A aproximação do homem do seu Criador faz com que o seu caráter se torne cada vez mais parecido com o de seu Mestre
Desde a criação, Deus quis um povo santo. “Sede santos porque sou santo” (1 Pedro 1.16). Ele desejou uma comunhão especial com os homens que fossem capazes de andar com Ele e falar com Ele numa união especial. Mas a própria natureza de Deus estabelece limites para tal associação. Seu caráter santo não pode permitir ser contaminado pelo pecado e pela corrupção. Os homens só podem estar na Sua presença se forem puros.
Quando o Senhor começou a falar com Moisés sobre o ministério
sacerdotal que Arão deveria exercer no Antigo Testamento, um dos primeiros preceitos
que Ele exigiu foi a santidade. Ao detalhar sobre toda a indumentária que Arão e
seus filhos deveriam usar, Ele encerrou com uma lâmina de ouro a qual deveria
estar na testa de Arão com esta expressão: “Santidade ao Senhor” (Êxodo 28.36).
Em hebraico, Qodesh la YHWH. Isso significa consagrado, separado,
dedicado ao Senhor. Como dizia A. W. Tozer, “não podemos estudar a Bíblia com
diligência e seriedade sem que nos deparemos com um fato óbvio: toda a questão
da santidade pessoal é extremamente importante para Deus”.
Definição e conceito de santidade
No hebraico, o substantivo Qodesh quer dizer
separação, santidade; o verbo Qadash significa separar; e o adjetivo Qadosh
quer dizer santo, sagrado. Qodesh é ainda a palavra cognata de termos
que significam “honra”, “brilho”, “glória”, “peso”, “abundância”.
No grego, temos hagiasmos, que significa tornar
santo, consagrar, separar do mundo e apartar-se do pecado a fim de termos ampla
comunhão com Deus e servi-lO com alegria (Ou em sua forma verbal, santificar).
Significa literalmente o processo pelo qual se separa algo ou alguém para um uso
ou um propósito religioso, por isso tem o sentido de tornar sagrado ou consagrar.
Haguiôsynê é o estado que resulta de ser dedicado ao serviço de Deus – é
“dedicação”, “consagração”. É a qualidade de santidade como uma expressão do
divino em contraste com o humano, “qualidade divina” (LOW, Johannes P. e NIDA, Eugene
A. (editores). Léxico Grego-Português do Novo Testamento baseado em domínios
semânticos, Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2013, pp. 479 e 480).
Haguiázo significa “separo das coisas profanas” e “consagro
para a possessão e o uso divino”; “purifico por expiação”; “purifico intimamente”;
“considero limpo, legítimo, lícito”; “santifico”, quer no sentido jurídico de considerar
separado de vez e pertencente a Deus os recipientes da expiação de Cristo, quer
no sentido da progressiva e gradual realização desta consagração do crente a Deus
e à santidade pela obra do Espírito Santo na sua vida (TAYLOR, William Carey. Dicionário
do Novo Testamento Grego. Rio de Janeiro: JUERP, 1991, pp. 8 e 9).
Hágios é separado do uso profano por Deus e para
Deus, sacro, santo; uma referência aos cristãos, aos crentes, ao novo povo de
Deus, sucessor dos hebreus no favor e propósito divino; enfim, os santos. Haguiôsynê
é estado do santo, santidade, pureza moral (BROWN, Colin e COENEN, Lothar
(organizadores). Dicionário Internacional de Teologia do Novo Testamento,
tradução Gordon Chown, 2a edição, São Paulo: Vida Nova, 2000, pp. 2257 a 2265).
Em suma, santidade significa separação total a Deus,
dedicação total a Deus; vem de sagrado, consagrado. Sem um coração santo não se
pode viver em santidade.
Santidade é o clamor do coração de Deus para o Seu povo desde
a Antiguidade até os dias de hoje. Na Teologia, a santificação é o processo de aperfeiçoamento
gradual do ser humano em que ele se aproxima do caráter divino e afasta-se do
pecado.
Na Bíblia, as palavras “santo” e “santidade” ocorrem mais de
600 vezes, quase sempre se referindo ao caráter do homem e ao atributo de Deus.
Deus deseja uma geração que seja exclusiva para si, separada para si, consagrada
para si. E esse anseio do coração de Deus se revela em toda a Bíblia. É um cuidado
da parte de Deus com os Seus escolhidos. Não há como falar em santidade,
separação, consagração, dedicação, obediência e fidelidade sem falar de Daniel e
seus amigos Sadraque, Mesaque e Abede-Nego. Daniel e seus amigos são um exemplo
forte, com a história deles se apresentando como uma das mais lindas no que diz
respeito à dedicação a Deus.
A santidade, por nos aproximar de Deus, por ser agradável a
Deus e totalmente desagradável ao inferno, abre portas para a manifestação poderosa
de Deus. Os milagres acontecem e os livramentos vêm, deixando os inimigos
perplexos. Tudo isso porque a santidade nos aproxima de Deus e o desejo do
nosso coração se alinha ao desejo do coração de Deus, que se realiza plenamente
em nossas vidas e através das nossas vidas. Quem já experimentou a graça da santificação
não precisa fazer esforço em praticar o bem e a justiça. É tão lógico como a
figueira dar figos e a videira, uvas.
O homem santificado opõe-se a todo pecado, anda nos
estatutos do Senhor, guarda os Seus juízos e Os observa. Um homem com coração puro
vê pureza em tudo; o de coração impuro vê impureza em tudo e interpreta com malícia
qualquer coisa. Não basta falar de santidade. É preciso vivê-la. Esse é o
testemunho.
A verdade não pode ser adulterada ou deturpada. A mente carnal
combate sistematicamente a santidade. O coração do homem carnal não admite a lei
de Deus, a verdade, porque esta restringe suas tendências impuras. Sem a santidade,
ninguém verá o Senhor (Hebreus 12.14), isto é, não entrará no Reino de Deus. A santidade
não pode ser protelada para se buscar nos momentos de agonia e sofrimentos na vida.
Quem não se preparar e não tiver vida santa na terra, não terá santidade na
Eternidade. A santidade é requerida na vida presente.
Todo aquele que crê no Deus Santo deve buscar ser santo. Ser
santo não é sugestão, mas imperativo para todo aquele que se tornou filho de
Deus. “Sede santos porque eu sou santo” (1 Pedro 1.15,16).
A santidade é uma qualidade moral de pureza do espírito,
alma e corpo. O cristão é, portanto, um elemento raro no mundo corrompido, pois
tem a qualidade de santidade, cujo grau e intensidade vai gradualmente
crescendo.
Deus é 100% santo e essa qualidade de ser santo, puro, isento
de mistura da velha natureza, humana e adâmica, deve fazer parte da vida do cristão.
Um cristão autêntico tem em seu coração o amor, a fé, a paz, a mansidão, a
sinceridade, a bondade, a honestidade e esses traços de caráter vão sendo confirmados,
ampliados, amadurecidos e desenvolvidos.
Em síntese, podemos dizer como escreveu John Brown, teólogo
escocês do século XIX: “Santidade consiste em pensar como Deus pensa e querer
como Deus quer”.
Pureza é a ausência do pecado, assim como a saúde é a
ausência da doença. Esvaziando-se dos pecados, imediatamente o cristão deve ser
cheio da santidade de Deus, e essa plenitude de pureza deve ser o estado
permanente de cada um que segue a Jesus Cristo. Descarte qualquer tentativa de desejar
ver a Deus se você guarda em seu coração iniquidades e impurezas.
As expressões “santo” e “as coisas santas” denotavam, no início
da história da religião, “poder”, “tabu” e, depois, de modo geral, a esfera do poder
divino que o homem considerava superior e ameaçador. O antônimo do “santo” era o
“profano”, a esfera da vida humana fora do âmbito do divino. As raízes da
religião se acham nos esforços no sentido de separar o que é santo, mediante processos
cultuais e rituais, da profanação e contaminação causadas por coisas profanas.
Os gregos empregavam três grupos de palavras diferentes para denotar aquilo que
é “santo”: hieros, com seus derivados numerosos, denotando aquilo que é
essencialmente “santo”, o “tabu”, o “poder divino”, ou “aquilo que era
consagrado àquele”, e.g., “santuário”, “sacrifício”, “sacerdote”. Por contraste,
hágios – com o grupo de palavras mais frequente no Novo Testamento –
contém um elemento ético. Enfatiza-se o dever de adorar àquilo que é santo. Hosios
também se inclina nesta direção: de um lado, indica o mandamento e a
providência divinos; do outro lado, a obrigação e a moralidade humanas.
Não existe etimologia certa para hágios. O termo
relaciona-se com hazomai (de hagiomai), que não se acha na LXX
nem no Novo Testamento, e significa “ter reverente temor” dos deuses ou dos
pais, e.g. de Apolo (Homero, 77. 1,21), bem como “respeitar”, e.g. de Zeus, que
respeita àqueles que estão debaixo da proteção de Palas.
Temos também hagizo, “consagrar”, de onde se forma hagiázoi
por extensão. Esta última palavra, com seus derivados (hagiasma, “santuário”,
“santidade”; hagiasmos, “santidade”; hagiasterion, “santuário”), ocorre
principalmente na LXX. Os substantivos posteriores hagiotes e haguiôsynê,
“santidade” (também principalmente na LXX), derivam de hágios, que não era
especialmente frequente em grego fora da LXX. Empregava-se, sem dúvida, como
equivalente do hebraico qadosh, porque expressava, em contraste com hieros,
não aquilo que era santo em e por si mesmo, mas, sim, o convite à adoração que
emana daquilo que é santo. Na LXX, somente hagiázo, hagiasma e hágios
desempenham qualquer papel.
Às vezes, pode-se pensar na santidade quase de modo físico: é
transferida pelo contato (Êxodo 29:37; 30:29) e o contato incorreto pode ser fatal
(Números 4:15,20). Da mesma forma, a impureza também é transferível (Ageu 2:11 e
ss.). Visto que a pureza é a característica apropriada de tudo quanto é santo (puro),
é dever de todo participante do culto ser puro (“santificar-se”). Quem é impuro
precisa tomar as medidas imediatas para se purificar. Há também pessoas santas
(sacerdotes, levitas, nazireus) e a santa unção dos reis davídicos (Salmos
89.20; cf. 1 Samuel 24.6).
Da ressurreição em diante, Jesus é o Cristo, poder que opera
segundo o Espírito da santidade (Romanos 1.4). A santidade é uma dição de aceitação
na Parusia e da entrada na herança do povo de Deus (Colossenses 1.12; Atos
20.32; 26.18). Em todos estes casos, “santidade” dá a entender um relacionamento
com Deus que não se expressa primariamente através do culto, mas, sim, através do
fato de os crentes serem guiados pelo Espírito Santo (Romanos 8.14). Assim como
no Antigo Testamento, a santidade é um termo pré-ético; ao mesmo tempo, também como
no Antigo Testamento, ela exige o momento em que responde corretamente ao
Espírito Santo.
A santificação é como o crescimento de um fruto que resulta
na vida (Romanos 6.19-22; cf. 1 Tessalonicenses 4.3-7). A adoração espiritual e
racional é oferecer-se a si mesmo como sacrifício vivo, santo e aceitável a
Deus (Romanos 12.1). Os “santos” não são simplesmente pessoas “agradáveis” e
dignas. São aqueles que foram chamados, e um aspecto essencial da santificação
é o amor por todos os santos (Efésios 1.15), é ficar fiel a eles nas necessidades
(Romanos 12.13), é abrir mão de profanar o sagrado por meio de levar questões com
irmãos crentes diante das autoridades seculares, e permitir que os santos as
julguem (1 Coríntios 6.1-2). Paulo emite o juízo de que um cônjuge não-cristão não
profana o cristão; pelo contrário, o não-cristão é santificado pelo cristão, assim
como santificados ficam os filhos do casamento (1 Coríntios 7.14). Por ser o
próprio Deus quem santifica (1 Tessalonicense 5.23), frutificar para a
santificação fica tanto mais importante (Filipenses 2.12-16).
Santidade nas Epístolas de Hebreus e 1 Pedro
A Epístola aos Hebreus apresenta um aspecto altamente especializado
da santidade. Jesus como Sumo-Sacerdote é Aquele que santifica o Seu povo (Hebreus
13.12; 2.11) e oficia santuário não feito com mãos (Hebreus 9.24; 8.2). A divisão
do santuário terrestre de Israel em Lugar Santo e Santo dos Santos (Hebreus 9.2-3)
mostra que o acesso ao santuário ainda não foi conseguido. Cristo, porém,
entrou no santuário para sempre, com a oferta do Seu próprio sangue, e obteve
eterna redenção (Hebreus 10.14). Seu sacrifício de Si mesmo torna obsoletos os
sacrifícios de animais.
Segundo a vontade de Deus, “temos sido santificados,
mediante a oferta do corpo de Jesus Cristo, uma vez por todas” (Hebreus 10.10).
Mesmo assim, Hebreus nos adverte que, “tendo ousadia para entrar no Santo dos Santos”
(Hebreus 10.19), não devemos profanar o santo da aliança com o qual cada um foi
santificado, pois “nós conhecemos aquele que disse: ‘A mim pertence a vingança;
eu retribuirei’. E outra vez: ‘O Senhor julgará o seu povo’” (Hebreus 10.29,30;
cf. Deuteronômio 32.35,36). Devemos, portanto, esforçar-nos por termos a paz
com todos os homens, e a santidade, sem a qual ninguém poderá ver a Deus (Hebreus
12.14).
Para proposição inversa, os irmãos santos (Hebreus 3.1) devem
reconhecer a disciplina que Deus aplica para ajudar, pois Ele nos disciplina a fim
de que ganhemos uma participação na Sua santidade (hagiotes, Hebreus
12.10; cf. Provérbios 3.11-12).
1 Pedro é de especial importância no desenvolvimento adicional
do conceito. À ideia da santificação pelo Espírito (1 Pedro 1.2) acrescenta-se a
advertência franca: “Como filhos da obediência, não vos amoldeis às paixões que
tínheis anteriormente na vossa ignorância; pelo contrário, segundo é santo aquele
que vos chamou, tornai-vos santos também vós mesmos em todo o vosso procedimento”
(1 Pedro 1.14-15; cf. Levíticos 19.2). O conceito continua em 1 Pedro 2.5: “Também
vós mesmos, como pedras que vivem, sois edificados casa espiritual para serdes
sacerdócio santo, a fim de oferecerdes sacrifícios espirituais, agradáveis a Deus
por intermédio de Jesus Cristo”. Assim, a dinâmica do derramamento do Espírito
é aqui redeclarada em termos das funções sagradas do sacerdócio.
Os crentes são considerados sacerdotes outra vez em
Apocalipse 1.6; 5.10 e 20.6. Além disso, o Apocalipse retrata a moradia futura
dos cristãos como sendo a Cidade Santa, a Nova Jerusalém (Apocalipse 21.2,10;
22.19). O aspecto mais importante de Jerusalém era que continha o Templo, o ponto
central de encontro entre Deus e o homem. Na Nova Jerusalém, porém, não há
templo, “porque o seu santuário é o Senhor, o Deus Todo-poderoso e o Cordeiro” (Apocalipse
21.22). Estes quadros apresentam, ao mesmo tempo, uma continuidade com as
instituições estabelecidas de Israel e um rompimento radical com o Israel
histórico. Alguns argumentam que conceber a igreja em tais termos institucionais
representa uma institucionalização do caráter dinâmico e carismático da
comunidade cristã primitiva. Ao fazer assim, a igreja se resguardava contra o
tipo de excessos que ocorriam na igreja de Corinto. O emprego destas figuras, no
entanto, tem uma função mais importante. De um lado, a aplicação delas à igreja
significa que agora estão obsoletas as instituições históricas em Israel. Do
outro lado, o emprego dos conceitos de sacerdote, templo e cidade santa desta
maneira dinâmica e espiritual oferece à igreja sofredora, perseguida, uma
perspectiva que a capacita a ver a sua situação e o seu papel em termos dos
propósitos de Deus.
A busca da santidade começa com uma vida intensa de oração.
A ideia de viver uma vida santa em um mundo conturbado e injusto pode parecer uma
utopia. Porém, ao adotar a santidade como estilo de vida, devemos ter em mente
que isso não será possível se deixarmos as coisas acontecerem naturalmente.
Para buscar a santidade, é preciso querer ter uma vida irrepreensível diante de
Deus. Há um preço a ser pago – a saber, o preço da renúncia. A santidade só é
possível para aqueles que têm o Senhor Deus habitando em seu coração e para
isso é necessário ter uma experiência pessoal com o Senhor Jesus Cristo. Se
adotarmos a santidade como estilo de vida, estaremos em consonância com a
vontade de Deus. “Porque esta é vontade de Deus, a vossa santificação” (1 Tessalonicenses
4.3). Como dizia Clemente de Roma, “por sermos, portanto, uma porção santa,
tudo devemos fazer de acordo com a santidade”.
por Wagner Tadeu dos Santos Gaby
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