Salvação não merecida e disponível a todos

Salvação não merecida e disponível a todos

O plano da salvação é uma arquitetura disruptiva à inteligência humana. Isso porque estamos habituados a modelos de justiça em que é certa a possibilidade de alcançá-la através das próprias ações e méritos, seja no aspecto negativo (pena cumprida por atos ilícitos) ou positivo (benefícios por praticar atos lícitos).

Este pressuposto da incapacidade humana em solver a si mesmo e liberar-se de sua natureza pecaminosa torna a salvação misteriosa. Não há o que fazer para merecê-la, nem preço suficiente para comprá-la. A Bíblia, especialmente em Romanos, é clara ao descrever o ser humano como impotente diante do abismo que o separa de Deus e isso, por si só, é aflitivo se considerarmos que todas as demais concepções de justiça que conhecemos proporcionariam meios para nos alçarmos ao status de “justos”.

Aos olhos de Deus, porém, somente por meio de um substituto à humanidade somos levados à perfeição: Jesus Cristo, que veio ao mundo como homem, sem pecados e sem pecar, derramando Seu sangue inocente para cumprir o que nenhum outro ser humano poderia. Tornamo-nos “justos” diante de Deus pois Jesus assumiu o castigo devido em razão do nosso pecado e venceu a morte em nosso lugar.

Essa verdade é tão maravilhosa quanto confrontadora às nossas convicções comuns acerca do juízo, principalmente quando exposta a preconcepções ainda impregnadas por caracteres humanos que muitas vezes levamos inconscientemente à balança da justiça quando pensamos em salvação. É que sempre haverá em nós uma tendência a encontrar pessoas que são mais (ou menos) merecedoras de salvação, o que é um grande equívoco e uma indevida humanização de um processo completamente miraculoso.

Não nos furtemos deste mea culpa. Até mesmo o profeta Jonas, após ser instrumento relutante para a salvação de um povo vil, ficou injuriado alegando a indignidade dos ninivitas. Também Habacuque angustiou-se pela longanimidade do Senhor frente à insensatez dos judeus. 

Vez ou outra temos os mesmos questionamentos e desvios em nossos íntimos pensamentos quando se trata da salvação. Podemos entender que determinadas pessoas são mais merecedoras por viverem uma trajetória íntegra e honesta, ou dedicarem-se exclusivamente à obra de Deus; ou, seguindo no caminho inverso, condenar mentalmente aqueles que cometem crimes hediondos e não possuem nenhuma sinalização de sensibilidade ao próximo. Também há aqueles que firmam pré-conceitos relacionados à realidade financeira: riquezas como evidências da salvação da alma; ou, em um outro sentido, a pobreza como humildade necessária para entrar no Reino de Deus. Por fim, as preconcepções acerca de uma salvação meritória alcançam até o campo da ideologia política, vinculando precipitadamente o Reino de Deus a determinados “pacotes de ideias” ou, quando pior, nichos partidários.

Tais recortes, que são exclusivamente humanos, não refletem o plano de Deus para a humanidade, pois o próprio Jesus afirmou que Deus amou o mundo. Seu chamado para a redenção envolve todos que O aceitarem como único e suficiente Salvador. 

A própria relutância farisaica ao discurso de Jesus demonstra um apreço insensível a posições consolidadas em preconcepções meritórias, desconectadas do verdadeiro sentido de entrega e devoção. Não por acaso, as demonstrações de fé que mais chamaram a atenção do Mestre foram de um centurião romano e de uma mulher cananeia. 

Tenho para mim que compreender o caráter não meritório da salvação é um verdadeiro milagre fruto da atuação do Espírito Santo. Considero impossível ao ser humano, pela sua própria convicção, firmar entendimento de que não merece ser redimido por Deus. Estamos sempre procurando motivos que nos justifiquem, sejam obras que realizamos, senso moral, sacrifícios em vida, desculpas aos erros, enfim, tudo que sob o ponto de vista humano traduz-se em quitação com a justiça. Contudo, a percepção de nossa incapacidade para a salvação vai além de pontuações isoladas em relação a boas ações e comportamentos éticos. Trata-se de uma compreensão mais profunda decorrente do reconhecimento de uma natureza corrompida pelo pecado, tal como confessou Davi: “Eis que em iniquidade fui formado, e em pecado me concebeu minha mãe” (Salmos 51.5). 

Ao reconhecer a falibilidade do homem como uma decorrência da Queda e, portanto, uma característica comum à criatura humana, percebemos um mesmo status compartilhado pela humanidade: todos pecamos e, por isso, estamos destituídos da Glória de Deus. Esta isonomia em pecado, porém, é superada por outra isonomia, desta vez em oportunidade, já que somos chamados à salvação gratuitamente, pela graça, cuja definição comezinha é favor imerecido. 

Sejamos, pois, conscientes do milagre da salvação que Deus opera em nós, não como um processo do qual nos jactamos, mas por meio do qual nos humilhamos a ponto de reconhecermos o amor de Deus pelo mundo fluir através de nossas vidas.

Por Leonardo Dantas Costa.

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