A serpente de bronze de Moisés

A serpente de bronze de Moisés

Em Números 21.4-9, a Bíblia nos relata que Israel estava indo pelo caminho do Mar Vermelho, rodeando a terra de Edom, quando o povo ficou impaciente e começou a falar contra Deus e contra Moisés. Poucos versículos antes, vemos Deus dando ao povo grandes vitórias, mas agora eles reclamam por que os fizeram subir do Egito para morrer no deserto. Então, o Senhor manda serpentes ardentes, ou seja, cobras venenosas com uma picada ardida e letal, que mordeu o povo e muitos morreram. Israel se arrepende e pede que Moisés interceda a Deus por eles. O Senhor diz a Moisés para fazer uma serpente e colocar numa haste para que todo aquele que olhasse para ela ficasse vivo. E assim aconteceu. Ao olhar para a serpente de bronze, todo aquele que fora mordido ficava curado.

Esse relato da serpente no deserto foi lembrado por Jesus em um dos encontros mais memoráveis de Seu ministério terreno. Conversando com Nicodemos sobre “nascer de novo”, Jesus diz: “E, como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo “aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (João 3.14,15). E no próximo versículo, o “texto áureo” da Bíblia, Jesus sintetiza o plano de salvação repetindo parte do texto em que aborda o incidente no deserto (João 3.16). Podemos ver uma clara relação com o que Moisés fez com o sacrifício de Cristo levantado em uma cruz. A Bíblia de Estudo Pentecostal (CPAD) comenta: “O poder vivificante da serpente de metal prefigura a morte sacrificial de Jesus Cristo, levantado que foi na cruz para dar vida a todos que para Ele olharem com fé.[..) Quem hoje em dia quiser ser liberto do pecado e receber a salvação, deve voltar-se de coração, na obediência da fé, à Palavra de Deus em Cristo” (1995, p. 266).

Quase oito séculos depois do episódio no deserto, no reinado do rei Ezequias, a estátua que deveria ser um meio de cura provisório se tornara um ídolo adorado pelo povo. A Bíblia registra: “Este tirou os altos, e quebrou as estátuas, e deitou abaixo os bosques, e fez em pedaços a serpente de metal que Moisés fizera, porquanto até àquele dia os filhos de Israel lhe queimavam incenso e Ihe chamavam Neustã” (2 Reis 18.4). Veja que o texto especifica que “até aquele dia”, ou seja, até os dias do rei Ezequias esta prática idolátrica acontecia.

A idolatria, infelizmente, foi algo recorrente na trajetória do povo de Israel. Na família de Jacó, vemos isso acontecendo pouco antes de chegarem a Betel. Ele pede para que retirem a imagem de deuses estranhos (Gênesis 35.1-4). De modo coletivo em Israel, o primeiro caso registrado de idolatria do povo foi com o bezerro de ouro, quando Moisés subiu no Monte Sinai (Êxodo 32.1-6).No período dos juízes, uma nova geração, que não conhecia ao Senhor e constantemente se voltava à idolatria, entrou na Terra Prometida, pois “foram-se após outros deuses, dentre os deuses das gentes que havia ao redor deles, e encurvaram-se a eles, e provocaram O SENHOR à ira” (Juízes 2.12). Por isso o Senhor os entregou nas mãos dos inimigos. Nos tempos dos reis de Israel, houve muita idolatria (1 Reis 11.1-10; 16.30; 2 Reis 15.8,9). Após a divisão do reino, todos os reis do norte (Israel) e muitos do reino do sul (Judá) foram idólatras. No Decálogo, “os dois primeiros mandamentos proíbem expressamente a prática da idolatria (Êxodo 20.1-5; Deuteronômio 5.7,8; Levíticos 19.4). A feitura de qualquer tipo de imagem de escultura é explicitamente reprovada pelo Senhor.

“Todo esse relato nos ensina como é fácil distorcer as coisas ou pessoas que Deus usa para nos abençoar e torná-los em objetos de idolatria. “Todos nós temos a capacidade de pegar algo bom que Deus nos deu, que usou, e fazê-lo um ídolo destrutivo em nossas vidas.

Nunca devemos adorar as ferramentas ou as pessoas que Deus escolhe usar, mas sempre trazer honra e glória somente a Deus. Podemos também tornar outras coisas boas em algo mal. A Bíblia de Estudo Vida comenta: “O pecado muitas vezes pode ser visto como distorção ou perversão de algo bom: comer é bom, mas a glutonaria é pecado; Deus criou o sexo, mas o adultério é pecado; é bom falar, mas todo mexerico destrói. Nesse caso, Neustã ilustra a tendência de adorar o que Deus criou em vez de adorar exclusivamente a Ele. Com o passar do tempo, o povo talvez tenha começado a pensar na serpente de bronze como algo que pudesse ajudá-los, como ocorrera nos tempos da peregrinação pelo deserto. Pouco a pouco, ela adquiriu status de ídolo, com poderes sobrenaturais” (1999, p. 592).

Lembro-me do tempo em que fui líder de jovens e dos eventos realizados, que foram marcantes na vida da juventude, como congressos e acampamentos. Muitos ficavam renovados e encorajados depois desses encontros, mas havia uma tentação de sempre associar e esperar uma nova visitação do Senhor apenas nessas realizações. E isso pode se aplicar a muitos ajuntamentos que fazemos em nossas igrejas que são bênçãos, mas que, às vezes, se tornam uma espécie de “serpente de bronze” em que aguardamos que apenas nesses momentos é que haverá uma manifestação sobrenatural da glória de Deus. E ainda colocamos uma expectativa exagerada e idolatramos as pessoas que estarão ministrando. E assim nos equivocamos, pois o Senhor deseja sempre se achegar àqueles que se chegam a Ele, independentemente da ocasião (Tiago 4.8). Há vários relatos bíblicos como Daniel e seus amigos, Paulo e Silas na prisão, em circunstâncias muito simples, até adversas, mas nas quais Deus se manifestou por encontrar corações quebrantados que atraíram Sua glória e poder.

Para mantermos a nossa fé, precisamos lembrar de que é somente Deus que nos salva, nos cura e nos abençoa. Precisamos cuidar de nosso coração, que é enganoso, para não transformarmos instrumentos de Deus para nos abençoar em ídolos; e se isso acontecer, agirmos como o rei Ezequias, que fez em pedaços a serpente de bronze. Nos versículos seguintes desse relato, é dito sobre Ezequias: “No Senhor, Deus de Israel, confiou [...) porque se chegou ao Senhor, não se apartou de após ele [... assim foi o Senhor com ele” (2 Reis 18.5-7).

Por Henrique Pesch.

Compartilhe este artigo com seus amigos.

Comentário

Seu comentário é muito importante

Postagem Anterior Próxima Postagem