Telas na infância: inevitável ou arriscado?

Telas na infância: inevitável ou arriscado?


O uso de telas por crianças pequenas é um hábito comum entre os brasileiros. A televisão, o celular ou o tablet são alguns recursos utilizados pelos pais para promover a distração dos pequenos, seja em casa, em viagens de carro ou transporte público, em restaurantes e até mesmo nos cultos dentro das igrejas. Por alguma razão, a nossa geração de pais acredita que deve evitar ao máximo o tédio ou a inquietação nas crianças, para que não brinquem, corram ou chorem como é normal em sua faixa etária.

Na rotina doméstica, as telas são utilizadas para apresentar vídeos, desenhos animados e músicas para as crianças, com o objetivo de promover entretenimento para que a família possa realizar tarefas diárias, trabalhos profissionais ou até mesmo para aquietar as crianças no momento da refeição. Há famílias que usam as telas até para a hora do banho e do sono, de maneira que toda essa geração de crianças tem crescido entendendo que o uso das telas e aplicativos é algo natural. E nós, como pais e responsáveis, precisamos nos questionar: tem algum problema nisso?

Precisamos reconhecer que o uso da tecnologia e da comunicação digital faz parte da vida desta geração e certamente não poderá ser evitado por completo. A internet, as redes sociais e os aplicativos se tornaram ferramentas indispensáveis na comunicação, nas atividades profissionais e nos serviços. Esta geração tem crescido dominando o “idioma digital” antes mesmo de falar a língua natal dos seus próprios pais; ou seja, bebês que ainda não falam são capazes de olhar para ícones do Google e do Youtube e reconhecer a função deles. Já percebeu algum exemplo assim em sua família?

Entretanto, cabe à família e, especialmente, aos pais se questionarem: será que o uso precoce das telas e das mídias por crianças pequenas não é prejudicial para a sua formação? Eu aprendi de uma maneira bem dolorosa que sim. Em 2018, quando minha filha tinha apenas quatro anos, descobrimos que ela estava com um problema sério de visão. Ela estava com 5 graus de miopia e estava perdendo a capacidade de enxergar longas distâncias.

Nesse processo, buscamos ajuda de muitos oftalmologistas até encontrarmos uma especialista no Instituto Brasileiro de Oftalmologia, que conseguiu fazer um diagnóstico preciso. O uso de telas em nossa rotina doméstica estava adoecendo a visão de nossa pequena. A partir desse entendimento, fizemos uma mudança drástica na rotina: zeramos o uso das telas, incluímos atividades ao ar livre, fizemos uma fisioterapia e acompanhamento rigoroso.

Durante o tratamento, aprendemos com os especialistas que a visão da criança está em formação até mais ou menos cinco anos de idade. Quando a criança faz uso de telas e se condiciona apenas a ver de perto, sua capacidade de enxergar o que está longe começa a ser prejudicada. No caso da minha filha, conseguimos reverter a condição porque o acompanhamento médico foi feito antes dos cinco anos. Foi nesse contexto que os especialistas compartilharam que está acontecendo uma epidemia silenciosa na infância por causa do uso precoce de telas: uma epidemia de miopia.

A cada ano, mais e mais crianças desenvolvem miopia na primeira infância. Esses dados foram confirmados, pois em 2019 os casos de miopia entre crianças e adolescentes de até 19 anos aumentaram 134%. Além disso, o número de prescrição de óculos para crianças triplicou no país, comparado há cinco anos.

A miopia é causada por uma alteração no globo ocular, que dificulta a visão de longe. Certamente pode ocorrer por influência genética. Entretanto, a exposição contínua a aparelhos eletrônicos aumenta a chance de uma criança se tornar míope. E essa questão se agravou durante a pandemia da Covid-19, pois o isolamento social intensificou o uso das telas por crianças por um longo período. Por isso, a miopia tem sido um dos problemas de saúde pública que mais cresce no mundo.

Além disso, o uso de telas e de tudo que a acompanha (vídeos, redes sociais, jogos online, contato com desconhecidos etc.) causa outros danos na saúde e na mente da criança: problemas de aprendizagem, à medida que diminui a capacidade de concentração; problemas de saúde mental, como, por exemplo, ansiedade ou transtornos alimentares e de comportamento; problemas de sono; problemas de coluna, devido a alterações posturais; e problemas de memória.

Diante disso, o que a família deve fazer? Primeiramente, precisamos reconhecer que o uso de dispositivos eletrônicos, da internet e de aplicativos tem seu valor no nosso cotidiano. Em alguns momentos, inclusive, será inevitável.

Entretanto, essa verdade não se encaixa na realidade de uma criança menor de dois anos, por exemplo. Essa criança precisa de vínculo afetivo, de tempo de qualidade com família, de boa alimentação, de rotina segura, de atividade física e de contato com a natureza para se desenvolver de forma saudável, e não do Youtube.

O uso das telas, dos aplicativos, dos recursos eletrônicos como ferramentas didáticas na educação cristã nas igrejas é muito bem-vindo. Mas colocar a criança para ver o celular durante o culto para mantê-la quieta é aliená-la da experiência cristã. As crianças são bem-vindas nos cultos e a Igreja precisa saber acolher todas elas.

Os pais precisam fazer uma escolha consciente (e controlada) quanto ao uso dos aparelhos eletrônicos e da internet por seus filhos, para que eles não estejam expostos a perigos ainda maiores, como contato com desconhecidos abusivos. Atualmente, o isolamento social de crianças ocorre de forma digital e isso tem prejudicado o vínculo familiar, a comunicação e a educação dessas crianças.

Sabedoria e equilíbrio são essenciais para lidar com essa questão. No Salmo 101, o salmista afirma: “Não porei coisa má diante dos meus olhos [...]” (v. 3). Este é um excelente princípio que podemos adotar. Os pais e os responsáveis pelas crianças devem acompanhar TUDO o que elas consomem através das telas, a fim de verificar se estão colocando os pequenos em contato com um conteúdo saudável ou com algo que vai prejudicá-los de alguma maneira. O cuidado, a educação e a formação de uma criança nos seus anos iniciais são desafiadores e complexos. Entretanto, essa é a missão mais importante que Deus confia a uma família.

por Flavianne Vaz

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