No período em que Jeroboão reinou sobre as tribos do norte, o povo ainda “subia” a Jerusalém para servir ao Senhor no Templo. O monarca ficou temeroso sobre a possibilidade de seus súditos voltarem para Roboão, rei de Judá. O rei de Israel decidiu proteger o seu reino e ergueu dois altares de adoração, cada um com uma estátua de bezerro de ouro. Assim proclamou o soberano: “Basta de subires a Jerusalém; vês aqui teus deuses, ó Israel, que te fizeram subir da terra do Egito” (1 Reis 12.26-31, 33). Um altar foi estabelecido em Betel e outro em Dan. Mas a liturgia precisava de sacerdotes para as cerimônias, por este motivo, Jeroboão escolheu, dentre o povo, religiosos que não pertenciam à tribo de Levi. A teóloga alemã Eta Linnemann, em seu livro “Crítica Histórica da Bíblia”, evidencia que “com a instalação dos bezerros de ouro em Israel por razões políticas, o pecado foi institucionalizado”. A autora ressalta tratar-se de pecado expressamente declarado como tal destes tempos anteriores, gravidade à qual soma-se a ausência de vozes que acompanhassem a voz do profeta que confrontou o rei junto ao altar em Betel (1 Reis 13.1-6).
Se Jeroboão enganou o povo, apresentando-se como governante confiável,
em contrapartida, o povo preferiu manter seu conforto e, quem sabe, alcançar
algum benefício dentro da nova estrutura de adoração, do que esboçar alguma reação.
Evitar subir a Jerusalém revelava-se apropriado, confortável e prático, além de
propiciar visibilidade social. A expressão da doutora Linnemann sobre o fato de
que Jeroboão “institucionalizou o pecado” parece oferecer a nomenclatura
perfeita para se usar, quando Deus declara que algo possui natureza maligna, através
de Sua Palavra, ganha status, defesa e velocidade nos avanços que faz rumo à
legitimação. Nessa direção caminham projetos que pretendem legalizar o aborto e
a utilização da maconha e demais narcóticos, somadas à legalização de todo e
qualquer relacionamento e prática, mesmo as mais ofensivas aos princípios da
criação, para tal intento promovendo-se e incentivando-se tais práticas,
dando-lhes o verniz da beleza, atribuindo-lhes os nomes de amor e de escolha, ou
mesmo retirando do homem o peso de sua capacidade moral e concedendo-lhe o
benefício do conceito de um imperativo biológico ao qual estaria sujeito.
Ora, se tais alterações surpreendem os fiéis em Cristo, mais
surpreendente parece ser o modismo que se espalha como praga e que atribui
legitimidade aos atos de Satanás, adversário nosso e de Deus. Mentiroso desde o
princípio, somente dele poderia ter partido o conceito de que suas ações
acontecem nas vidas dos homens e se legitimam por um “direito legal”. O absurdo
da afirmativa entra em choque com a convicção de que ele e os demais anjos
caídos são ladrões, roubadores, destruidores e, à semelhança de outros
meliantes, agem à contramão da lei. Se um pai de família, por descuido, deixa destrancada
a porta de casa, nem por isso dá direito ao assaltante de invadi-la e de
furtar-lhe os bens. O bom uso presente no linguajar dos crentes diria que se
deu ocasião, ou brecha, deixou-se de vigiar, ou expressão semelhante, aplicável
e correta. Jamais, em tempos menos afeitos às novidades teológicas, ouviríamos
dizer que o “diabo age por direito legal”. A coisa tende a piorar quando, em
manifestações espirituais, demônios declaram, em sua esperteza vil, que estão agindo
na vida da pessoa porque uma falta ou descuido os legitimou. Relembremos: as
vidas pertencem a Deus; toda ação diabólica é ilegítima; o inimigo é
oportunista e procura agir ao menor descuido; uma vez identificada sua ação em
uma vida, o melhor a fazer é buscar a libertação, obra daquEle que para isso se
manifestou, ou seja, para desfazer as obras do Maligno. Todo o pleito satânico jazeu
no ato da crucificação, onde foram despojados e, portanto, destituídos, os
principados e as potestades. Quando Jeroboão institucionalizou, como autoridade
máxima sobre o povo, o mal em Israel, isso não significou um decreto de
liberdade para as trevas agirem em todas as vidas, pois cabe a cada homem a
escolha de permitir ou não a ação do mal e de detê-lo.
É sabido que as almas pertencem a Deus. Nenhum poder ou autoridade
humana pode mudar isso. Ainda que alguém “venda” sua alma ao diabo, tal pacto
não possui qualquer validade – as almas têm dono – quem vendeu, vendeu aquilo
que não lhe pertencia; quem comprou, comprou mercadoria roubada. Tal negociação
deve ser tida como nula. A vida precisa encontrar seu real Possuidor e Criador.
Mas devemos atentar que durante o reinado de Jeroboão, muitos corações
continuaram servindo ao Deus vivo. A fidelidade daqueles crentes não anula a
importância do gesto do rei, colocando em risco a saúde espiritual de seu povo.
Os atos das autoridades instituídas estão revestidos de especial valor, tanto
espiritualmente quanto como precedente estabelecido ou exemplo dado, seja ele
bom ou ruim.
Num paralelo feito em oposição, é acertado afirmar que o
ponto alto da visita do presidente Jair Bolsonaro a Israel, iniciada no dia 31
de março último (2019), tenha sido sua presença junto ao Kotel ou, como costumamos
chamar, o Muro das Lamentações, em Jerusalém. Além do ato ser mais um
instrumento de reconhecimento do direito dos judeus sobre o sítio, a declaração
do governante de que orou pelo Brasil, pedindo a Deus que “olhe” por nós,
reveste-se de peso de evento profético, mais do que evento histórico. Vale
lembrar, porém, que aquilo que se legitima na esfera da autoridade somente terá
lugar se houver espaço nos corações. Concordemos, portanto, e que Deus olhe por
nós.
Decididamente, o chefe da nação evitou as opções mais
cômodas de Betel e Dan e, mesmo debaixo de severas críticas, subiu a Jerusalém,
respeitando a soberania de uma nação e a escolha divina. Quanto às demais
declarações de que a transferência da embaixada do Brasil de Tel Aviv para
Jerusalém tenha se revelado uma “promessa não factível”, tendo sido substituída
por um escritório sem status diplomático, ganhando, talvez, um formato
semelhante ao que temos em Taiwan, o tempo trará as respostas às nossas
expectativas. Longe de nós esteja o querer buscar outro objetivo e deixar de lado
o amor por Sião. Basta de fugirmos de Jerusalém. Subamos a ela com os louvores
e a gratidão dos que se sabem pertencentes a Deus, sendo só por Ele guiados.
por Sara Alice Cavalcanti
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