Os pais e a autonomia dos filhos

Os pais e a autonomia dos filhos


A autonomia proporciona à pessoa o status de adulto. Ninguém chega a ser um adulto autônomo, equilibrado por si só. Ser autônomo equilibrado, sabendo governar-se pelos seus próprios meios, é resultado de um processo ligado ao desenvolvimento do ser humano: físico, mental, emocional, moral e espiritual que começa muito cedo, desde a concepção, quando já recebem influências da dinâmica externa da mãe, ao nascer e durante toda a infância e adolescência, chegando à idade adulta. Então, estarão fortalecidos no conhecimento, aptos para exercerem a autonomia que conquistaram, com dignidade, podendo, ainda, transmitir aos seus descendentes os valores aprendidos.

“Tão somente guarda-te a ti mesmo e guarda bem a tua alma, que te não esqueças daquelas coisas que os teus olhos têm visto, e se não apartem do teu coração todos os dias da tua vida, e as farás saber a teus filhos e aos filhos de teus filhos” (Deuteronômio 4.9).

A autonomia garante o uso da independência de maneira adequada e ponderada nos seus relacionamentos em sociedade. Ela é fruto da consciência que a pessoa desenvolve das regras e valores que assimila do seu ambiente, seguindo-as intencionalmente e voluntariamente.

O início da construção da autonomia implica inúmeros fatores, começa e se concretiza no lar, estendendo-se na caminhada da vida. Quando bem pequeninos, os pais, atentos, procuram entender as possibilidades físicas, cognitivas e de temperamento da criança em cada fase do seu desenvolvimento, e desenvolvem de forma clara para si os critérios: “pode/não pode”, que serão aplicados e terão consequências na conceituação da liberdade pessoal.

Existe muita diferença entre pais que transmitem ao filho o verdadeiro conceito da liberdade, após refletirem e ponderarem, tendo atitudes coerentes, e daqueles que, sem parâmetros bem definidos para si e para cumprirem o seu papel de treinador do filho, exigem demais, ou de menos, gerando revolta ou ainda daqueles pais que, muito permissivos, não colocam parâmetros ao comportamento dos filhos, deixando-os funcionar do jeito que quiserem, mesmo inadequadamente, sugerindo que por amor e para garantir o amor dos filhos, assim o fazem.

Educar dá muito trabalho. Muitas vezes as permissões fáceis provém da vida agitada que levamos, da correria do dia a dia, com muito trabalho, da impaciência, do cansaço, falta de tempo ou dificuldade em colocar prioridade. Da preguiça, do comodismo, da perda de referência dos pais para educar, do mau uso da tecnologia onde pais e filhos estão presos aos celulares, internet, redes sociais, jogos e etc. deixando o tempo passar com o mundo virtual, tão prazeroso, que “prioridade” fica sempre para depois.

Pai e mãe precisam manter atitudes coerentes com os valores que norteiam os seus comportamentos e que querem imprimir aos seus filhos, mantendo entre si, firme concordância para estabelecer limites e normas. O que vale para a mamãe, vale também para o papai e seu houver discordância, não deve ser discutida e ajustada na presença dos filhos, mas secretamente. Fica muito difícil para a criança entender e respeitar as colocações dos pais quando o pai diz uma coisa e a mãe diz outra. Ou o Filho fica confuso em relação ao que deve fazer ou, quase sempre, tira vantagem da melhor posição segundo as suas próprias conveniências, usando aquilo que aprende a seu favor e não para o propósito original de desenvolver o equilíbrio e maturidade para a vida de adulto.

Os pais devem delegar ao filho tarefas que ele já tenha capacidade de cumprir, levando sempre em conta o seu momento cognitivo. Exigir demais não leva à motivação. Deve-se iniciar com pequenas atividades, com uma frequência determinada, integrando a rotina da criança, fixando pequenas responsabilidades diárias. Ajudá-lo somente até o exato ponto de que ele precisa para que, depois, realize sozinho suas tarefas. É assim que o filho adquire autoconfiança, maturidade, responsabilidade e estará construindo a sua autoestima. O que ele aprendeu, é uma conquista dele.

Nestes momentos os pais têm uma função superimportante na formação e incentivo para a autonomia dos filhos: são treinadores!

Fazer tudo para eles não é prova de amor, é tirar deles a possibilidade de desenvolver a sua autonomia, mantendo dependência perniciosa, além de diminuir a autoestima, leva a criança a deslocar a sensação do prazer que seria obtida ao realizar algo, para a do mero receber. Ela se torna uma criança sempre pedindo, (qualquer coisa) o que importa é ganhar tudo “pronto”. Algumas atitudes dos pais boicotam a capacidade da criança de ser mais independente, e posteriormente autônoma. Levados pelo amor incondicional, para não vê-los sofrer, ou até pela pressa, os pais acabam fazendo por eles, resolvendo por eles, escolhendo por eles, comprometendo a oportunidade que as crianças teriam de aprender a resolver pequenos problemas, lidar com as frustrações, desenvolver resiliência tão importante para o equilíbrio emocional e autonomia de ação. Triste, porque quando adulto, terão de enfrentar estes embates às vezes com problemas maiores, que os pais não poderão ajudá-los e, então, encontrarão dificuldades para usar ferramentas apropriadas.

É desejo pessoal de todo pai e mãe ver seus filhos se tornarem adultos saudáveis em todos os sentidos. Apenas ter boas intenções não garante o sucesso nessa tarefa, que é complexa e exige muita reflexão, disposição e persistência. Por se tratar de um processo, não alcançamos o objetivo imediatamente, mas podemos colher bons frutos já enquanto os preparamos para a vida adulta. Fazemos isso sendo coerentes naquilo que ensinamos, não só passando a eles a informação, mas vivendo com eles os valores éticos que ensinamos, de maneira clara e firme para pautar as suas atitudes. Foi atribuído a nós, pais cristãos, a responsabilidade de ensiná-los observando os padrões bíblicos para a formação do quadro de valores que nortearão o seu comportamento. “Instrui o menino no caminho em que deve andar, e, até quando envelhecer, não se desviará dele” (Provérbios 22.6).

Tenho visto com frequência no meu trabalho pais reclamando dos seus filhos, que, com quatro/cinco anos de idade e até adolescentes, estão dominando o ambiente com as suas vontades e intransigências, são voluntariosos, sabem argumentar e contra-argumentar, se posicionam como adultos arrogantes que sabem tudo, não aceitam opiniões e muito menos ordens (inconsequentes) é claro, e em muitos casos os pais se curvam à tirania dos filhos, seguram e se responsabilizam pelas consequências. O filho não se preocupa com esse “pequeno detalhe”, os pais ficam com ela, resolvem a situação criada pelo filho, com a preocupação em não sufocar a sua capacidade para tomar iniciativa, evitar sofrimento, não entristecê-los, julgando estar dando chance ao filho de aprendizagem. O prognóstico deste quadro, se não for corrigido, é preocupante. O filho e os seus pais poderão ter problemas recorrentes de atitudes precipitadas do filho e os pais, correndo atrás do prejuízo.

Na verdade, os pais sentem-se perdidos com muita vontade de acertar. Suas reações nem sempre são parecidas. Para eles, é muito doloroso reconhecer a realidade. Mantém-se omissos e perdem tempo e oportunidade para reverter o quadro. Esta tarefa será possível com sabedoria, graça, compreensão e Amor de Deus. Mas o que pode ser feito? Devemos orar por eles; valorizar os bons comportamentos que eles são capazes de demonstrar; manifestar sempre a importância que eles têm para Deus, para você, igreja e sociedade; e manter aberto o canal para o diálogo.

por Sônia Pires

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