Dominador/dominado
Dentro das relações familiares, o fator limite é de suma importância para a saúde integral da famÃlia. Todas as vezes que o limite é subtraÃdo, as relações são prejudicadas. Quando esse princÃpio não é observado, o ser humano invade a liberdade do outro. Deixa de elaborar uma relação por igual para dar lugar a uma relação de dominador/dominado. Em muitas relações familiares, podemos identificar a vÃtima e o vitimizador, ou o vitimizador que se faz de vÃtima. O vitimizador é todo aquele que usa de poder ou pseudo poder para subjugar o outro, desenvolvendo um papel de dominador. E a vÃtima é o alvo desse poder em ação. Muitas das relações existentes foram edificadas por esses dois extremos, e só subsistem pela força do dominador e pelo medo do vitimizado. À relação dominador/dominado ou vitimizador/vitimizado só é rompida com a existência de limites estabelecidos.
Todos nós sabemos muito bem que existem hierarquias que foram estabelecidas de forma salutar e que suas estruturas são responsáveis pela continuidade da ordem e da paz social. Todavia, essa estrutura hierárquica não pode ser estabelecida lançando mão de atos que firam a dignidade humana, a liberdade pessoal, muito menos a identidade individual. Tal temática ficará mais clarividente no decorrer do assunto.
Tipos de limites
A priori, os limites podem ser divididos em três tipos: rÃgidos, difusos ou equilibrados.
O Limite RÃgido se estabelece quando predominam os sentimentos de onipotência, prepotência, autoritarismo, individualismo, auto-anulação, agressividade (fÃsica/psÃquica) e imposição. Uma das caracterÃsticas mais marcantes dessa rigidez é o individualismo, desdobrando-se num movimento egóico, fruto do egoÃsmo e do egocentrismo que está centrado na exaltação de si mesmo e na rejeição do outro. Quando esse fenômeno acontece, o personagem rÃgido exerce tirania sobre os demais membros da famÃlia, classificando os demais como vÃtimas de sua coerção. Por exemplo: “Eu sou o melhor”, “Penso melhor”, “Eu sei das coisas, você não sabe”, “Eu sou capaz e você incapaz”, “Eu posso tudo e você precisa de mim”.
O Limite Difuso é aquele no qual predominam a impotência, a incapacidade, a permissividade, auto-rejeição e passividade. À pessoa desenvolve um sentimento de impotência afirmando: “Não tenho forças”, “Não posso”, “Não consigo”. A incapacidade leva a pessoa a afirmar “Sou incapaz de…”. A permissividade permite outra pessoa fazer o que quiser – “Faço o que e como você quiser”. A auto-rejeição desabilita a auto-proteção, desguarnecendo a vÃtima, já que a mesma não se considera, não se ama, se desvaloriza. E a passividade culmina num comportamento de espectador, vendo tudo à sua volta de forma inerte, paciente, legitimando o dominador em suas ações.
Em algumas famÃlias, até existem limites, mas eles são tão tênues que quase não aparecem, como não são reforçados, não são respeitados. Cada componente da famÃlia agirá da forma que quer. Assim, eu posso tudo ou o outro pode tudo por mim e em mim. Diante dessas relações flácidas, pontuamos extremos; no entanto, existem gradações entre os extremos. Certo é que esse desequilÃbrio gera dominados e vitimizados. Quanto mais difuso você for, mas sujeito ao dominador você será. E para alguns é cômodo permanecer debaixo desses pseudos-poderes. Aprendemos que em qualquer relação, seja ela de cônjuges, de pais e filhos ou de irmãos, os limites rÃgidos e difusos vão gerar grandes dificuldades nos relacionamentos, mais cedo ou mais tarde.
Por último, temos o Limite Equilibrado, que difere do RÃgido e do Difuso. Nesse tipo de limite, predomina o poder de realização e de transformação. É o poder de realizar ações de transformação da própria vida em vez de querer mudar o outro. Ações de realização de si mesmo, que concomitantemente influenciarão de maneira positiva o próximo.
No Limite RÃgido, há um padrão de onipotência e prepotência, abusos de poder. No Difuso, há a impotência e permissividade. Já no equilÃbrio existe o poder leal, baseado, é obvio, pelo equilÃbrio entre o direito pessoal e o alheio.
Pseudos-poderes e poder real
Quando falamos das relações com Limites RÃgidos, o fundamento desses vÃnculos deriva-se de um pseudo-poder. Pseudo porque não é original, não é natural, é imposto; a relação não é verdadeira em sua totalidade, ainda que de faro exista, pois consiste em poderes de coerção.
Da mesma forma, quando falamos do Limite Difuso, é outra face do pseudo-poder, porque se faz legÃtimo na ausência de restrição do “ser vitimizado”, e não da autorização dele. Ou seja, entendemos que numa famÃlia que existam limites difusos, os membros abrem mão de seus papéis, gerando automaticamente agentes externos com pseudos-poderes e a ausência de poder real/legÃtimo. Diante do exposto, afirmamos que somente o real poder pode quebrar o cÃrculo vicioso enraizado no seio de muitas famÃlias, permitindo a reconstrução de relacionamentos verdadeiros e saudáveis, ação esta que não se solidifica da noite para o dia, muito menos de forma fácil.
Assim, o único poder real é o de mudar a nós mesmos. Não temos o poder de mudar quem quer que seja. Quando criamos a ilusão de que temos poder de mudar os outros, entramos na onipotência e na prepotência, e nos frustramos diante da realidade da impotência. O poder verdadeiro está em realizarmos o que temos que realizar em nós mesmos. O poder verdadeiro é esse que cabe a nós realizar em nós mesmos, com o auxÃlio indispensável do EspÃrito Santo, para sermos transformados em pessoas melhores. Paulo registra a batalha que possuÃa para moldar-se, vencer a si mesmo, para então pregar aos outros, e não ser reprovado: “Antes subjugo o meu corpo e o reduzo a servidão…”, 1 CorÃntios 9.27. Isso não significa que deixaremos os demais membros fazerem o que quiserem, mas que só teremos autorização e autoridade legÃtima quando laborarmos nossa própria vida de forma correta, justa, integra e amável. Só quando os outros veem em nós seres humanos melhores, começaremos a mexer com as engrenagens do sistema familiar, contribuindo para uma melhora coletiva.
Conscientizemo-nos, assim, que o poder de realização e de transformação nos farão pessoas melhores, mais equilibradas. Isso gerará autoridade ao estabelecer limites, pois difere em muito do autoritarismo, do limite rÃgido, do pseudo-poder. À pessoa que fala com autoritarismo fala da boca para fora, sem autoridade, porque faz esforço para exercitar aquilo que fala. Grandes lÃderes, pelo seu exemplo de vida, não precisam gritar para conseguir alguma coisa. Eles simplesmente pedem.
Quando o rei Davi simplesmente comentou que desejava beber um pouco de água do poço de Belém, três de seus valentes romperam em perigo, mas trouxeram-lhe a água que tanto desejava. Notem que o texto não registra que Davi mandou buscar água, nem mesmo que pediu para que buscassem, ele somente comentou de seu desejo. Davi não possuÃa pseudo-poder, ele havia conquistado o poder real. Ele possuÃa autoridade genuÃna.
Sendo assim, que o Senhor nos ajude a exercitar a lição de Jesus: “Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós”, Mateus 7.12. Agindo assim, constituiremos famÃlias melhores, com pessoas melhores e uma sociedade saudável.
Por, Ivan Tadeu Panicio Junior.
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