O orvalho de Esaú

O orvalho de Esaú

Ainda que a Palavra de Deus tenha sido traduzida em diversas línguas enquanto outras aguardam por esse excelso presente, constitui igual regalo à alma o acesso ao texto em suas línguas originais. Como o sedento que busca a pureza das fontes, o pregador busca prover-se dos recursos linguísticos disponíveis para levar fielmente a mensagem do Altíssimo, conforme revelada. A língua estrangeira funciona quase como um segundo véu, que necessariamente precisa ser transposto para liberar o acesso às verdades divinas — e aqui fica a nossa gratidão a todos aqueles que venceram as etapas de tradução, comentário, organização em nossas tão queridas chaves e concordâncias bíblicas, numa época em que as facilidades da informática ainda não existiam. Que dizer dos editores, distribuidores, vendedores? Que dizer das ousadas “livrarias”, teimosamente fincadas em nossas igrejas, lutando por manter o objetivo da acessibilidade, e não do comércio ou lucro? Por todos os caminhos percorridos até que tenhamos hoje a possibilidade de comparar traduções e comentários diversos, honra seja dada ao Autor da Palavra, de cuja divulgação incumbe-se, cercando-a do zelo com que a faz cumprir.

Tais facilidades não devem obscurecer o cuidado bereano de refazer o percurso original para conferir fundamentos, especialmente no que concerne à mensagem da salvação (mensagem simples de ser transmitida e abraçada que envolve, contudo, conceitos teológicos profundos e inalteráveis). Revestem-se de menor importância as diferenças ocorridas na periferia desse núcleo doutrinário, bagagem de cada servo envolvido no cumprimento da grande comissão. De modo algum isso implica privilegiar porções da Bíblia, toda ela theopneustos, toda ela apta a transmitir a mensagem central. Também é preciso crer no intuito dos tradutores em cumprir da melhor maneira possível sua tarefa, escapando à condenação imposta a qualquer que acrescentar ou retirar mesmo um mínimo detalhe às Escrituras.

Assim chegamos ao orvalho de Esaú, filho abençoado por Isaque, embora não com as mesmas bênçãos que recaíram sobre Jacó, afinal, fora impuro e profano, desprezando o valor das coisas espirituais (Hebreus 12.16). Numa primeira etapa de uma tradução ultra literal do texto hebraico, teríamos o patriarca ministrando o seu filho da seguinte maneira: Então respondeu Isaque a Esaú dizendo: Eis que o tenho posto por senhor sobre ti, e todos os seus irmãos lhe tenho dado por servos; e de trigo e de mosto o tenho fortalecido; que te farei, pois, agora, meu filho? “E disse Esaú a seu pai: Tens uma só bênção, meu pai Abençoa-me também a mim, meu pai. E levantou Esaú a sua voz, e chorou. Então respondeu Isaque, seu pai, e disse-lhe: Eis que a tua habitação será nas gorduras da terra e no orvalho dos altos céus. E pela tua espada viverás, e ao teu irmão servirás. Acontecerá, porém, que quando te assenhoreares, então sacudirás o seu jugo do teu pescoço. E odiou a Jacó por causa daquela bênção, com que seu pai o tinha abençoado; e Esaú disse no seu coração: Chegar-se-ão os dias de luto de meu pai; e matarei a Jacó meu irmão” (Gênesis 27, Parashá Toledor da Torah). Observemos que os dois são abençoados, a bênção de Jacó contém um dos sinais da primogenitura — será senhor dos irmãos — Jacó recebe a bênção abraâmica — “abençoarei os que te abençoarem, amaldiçoarei os que...” —; Jacó recebe primeiramente as bênçãos dos céus (orvalho) e depois as da terra; Esaú recebe primeiramente as bênçãos da terra e depois as dos céus; e fica clara a impetração da primogenitura e a comunicação da herança dos patriarcas dada em Abraão para Jacó. Para Esaú, mesmo o aspecto negativo da servidão (os edomitas ficaram, por longos períodos, como servos dos israelitas: 2 Samuel 8.14; 1 Reis 22. 47 e ss) trazia a possibilidade de uma mudança, o que de fato aconteceu, quando a casa de Herodes, o idumeu, governou sobre Israel.

A existência dos idumeus, ou edomitas, estaria assegurada não fosse o incidente ocorrido na ocasião em que os descendentes de Jacó peregrinavam em direção à terra prometida e o covarde ataque de que foram alvo, especialmente os que vinham à retaguarda, notadamente os mais velhos, os fracos, as mulheres e as crianças. Acrescente-se a isso o horror que impunham a outras nações e o golpe desferido contra Jerusalém após a destruição pelos caldeus. O remanescente de Esaú foi punido por Deus com a extinção direta e indireta, pela assimilação dos órfãos e viúvas restantes por outros povos (Jeremias 49.11) e a transformação de suas terras em desolação, morada dos chacais e dos abutres, lugar de trânsito de espanto, semelhante a Sodoma e Gomorra (Jeremias 49.17-18), hoje também lugar de extração dos grandes volumes de riquezas em minérios, bênção da terra, com que seu pai o abençoara. Assim, não foi a ausência de bênção, mas as más escolhas de um filho que as desprezou e de um homem que guardou e transmitiu aos seus herdeiros uma profunda inveja por seu irmão o que determinou seu futuro.

Deus falará mais uma vez à casa de Israel, àqueles que escaparem da fúria do homem iníquo, tratando Seu povo mais uma vez no deserto, fazendo-o provar do Seu esconderijo e provisão. Não poderá faltar orvalho às terras de Esaú pois, em lugar da descendência deste, os filhos e filhas de ser irmão provarão a dupla bênção, até que possam retornar com Seu Rei, para servi-Lo desde Jerusalém por ocasião de Sua gloriosa vinda e no decorrer do esperado milênio. “Quem é este, que vem de Edom, de Bozra, com vestes de vivas cores, que é glorioso em sua vestidura, que marcha na plenitude da sua força? Sou eu que falo em justiça, poderoso para salvar” Isaías 63.1.

Por, Sara Alice Cavalcante.

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