Sobre o eu e os outros - 2ª parte

Sobre o eu e os outros - 2ª parte


No episódio que estamos analisando, do vídeo que viralizou meses atrás de uma moça que não cedeu lugar em um voo da GOl a uma criança que estava chorando, mesmo levando em consideração a complexidade de uma família se instalar em um avião, nos parece que a criança não conseguiu ser contida em seu desejo de se alocar onde não tinha seu assento reservado. E mesmo cientes de que um ato isolado não nos dá o direito de apontar dedos, é cada vez mais recorrente o fato de que muitas crianças têm dificuldade de serem contrariadas, pois não aprenderam desde cedo a ouvir “Não”.

Na Bíblia, temos o triste exemplo de Adonias, filho de Davi com Hagite, que tenta usurpar o trono do seu pai idoso, desonrando-o perante todo o povo. E o mais interessante é que o texto bíblico nos informa que Adonias agia assim porque “Seu pai nunca o havia contrariado; nunca lhe perguntava: ‘Por que você age assim?’” (1 Reis 1.6, NVI); “Seu pai nunca o havia disciplinado, nem sequer lhe perguntava: ‘Por que está fazendo isso?’” (1 Reis 1.6, NVT).

A base de uma boa educação que nos prepare para a vida adulta precisa conter contrariedades. Toda criança precisa ser treinada para lidar com frustrações, e até mesmo com decepções e traições por parte dos intitulados amigos. Por melhor que possa ser nossa vida ou condição financeira, não temos tudo o que desejamos. A vida raramente transcorre como queremos, os nossos planos fracassam e as pessoas nos decepcionam.

Assim sendo, não devemos dizer sempre “Sim” a todas as solicitações dos filhos, pois sabemos que muito do que pedem ou desejam não é correto e nem lhes fará bem. E precisamos ajustar as reações dos filhos quanto a choros e birras desde bebês, afirmando de forma firme que entendemos que eles estão tristes, mas, infelizmente, não será possível realizar, comprar ou dar o que desejam.

Crianças se adaptam muito bem a pais firmes, que não negociam sob chantagem emocional, e a limites previamente conhecidos e estabelecidos. Portanto, como pais, nós precisamos estabelecer horários fixos para atividades; não ceder às birras, alterando a rotina; manter a consistência nas regras entre todos os cuidadores; oferecer opções viáveis nos momentos em que estão sendo contrariados; e elogiar quando lidam bem com um “Não” ou quando se mantêm equilibrados quando frustrados. Afinal, viver implica lidar com inúmeros “nãos”, e ainda assim manter a compostura, o coração limpo, e atitudes gratas diante das pessoas e de Deus.

A importância do domínio próprio

A passageira filmada havia comprado sua passagem com custo extra para se assentar em uma poltrona especial, mais confortável, junto à janela do avião. Ao ser filmada, mesmo estando com seus direitos de vida privada, honra e imagem sendo violados, ela simplesmente procura não se envolver na discussão e mantém, em grande parte da gravação, os olhos fechados.

A julgar pela forma destemperada de como as pessoas convivem hoje, me surpreendeu o fato de a passageira não discutir ou se alterar. No vídeo postado, ela olha, percebe que estava sendo filmada, ouve uma série de insultos, mas fecha os olhos e fica em silêncio.

Por mais que pudesse fazê-lo, ela não tinha nenhuma obrigação de ceder seu lugar. A passageira que a filmou disse ter “perdido totalmente o controle”, mas, por mais que pudesse se defender, a passageira filmada escolheu se calar, engolindo as afrontas e evitando confrontos – ato raro nos nossos dias.

Quantos de nós conseguimos nos calar quando confrontados?

Desde o Éden, a começar com Adão, desenvolvemos uma atitude defensiva quando somos atacados, injustiçados ou caluniados. Não é fácil engolir a revolta quando somos desrespeitados. Não é simples conseguir acalmar a ira abrupta que cresce no nosso interior quando ouvimos palavras que ferem nossa honra ou autoestima.

É obvio que em muitas situações na vida precisamos nos posicionar, explicar nossas razões, falar de forma direta e franca, e até mesmo nos defender judicialmente. Mas será que realmente devemos sempre nos envolver diretamente nos embates? Não percebemos que perdemos a razão quando damos vazão ao despeito ou queremos manter nosso orgulho intacto?

Há os que se defendem dizendo “Não consigo levar desaforo para casa” ou “Deus sabe que tenho sangue quente e que preciso dizer a verdade, doa a quem doer”. Porém, a Bíblia afirma: “Mais vale controlar o seu espírito do que conquista uma cidade” (Provérbios 16.32); “Como a cidade com seus muros derrubados, assim é quem não sabe dominar-se” (Provérbios 25.28); “O tolo dá vazão à sua ira, mas o sábio domina-se” (Provérbios 29.11).

Dentre muitas coisas a aprender com este episódio, sem dúvida, precisamos avaliar como tem sido nossa postura quando um embate surge. Se nós somos os primeiros a provocar ou chamar outros à briga, já estamos pecando: “Há seis coisas que o Senhor odeia, sete coisas que ele detesta: olhos altivos, língua mentirosa, mãos que derramam sangue inocente, coração que traça planos perversos, pés que se apressam para fazer o mal, a testemunha falsa que espalha mentiras e aquele que provoca discórdia entre irmãos” (Provérbios 6.16-19). Afinal, aqueles que se envolvem em dissensões, brigas e discórdias não herdarão o Reino de Deus (Gálatas 5.20).

Não é fácil negar nosso eu, oferecer a outra face, andar a segunda milha ou mantermos a humildade quando humilhados. Mas precisamos seguir o manual bíblico: “Dê a sua face ao que o fere; farte-se de afronta” (Lamentações 3.30). São muitas as lições que apreendemos a partir das ações dos outros. E minha oração é que permitamos que o Espírito Santo nos ensine a viver a vida de forma sóbria, tendo atitudes justas com terceiros, enquanto mantemos nossa santidade e intimidade resguardadas em Deus!

por Elaine Cruz

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