No ápice da dor e da agonia do Gólgota, quando todos pensavam que a morte fosse o fim da esperança messiânica, Jesus deu o brado que ecoou e transformou toda a história humana. Um brado que rasgou não só o véu do Templo, mas também os corações humanos. Dentro da perspectiva de Marcos, a morte de Cristo na cruz é o clímax da Sua narrativa. E quando se trata dos relatos da crucificação, devemos estar atentos, pois todos os detalhes estão repletos de significados.
Dentre os múltiplos objetivos teológicos de Marcos no
capítulo 15, destaca-se o fato de que ele tenciona comprovar à messianidade e a
divindade de Jesus. Para isso, ele usa a ferramenta argumentativa do testemunho
ocular (testimonium oculare) do centurião, que, mesmo sendo algoz do
Cristo, confirma que Ele é o Filho de Deus (v.39).
A grande pergunta exegética a ser feita nesse versículo é: O
que levou o centurião à essa gloriosa confissão? Pelo contexto, podemos inferir
que três sinais que aconteceram durante a crucificação foram os catalisadores
dessa declaração.
O primeiro foi as trevas (v.33). Naquela cultura, se
acreditava que fenômenos sobrenaturais aconteciam na morte de grandes homens,
como se fosse uma forma de elogio divino. Por exemplo, a tradição judaica
afirmava que, na morte de um grande rabino, uma estrela apareceu ao meio dia;
outro, quando morreu, um trovão ressoou; ainda no caso de outro, raios
apareceram. (1) Suetônio, em sua obra A Vida dos Césares, afirmou que
quando o imperador Júlio César morreu, “um cometa brilhou por sete dias” (pp.
88 e 89). Essas informações nos ajudam a compreender como esse fenômeno das
trevas na crucificação foi interpretado pelas pessoas da época, incluindo o
centurião. Era Deus se utilizando desse fenômeno da natureza para testificar a
favor do Seu Filho.
O segundo foi o brado de Jesus (v.37). Na tradição judaica
do Segundo Templo, era mais comum que uma pessoa piedosa morresse em silêncio e
quietude, mesmo estando em agonia. Era uma demonstração de confiança em Deus.
Já no contexto romano, dar um brado final podia ter conotações de vitória e
autoridade. Por exemplo, um guerreiro romano podia morrer gritando para
demonstrar coragem ou para proclamar, até o último instante, que sua voz não
foi silenciada. Parece-nos que Deus estava falando de forma bastante contextual
com o centurião romano. O brado de Jesus não foi um suspiro de derrota, mas um
grito de vitória. Myer Pearlman afirmou que “o brado final de Jesus revelou que
Ele entregou Sua vida voluntariamente. O centurião viu que não era um criminoso
vencido, mas um Rei que se deu em sacrifício”. O brado de Jesus tem o poder de
acordar os mortos espirituais e abrir os olhos para que vejam que Ele é o Filho
de Deus.
O terceiro foi a forma como Jesus morreu (v.39). Os
estudiosos defendem a ideia de que a morte por crucificação costumava levar
alguns dias. (2) Diferente do que era esperado de um crucificado, à morte de
Jesus foi célere. À rapidez de Sua morte foi mais um indício que testificou a
distinção de Cristo para o centurião. O centurião romano não teve um sermão,
não participou de um culto, não leu um folheto evangelístico. Ele presenciou o Cristo
crucificado e isso bastou. O Calvário é a pregação viva de que Deus ama o vil
pecador. Stanley Horton disse: “O Espírito Santo usa a cruz para convencer o
homem do pecado, da justiça e do juízo. O centurião representa todos nós:
gentios, longe da aliança, mas alcançados pela graça”.
O centurião foi o primeiro de uma multidão de gentios que
confessariam Jesus como Filho de Deus. O brado de Jesus na cruz continua a
rasgar véus da religiosidade e corações endurecidos. Não podemos nos esquecer
de que a confissão do centurião é o cerne da fé cristã. Como o centurião, somos
confrontados pelo Cristo crucificado. Que você possa ouvir o brado de Jesus!
Ele não é um sussurro de derrota, mas o grito de vitória daquele que venceu o
pecado, o inferno, o mundo e a morte.
Notas
Weder F. MOREIRA. Descortinando a cultura do Messias.
Os bastidores histórico-cultuTais dos Evangelhos. Grammata, p. 189.
* Craig KEENER. Comentário Histórico-Cultural do Novo
Testamento. Vida Nova, p. 200.
por Weder Fernando Moreira
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