Qual a relação dos judeus do período de Jesus que foram alvos das críticas do Mestre com as mortes de Abel e Zacarias, conforme passagem de Lucas 11.51?
Os assassinatos de Abel e Zacarias (Gênesis 4.8; 2 Crônicas 24.20-22) são tomados por Jesus como símbolos do martírio de todos os profetas do Antigo Testamento. Os judeus religiosos do período messiânico, representados principalmente pelos escribas e fariseus, estavam cometendo pecados ainda mais graves que seus pais, sem nenhum sinal de arrependimento. Eram absolutamente hostis com o Messias – a quem constantemente planejavam matar – e seriam implacáveis perseguidores dos Seus seguidores, levando muitos deles à morte (Mateus 23.34). Com isso, completavam a medida da culpa nacional, fazendo com que a ira de Deus viesse sobre aquela geração (Mateus 23.32,35,36), tendo como clímax a destruição de Jerusalém no ano 70 d.C.
Portanto, a relação dos judeus dos tempos de Jesus com as
mortes de Abel e Zacarias era o fato de que seus pecados se comunicavam com os
pecados de seus pais. O castigo viria, então, não por uma transmissão de culpa,
mas por uma comunicação de culpa, ante a prática reiterada de perseguição e
morte aos profetas de Deus, agravada pela extrema hipocrisia religiosa
assistida naqueles dias. O contexto de Lucas 11.51, assim como o de Mateus
23.35, mostra-nos a extensão e a gravidade dos pecados daquela geração (cf. Mateus
23.1-39 e Lucas 11.37-54), que se apresentava como “a mais culpada de todas e
sobre a qual todo o juízo divino [seria] derramado” (KEENER, 2017, p. 118).
Matthew Henry (2008, p. 304) trata dessa relação de culpa
afirmando que “os filhos enchem a medida dos pecados dos seus pais, depois de
mortos, quando persistem no mesmo comportamento. Aquela culpa nacional que traz
a destruição nacional é feita do pecado de muitos, em diversas épocas, e nas
sucessões das sociedades existe um placar em andamento; pois Deus adequadamente
examina a iniquidade dos pais nos filhos que seguem os seus passos”. Como
acentua Henry, a sentença foi proferida sobre aquela última geração dos judeus,
“cujo pecado em perseguir os apóstolos de Cristo excederia qualquer dos pecados
daquele tipo de que seus pais eram culpados, e assim trariam a ira sobre si
mesmos, ao extremo” (p. 618).
Um aspecto que também precisa ser observado é que, como analisa
Keener (p. 248), o texto em estudo trata da chamada “culpa de sangue”, que
afetava não apenas os indivíduos que praticavam o crime,
mas também toda
a comunidade, em conformidade com
o Antigo Testamento, que os judeus tanto arrogavam observar (Deuteronômio
21.1-9; 32.34; Salmos 79.10). Isso não significa, contudo, que estava havendo
uma espécie de substituição de culpados, com os filhos pagando por pais que teriam
ficado eximidos de culpa.
Além do juízo vindouro, os pais haviam sido
responsabilizados por seus pecados em seu tempo, e, agora, seus filhos seriam ainda
mais, por repetirem seus atos e com gravidade acentuada. Como complementa
Keener, “o juízo tem como base o fato de que, nessa geração, os pecados terríveis
dos ancestrais espirituais alcançariam seu ápice”. Este é o significado de
“plena medida”, conforme o Comentário Bíblico Pentecostal (CPAD, 2009, p.128): “[...]
assim como os antepassados foram punidos, assim também os escribas e fariseus
serão punidos por perseguirem e matarem Jesus e seus seguidores”.
Quando do julgamento de Jesus, a maldade e a obstinação
daquela geração levaram-na a bradar “O seu sangue caia sobre nós e sobre nossos
filhos” (Mateus 27.25), numa clara demonstração de compreensão do significado
da “culpa de sangue”, o que também demonstra a mais plena e perfeita justiça de
Deus em vingar os mártires.
Referências
KEENER, Craig. S. Comentário Histórico-Cultural da Bíblia.
Novo Testamento. 1. ed. São Paulo: Vida Nova, 2017.
HENRY, Matthew. Comentário Bíblico Novo Testamento.
Mateus a João. 1. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2008.
ARRINGTON, French L. e STRONSTAD, Roger. Comentário
Bíblico Pentecostal. Novo Testamento. Vol. 1. 4. ed. Rio de Janeiro: CPAD,
2009.
Comentário Bíblico do Novo Testamento. Aplicação Pessoal.
Vol. 1. 1. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2009.
por Silas Queiroz
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