus morreu
em seu lugar, Jesus morreu em nosso lugar; Jesus, nosso Salvador. Irmãos e irmãs,
gostaria de levantar minha voz para ser ouvido de Nova York até mesmo a vocês,
e clamar: ‘Jesus morreu em seu lugar, Jesus ressuscitou para sua justificação
– isso não é suficiente?’”. De milhares de corações humildes de batistas suecos
na fronteira podiam ser ouvidos, por assim dizer, ascendendo aos próprios portões
do céu, um alto “Amém!”.
4) A conversão e a expiação substitutiva de Jesus –
Os batistas suecos concordavam com os luteranos em sua ênfase nos aspectos
substitutivos e penais da expiação. Era questionado, no entanto, devido à influência
de um ultraevangelicalismo do movimento läsare (leitores), se não havia algo de
uma fé desequilibrada em Cristo como o substituto do pecador às custas de
Cristo como um exemplo para o crente. Isso pode explicar em parte a oposição que
Palmquist experimentou dos metodistas. Em relação a uma expiação limitada, ou particular
– que alguns dos batistas americanos, incluindo a Igreja dos Mariners em Nova
York, defenderam ao extremo, a ponto de torná-la uma condição da membresia da igreja
–, tanto Wiberg quanto Palmquist acreditavam que isso era antibíblico e um
obstáculo na maneira de proclamar o evangelho a todas as criaturas. No entanto,
por meio de uma apreciação profunda do valor redentor de Calvário e os
sofrimentos e morte do Senhor Jesus, haveria pouco lugar para o tipo de
conversão frágil, superficial e abalável.
5) O novo nascimento e a salvação – Os fundadores batistas
suecos
acreditavam no novo nascimento. O que a Bíblia diz sobre o novo nascimento era uma
questão vital. “Você nasceu de novo? Você é um filho de Deus?” – essas eram perguntas
que deviam ser respondidas para se obter a membresia numa igreja. O crente tinha
que saber exatamente qual passagem da Bíblia devia ser usada como fundamento
para sua fé em Cristo. Ele tinha que relatar o lugar, a hora e as circunstâncias
em que experimentou o que chamou de sua “salvação”. O ensino luterano da regeneração
na aspersão de crianças era para os batistas pura superstição e o pior tipo de
heresia.
6) A predestinação e a eleição – Na doutrina da predestinação
e na eleição, muitos – não todos – dos fundadores dos batistas suecos nos EUA
foram atraídos pelo calvinismo e influenciados em grande parte pela teologia
reformada. Wiberg, em particular, foi um ferrenho defensor da doutrina da
eleição calvinista. Em uma carta de 18 de agosto de 1853, ele escreve a
Palmquist: “Estou me tornando mais convencido de que uma alma verdadeiramente
nascida de novo nunca pode se perder. As próprias advertências a respeito da
apostasia dirigidas aos verdadeiros crentes tornam-se um preservativo divino e
seguro contra a apostasia final”. Neste ponto, Palmquist não caminhou com seu amigo,
pois não conseguia acreditar que uma alma salva nunca pudesse se perder para
sempre. Ele admitia, entretanto, que “casos de apostasia final de verdadeiros crentes
são muito raros, se é que ocorrem”. F. O. Nilsson foi repreendido pela igreja
de Scandia por pregar uma visão extrema da doutrina da eleição. Aparentemente,
ele era da mesma opinião de Wiberg sobre o assunto. Os líderes posteriores entre
os batistas suecos em geral se tornaram expoentes de um tipo modicado de
calvinismo, alguns com maior ênfase no fator humano na salvação e outros
enfatizando a predestinação.
7) O pré-milenismo e a vida eterna – O fato de sua
habitação terrena ser apenas uma casa de grama primitiva no sertão no Oeste ou
uma cabana rústica de toras na floresta densa não desencorajou em nada os
pioneiros batistas suecos, pois eles eram apenas peregrinos e estrangeiros na terra,
esperando pela cidade com muitas e permanentes mansões e pela terra dos dias
eternos. O céu era uma realidade viva para os crentes batistas suecos da região
dos estados da fronteira. E embora seu corpo pudesse ter se dobrado sob o peso
do trabalho e dos cuidados da vida, havia uma canção de vitória no coração deles.
Do ponto de vista pós-milênio, Wiberg acreditava firmemente na vitória final
do Reino de Deus. Mas, com a chegada de Edgren e seu seminário teológico, a concepção
pré-milenista prevaleceu entre os batistas suecos nos Estados Unidos.
Referências bibliográficas
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OLSON,
Adolf. A Centenary History – Baptist General Conference of America. Baptist
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por Isael de Araújo
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