Vivemos em tempos marcados por relativização da verdade e profunda crise ética. Diante disso, uma pergunta se impõe com urgência: quando o silêncio se torna um erro e falar se torna uma necessidade inadiável? Embora a BÃblia valorize o domÃnio da lÃngua e a sabedoria de se calar em muitos momentos, ela também apresenta situações em que ficar em silêncio é sinônimo de omissão, conivência ou até pecado. Assim, se o silêncio não é uma opção, pois, em certos casos, é preciso falar, então como falar e o que falar?
Nosso objetivo neste texto é refletir sobre a inevitável
necessidade de se posicionar com palavras especialmente em tempos de injustiça
ou pecado. Ao mesmo tempo, destacar o equilÃbrio cristão entre falar com
coragem e com sabedoria (Efésios 4.15).
A princÃpio, é preciso considerar que, em algum momento,
recorremos ao silêncio para evitarmos algum tipo de problema ou porque não
temos a resposta adequada. Por outro lado, há momentos em que o silêncio se
torna omissão ou cumplicidade e, por isso, é necessário falar - mas, com
sabedoria, sem negligenciar a verdade e o amor.
O poder do silêncio e o peso da palavra
As Escrituras nos ensinam sobre o valor do silêncio (Eclesiastes
3.7b). Em seus 14 pares de antônimos, o sábio Salomão ensina muitas verdades
para a vida, destacando dois momentos: o silencio e a fala na hora certa.
Ao comentar esse texto, Derek Kidner observa que “a
necessidade de falar vem depois da necessidade de guardar o silêncio”.' E
complementa, dizendo que “nada do que fazemos parece ficar livre desta relatividade
e desta pressão, quase uma imposição, vinda de fora”.
Walter C. Kaiser observa que é melhor permanecer em silêncio
no calor da adversidade (2 Reiss 2.3-5), mas reconhece a importância de, em
determinados momentos, a pessoa falar e clamar contra o mal testemunho - ainda
que a ninguém mais senão a Deus.º
Quando Cristo esteve diante do rei Herodes, este “[...]
Interrogava-o com muitas palavras, mas Jesus nada lhe respondeu” (Lucas 23.8,9,
NAA).? Vemos nesse episódio que Jesus prefere manter o silêncio, provavelmente
porque já havia sido declarado inocente“ e continuava sendo submetido a um
julgamento inapropriados Diante da pergunta de Pilatos sobre se Ele era o Rei
dos judeus, Jesus havia dito: “Tu o dizes” (Lucas 23.8,9, ARC). Essas duas
situações revelam, em Jesus, uma postura sábia: na primeira, Ele responde a
Pilatos de forma breve, atribuindo à ele a afirmação; no encontro posterior com
Herodes, Sua resposta foi o silêncio.
Aqui vemos o poder do silêncio e o peso da palavra nas adversidades
enfrentadas por Jesus. E entendemos que, em muitos Casos, precisamos agir de
forma semelhante - seja respondendo com objetividade e correção, seja nos
calando em contextos em que a injustiça tenta nos acusar.
Preciso falar: o silêncio me condena
Há situações em que estamos sendo interrogados inadequadamente
e precisamos nos posicionar para defender princÃpios e valores éticos. Caso
contrário, o silêncio se torna conivência, omissão ou até pecado (Tiago 4.17).
Assim, enfrentamos tensões em vários momentos das nossas vidas, nos quais falar
pode causar conflito, mas calar pode causar destruição. Diante disso,
precisamos pedir sabedoria a Deus para que possamos lidar com problemas de
cunho pessoal ou auxiliar aqueles que precisam de orientação.
Em Ester 4.14, Mardoqueu orienta a rainha a não se calar em
meio às adversidades. Era preciso que Ester comparecesse perante o rei e, se
deixasse de agir, livramento viria de outra parte, porém o fim dela seria
trágico.
Há momentos que não podemos nos calar, que falar é um ato de
fidelidade a Deus e o cristão não pode se calar diante da injustiça ou da
opressão. Em tempos de injustiça, calar-se pode significar concordar.
Falar com sabedoria e amor
Vivemos experiencias, em determinadas situações, nas quais precisamos
falar. E, nesses casos, é necessário nos expressarmos com sabedoria e amor. A
orientação bÃblica de Paulo é que sigamos “a verdade em amor” (Efésios 4.15,
ARA), o que sugere que tudo o que os cristãos falem ou façam deve ser honesto e
verdadeiro, e deve ser dito ou feito com amor.º O apóstolo também advertiu: “A
vossa palavra seja sempre agradável, temperada com sal, para saberdes como
deveis responder a cada um” (Colossenses 4.6, ARA). Em Provérbios 15.1, O sábio
diz: “A resposta branda desvia o furor”? Assim, podemos dizer que não basta
falar a verdade; é necessário também saber falar com graça e sabedoria.
O que falar quando a verdade está em jogo
Nem tudo o que vemos, ouvimos ou nos é compartilhado deve
ser falado ou divulgado. Por outro lado, existem ocasiões em que é necessário
que falemos (Atos 4.20, ARA).
É correto ficar calado quando for para evitar contendas
inúteis (Provérbios 17.27,28) e falar quando a verdade precisa ser dita, mesmo
que isso custe algo. A orientação bÃblica é: antes de falar, ore (Salmos 141.3,
ARC). Há momentos em que o silêncio é sabedoria, mas há outros em que calar-se
é omitir a verdade. Diante disso, nós, como Igreja, precisamos ser a voz que
não se cala diante do erro. Mas, mais do que falar, é necessário falar com
propósito, direção e temor de Deus.
ConcluÃmos que o equilÃbrio entre a fala e a prudência
consiste em reconhecer que há situações em que o amor exige que se fale. No
entanto, o cuidado com como se diz e o que se diz revela maturidade espiritual
(Colossenses 4.6).
Lembre-se: lavar as mãos (Mateus 27.24) e manter o silêncio,
em alguns casos, o torna cúmplice da injustiça. Há ocasiões em que a
neutralidade não é correta. Assim, em tempos de crise moral ou espiritual, não
se posicionar é, na prática, tomar partido do erro.
Noras
KIDNER, Derek. A mensagem de Eclesiastes: tempo de
chorar, tempo de rir. 2 ed. São Paulo: ABU Editora, 2004, p. 26.
KAISER JR,, Walter C.
Comentários do “Antigo Testamento. Eclesiastes. São Paulo: Cultura
Cristã, 2015, p. 84.
ARRINGTON,
French L.; STRONSTAD, Roger (eds.). Comentário BÃblico Pentecostal do
Novo Testamento. Vol. 1. Mateus - Atos. Rio de Janeiro: CPAD, 2024, 469.
Cf. Le 23.4, BÃblia ARC, CPAD.
Apud
RADMACHER, Earl D. et al. O novo comentário BÃblico Novo Testamento:
com recursos adicionais. Vol 2. Rio de Janeiro: Central Gospel, 2010, p. 210.
Apud RADMACHER, p. 509.
ARC.
por Eder Machado
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