Um aprisco para os pastores de Israel

Um aprisco para os pastores de Israel


De todas as construções humanas, talvez o aprisco de ovelhas seja a mais simples. A mureta que circunda o pátio por vezes não excede um metro de altura. Feita com a sobreposição de pedras encontradas no local, reunidas com um pouco de argamassa rústica, pode ter uns vinte a trinta centímetros de largura; seu tamanho varia conforme a localidade e a variedade das pedras disponíveis. Um espaço é reservado ao que seria a porta – mas não há porta. À noite, é costume ver o pastor sentado no pequeno vão, com as costas apoiadas numa lateral do muro e as pernas encostadas na outra lateral, tornando-se, ele mesmo, a ‘porta das ovelhas’. Um antigo costume ordenava a colocação de galhos de espinheiro seco encimando todo o entorno do aprisco. Posto sobre a construção de pedras, compunha uma arma de defesa para as preciosas ovelhas. Com tal recurso, no caso de um ataque de lobos bastaria ao pastor atear fogo no conjunto de lenha seca e de fácil combustão. Formava-se, então, um círculo flamejante, afugentando os atacantes e protegendo o rebanho, reunido no centro do aprisco e atento à figura e, sobretudo, à voz do pastor.

Nem sempre, porém, as ovelhas estão guardadas na segurança do aprisco. Nos períodos de abril até outubro pode-se vê-las nos pastos livres, gozando da vegetação da primavera, verão e outono. O frio dos meses de novembro a março não permitiria tal liberdade. A liberdade, por sinal, requer atenção redobrada dos animais às instruções de seu guia humano. Homens simples, forjados no clima rude do deserto, portando seus bordões e alforges, esses trabalhadores comumente vistos no sul de Israel ou no sul da Jordânia pouco mudaram em seus costumes desde os dias de seus ancestrais, e a contemplá-los no exercício de seu ofício promove àquele que assiste à cena um retrocesso aos dias dos patriarcas, à lembrança de Raquel cercada pelas ovelhas de seu pai ou ao pastorzinho inspirado, compondo louvores ao Senhor enquanto cuidava do rebanho de seu pai Jessé.

Pois, nos campos da Judeia, em algum momento em que o clima presenteou os habitantes locais com temperaturas amenas, um grupo de pastores guardava seus rebanhos nas vigílias da noite quando um anjo se lhes apresentou sobre eles, entregando uma mensagem repleta de esperança. No deserto, olhar para os céus somente é possível depois de cumprida toda a rotina de prevenção a ataques de serpentes e de escorpiões (pessoalmente, em duas vigílias na região de Ein Gedi, entendi o desafio de olhar para o alto, a despeito dos perigos bem próximos aos nossos pés, e apesar de contarmos com uma tenda de socorro médico, situada bem próximo, para o caso de algum acidente). Quando possível, a visão daquele tapete azul escuro, pontilhado de estrelas e inundado pelo som do silêncio, fala eloquentemente às almas, mesmo às mais resistentemente moucas. Imaginemos a cena repetida pelos milênios sendo desfrutada por um grupo de pastores a mais, como tantos outros vivenciaram, sofrendo, inesperadamente, uma ruptura, pela manifestação de um mensageiro celestial. Torna-se impossível não olhar para o alto. Em seguida, o grupo é envolvido por um resplendor de glória. Assim circundados, homens e animais tornam-se igualmente rebanho – o Senhor que os cerca revela cuidado pastoril, envolvendo-os com Seu amor. Aqueles que se fatigam na proteção, alimentação, carinho e orientação das ovelhas são, agora, colocados na condição de receberem atenção, celestial atenção. Há aprisco para os pastores de Israel.

Em seguida à presença angelical e ao brilho circundante, uma multidão dos exércitos celestiais rompe em coro majestoso dizendo: “Glória a Deus nas alturas; paz na terra aos homens, a quem Deus quer bem”. Não é possível precisar a duração daquele evento, mas é certo que, enquanto durou, o grupo permaneceu desfrutando daquele pouco de céu descido à terra. Em seguida, a resposta dos rudes pastores ao que lhes fora anunciado torna-os, apesar de anônimos, exemplos de fé para todos nós. Em lugar de questionarem ou condicionarem a mensagem, eles seguem para ver aquilo que lhes fora dito. Percebamos que a decisão tomada não é a de ir ver ‘se’ as coisas ocorreram conforme ouviram, mas suas palavras demonstram a inabalável certeza de que era firme e fiel a mensagem angelical – agora, bastava-lhes ir e ver.

Essa fé, desatrelada das forças circunstanciais, é aquela que o Senhor Jesus procurou despertar em Martha, recém enlutada pela partida de seu irmão Lázaro: “Se creres verás a glória de Deus”. Em tempos de declarações e posturas mais próximas ao “se vires, crerás”, de fé sensitiva, de posturas alternadas segundo as reações emocionais, a lembrança do pequeno rebanho de pastores deve inspirar-nos. Para quem argumente que eles viram a glória e, por isso, creram, contra-argumento que as coisas não foram assim. Afinal, eles viram algo glorioso, surpreendente aos nossos olhos, mas aquele pedacinho de glória apenas nunciava a glória maior. A verdadeira Glória esperava-os, envolta em panos, numa manjedoura simples, guardada pelo amor de José e Maria. Eles creram, eles viram. Algum tempo depois, Simeão e Ana, ambos avançados em idade, também puderam contemplar a Glória por tanto tempo crida e aguardada.

O árduo trabalho do pastoreio pode, por vezes, furtar a visão da glória futura. Digo isso com relação aos atuais líderes de Israel, imersos na árida política internacional, espreitados por serpentes, por vezes traídos por escorpiões, tendo de administrar o cuidado com as vidas e a necessidade do fogo que coloque em fuga os inimigos, enfrentam as críticas de seus pares e o cansaço de um maratonista ao fim da prova, sendo que a prova ainda não terminou. Nesse momento, vozes terrestres precisam ecoar a mensagem pronunciada desde o trono do Eterno Deus, consolando Israel, declarando que, na cidade de David nasceu o Salvador, que é Cristo, o Senhor. A mensagem requererá a decisão de crer que é como lhes foi dito.

Crer no que foi dito é o remédio para as dores de Sião. O Senhor não abandonou seu povo. Mesmo atacado pelos inimigos, acusado pela mídia antissemita, ignorado quando revela os perigos reais que vem enfrentando há anos com seus adversários recorrentemente engordados pelas doações estrangeiras, tendo seus alertas quanto ao avanço do terrorismo no mundo desprezados e traduzidos como discurso de oposição à paz, ainda assim, Israel está envolvido pela presença do Senhor que faz de Si mesmo o muro, o fogo, a porta e o aprisco de Seu povo.

As estratégias para vencer os presentes desafios têm vindo. Como um livro de História que se descortina diante dos nossos olhos, presenciamos eventos que serão contados, virarão questões de concursos, inspirarão debates e alimentarão os produtos ficcionais futuros. Mas, aquilo que alguém assistirá, um dia, talvez assentado numa sala de cinema (sabe-se lá qual será a forma de entretenimento que dará lugar às antigas películas...) nós acompanhamos dia após dia pelas notícias que recebemos, com a sucessão dos fatos, sendo informados sobre os bombardeios, as respostas, as vidas perdidas, as resgatadas, as reações dos povos e das populações locais, a devastação... e, no meio de tudo isso, os rostos dos líderes de Israel, fortalecidos pela necessidade de proteger, mas necessitados de proteção por aquilo que não deixam de ser – ovelhas humanas no aprisco de Deus. Uma mensagem celestial a respeito daquilo que está reservado a Israel bastaria para fortalecê-los na certeza de que o Pastor de Israel, o Guarda de Sião não os abandonará. Queira o Senhor que, ao menos, os guias humanos possam crer naquilo que, um dia, lhes foi dito. Seguindo nessa direção, hão de ver a Glória.

por Sara Alice Cavalcanti

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