Porque deixei de ser desigrejado

Porque deixei de ser desigrejado


Esses dias me senti compelido pelo Espírito Santo a compartilhar um testemunho pessoal acerca do período mais difícil da minha jornada cristã, quando, anos atrás, densas trevas me arrastavam cada vez mais para longe do frescor da presença do Senhor e me conduziam para um vale de sombra e de morte, no qual, não fosse a misericórdia e a graça de um Deus cujas mãos estão sempre estendidas para nos salvar, eu certamente teria perecido.

Refiro-me ao período em que estive desigrejado.

Alguns anos atrás, eu tive algumas decepções com a liderança da igreja em que congregava, tanto do ponto de vista pessoal como institucional. Muito ressentido, passei um tempo em casa, pensando se continuaria a congregar naquela igreja ou procuraria uma outra, onde, talvez, eu não encontrasse os mesmos problemas.

Durante aqueles dias, eu tive contato, via internet, com pessoas que, assim como eu, haviam se decepcionado com suas igrejas, pelo que deixaram de congregar em templos físicos e passaram a se reunir em casas com outras que semelhantemente deixaram as suas denominações. Alguns, mais radicais, abandonaram qualquer forma de comunhão direta, seguindo sozinhos em sua jornada, nutrindo-se por meio de leituras de livros e vídeos de pregações na internet. Eles se autodenominavam desigrejados.

Esses irmãos argumentavam, dentre outras coisas, que as igrejas institucionalizadas estavam em desacordo com a Bíblia, segundo a qual, diziam eles, deveriam os crentes se reunir nas casas, não num local designado, e também que não deveriam haver líderes, tais como os pastores, que na verdade eram invenções que corromperam o cristianismo ao longo dos séculos.

Para mim, um jovem na época com sérios problemas com autoridade, fruto de ter sido criado sem um pai presente que me orientasse e me desse limites, esse discurso mostrou-se bastante sedutor.

Durante o tempo em que estive desigrejado (três anos), frequentei vários desses grupos “alternativos”, reunindo-me com eles em casas, shoppings, escolas e demais espaços públicos.

Apesar dos discursos inflamadas contra o “sistema”, condenando toda a forma de governo, com o tempo comecei a notar que eles possuíam seus próprios sistemas, que, em muitos aspectos, eram ainda mais nocivos do que aqueles os quais condenavam.

Nessas reuniões de desigrejados ou “desintemplados” (como outros preferem se denominar), estive em um dos grupos mais famosos do Brasil, sendo “mentoreado” (pois seu líder não aceitava ser chamado de pastor ou qualquer outra designação que remetesse àquelas adotadas pelas igrejas evangélicas) por um homem que já foi considerado um dos maiores pregadores do Brasil, mas que, após ser achado em adultério, abandonou a sua denominação, tornando-se um ferrenho crítico da igreja evangélica brasileira, fazendo uso especialmente das mídias sociais para este propósito. Havia uma deferência tal a esse mentor que, para validar uma determinada interpretação bíblica, seus seguidores utilizavam-se sempre de seus escritos ou vídeos, pois sua palavra era inerrante.

Em um outro grupo do qual também participei, fiquei chocado com o fato de que o “culto” só podia começar oficialmente quando um determinado “irmão” – que na prática era o líder deles – chegava. Imaginem!

Em muitas dessas reuniões, vi os participantes, entre os louvores e leituras bíblicas, ingerirem bebidas alcoólicas de todos os tipos. Alguns até mesmo fumavam. Muitos frequentavam boates e bares, alegando que tinham liberdade em Cristo para fazer tudo o que não podiam quando a religiosidade lhes aprisionava. Em alguns grupos, a homossexualidade era até considerada como uma conduta aceitável, contanto que fosse numa relação estável.

O mais grave, entretanto, era o estado da minha vida espiritual.

Tornei-me um crente amargo, excessivamente crítico e com um linguajar torpe. Quando orava, não sentia a presença de Deus, não havia unção, nem um coração inflamado. Substitui a leitura bíblica devocional pela leitura de livros, especialmente aqueles que endossavam a minha nova maneira de viver. Evangelizar, então, nem pensar.

Nesse meio tempo, resolvi estudar Teologia numa faculdade, pois sempre tive sede de conhecer mais o Senhor, entendendo que precisa demonstrar o meu amor com o meu coração, mas também com o meu intelecto, como Cristo ensinou.

Foi então que, ao estudar a matéria História da Igreja, o Espírito Santo me fez ver que eu estava errado.

Fiquei chocado ao notar que, ainda nos dias dos apóstolos, grassavam erros nas igrejas, alguns de gravidade muito maior do que aqueles que vemos nas igrejas hodiernas, o que levaram os apóstolos a ter de lhes repreender severamente.

Os gálatas se deixaram seduzir pelos judaizantes (Gálatas 3.3-4). Nas cartas às sete igrejas da Ásia menor em Apocalipse, excetuando Esmirna e Filadélfia, todas são repreendidas pelo Senhor.

A igreja de Éfeso, outrora elogiada por Paulo em sua epístola, havia deixado o primeiro amor (Apocalipse 2.4-5).

A igreja de Pérgamo seguia os ensinos de Balaão (idolatria e prostituição) e dos nicolaítas (os dominadores de leigos – Apocalipse 2.14-16).

A igreja de Tiatira tolerava uma falsa profetiza chamada Jezabel, que ensinava o povo a se banquetear com sacríficos idólatras e a praticarem toda a sorte de imoralidade sexual (Apocalipse 2.20-23).

A igreja de Sardes estava espiritualmente morta (Apocalipse 3.1-4) e a de Laodicéia, arrogante e prepotente, estava prestes a ser vomitada pelo Senhor.

Entretanto, a conduta da igreja que me deixou mais chocado certamente foi a de Corinto. Nenhuma igreja foi tão repreendida como ela no Novo Testamento. Apesar do seu fervor espiritual, de modo que “não lhes faltava nenhum dom” (1 Coríntios 1.7), a igreja de Corinto era facciosa, divisionista, cheia de problemas doutrinários e escandalosamente carnal, a ponto de tolerar um caso flagrante de incesto entre eles (1 Coríntios 5) e a prostituição religiosa nos templos de Afrodite por parte de alguns dos seus membros (1 Coríntios 6.18,19).

Mas, o que me deixou muito mais chocado ainda, estarrecido até, foi Paulo, apesar de todas essas repreensões, referir-se ainda à igreja de Corinto como um todo como “igreja de Deus”, com crentes “santificados em Cristo” e “santos, com todos os que em todo o lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Coríntios 1.2).

Foi então que eu caí em mim, percebendo o quão leviano estava sendo em meus julgamentos.

Descobri que o desigrejado sofre com um problema de anatomia, pois, dizendo amar a Cabeça (Cristo), despreza o Seu Corpo (Igreja). Tal qual um carrasco, o desigrejado arranca a cabeça do corpo, achando que com isso receberá alguma vida. Que loucura!

Olhando para dentro de mim, iluminado pelo Espírito da Verdade, identifiquei que o meu individualismo, a minha prepotência e a minha falta de misericórdia para com os meus irmãos eram os reais fatores que me levaram a deixar a comunhão. Meu coração estava tão endurecido pelo meu ego que já não conseguia mais suportar conviver com os outros.

Somos todos imperfeitos, falhos e certamente haveremos de eventualmente machucar uns aos outros no processo de aperfeiçoamento. Devemos exercitar a misericórdia para com os que tropeçam (Romanos 15.1), corrigindo-os em amor (Gálatas 6.1), exortando-nos todos os dias (Hebreus 3.13), sendo longânimes com todos (1 Tessalonicenses 5.14) e suportando uns aos outros em amor”, “guardando a unidade do Espírito pelo vínculo da paz” (Efésios 4.2-3).

Não existe uma igreja perfeita. Que possamos, à semelhança de Jesus ao se dirigir às sete igrejas em Apocalipse, não deixar que os erros das igrejas nos impeçam de enxergar as suas virtudes.

A maior massa de manobra do Diabo para promover divisão na igreja é o individualismo, que é o oposto da comunhão. A comunhão nos protege, nos unge, nos capacita.

Pela graça de Deus, hoje sou pastor da Igreja Evangélica Assembleia de Deus, na qual, há 23 anos, eu me converti e pela qual sinto imenso amor, louvando a Deus pela existência dessa denominação, que foi o meio que o Senhor utilizou para me alcançar.

por Leandro Lima

Compartilhe este artigo. Obrigado.

Comentário

Seu comentário é muito importante

Postagem Anterior Próxima Postagem