O revestimento e o viver no Espírito

O revestimento e o viver no Espírito


Deus está realizando uma grande obra no mundo em nossos dias e, para tanto, Ele conta com uma igreja cheia do Seu Espírito

O ensino bíblico sobre o revestimento de poder e o viver no Espírito é bastante claro no Novo Testamento. Para uma definição mais precisa, será necessário ao leitor uma leitura mais atenciosa e um olhar sem preconceitos — portanto, mais aprofundado — nas teologias pneumatológicas do teólogo e historiador Lucas e do apóstolo Paulo, mestre e pregador aos gentios. O conceito de revestimento de poder entre os pentecostais clássicos é uma referência direta ao fenômeno bíblico conhecido como batismo com ou no Espírito Santo. De acordo com o pastor e professor Antônio Gilberto, o batismo com o Espírito Santo, a um só tempo, é: (1) uma ditosa promessa da parte de Deus ("A promessa do Pai", Atos 1.4); (2) uma dádiva celestial inestimável ("O dom do Espírito Santo", Atos 2.38); (3) uma imersão do crente no espiritual e sobrenatural de Deus ("Sereis batizados com o Espírito Santo", Atos 1.5 — a partícula original desta referência também permite a tradução "batizados no Espírito Santo"); e (4) um revestimento de poder do alto (Lucas 24.49). É como alguém, estando já vestido espiritualmente, ser revestido de poder do céu. O termo "revestido", no original, conduz a essa ideia.(1)

Como se pode ver, esse evento é conhecido também como "A promessa do Pai", de acordo com as palavras do Senhor Jesus nos dias finais do Seu ministério terreno. Esta declaração de Jesus foi registrada por Lucas, no primeiro volume de sua obra Lucas-Atos: “E eis que sobre vós envio a promessa de meu Pai; ficai, porém, na cidade de Jerusalém, até que do alto sejais revestidos de poder” (Lucas 24.49). Como se percebe, o texto aqui indicado menciona tanto a expressão "promessa do Pai" como também a identificação direta daquilo que se conhece como o batismo com ou no Espírito Santo: "sejais revestidos de poder". Quando se faz a comparação do texto de Lucas 24.49 com o texto de Atos 1.4,5, onde Jesus reafirma a promessa do Pai, garantindo que os Seus discípulos seriam batizados ou revestidos pelo Espírito Santo dali a alguns dias, não resta nenhuma dúvida de que as duas expressões significam a mesma coisa, isto é, se referem ao mesmo fenômeno da nova aliança de Deus com o Seu povo. O pastor Silas Daniel, resume de forma clara e objetiva essa verdade bíblica: “A expressão ‘batismo no/com Espírito Santo’ aparece na Bíblia seis vezes: Mateus 3.11, Marcos 1.8, Lucas 3.16, João 1.33, Atos 1.5 e Atos 11.16. Em todos esses casos, a expressão aparece sempre com um significado carismático, isto é, de revestimento de poder, como fica ainda mais explícito a partir das passagens correlatas que se referem descritivamente à experiência aludida naquelas passagens (Lucas 24.49; At 1.8; Atos 2.1ss). O termo grego baptizo (“batismo”), que significa 'imersão', é usado figurativamente para descrever a imersão plena do crente nessa dimensão carismática, na 'virtude' (dunamis, “poder”, Atos 1.8) do Espírito. A preposição grega en – que pode significar 'em' ou 'por' dependendo do contexto – é usada nessas seis porções bíblicas claramente com o sentido de 'em', uma vez que Jesus nitidamente é apontado nelas como sendo o efetuador desse batismo e o Espírito, indicado como sendo o elemento no qual essa imersão é efetuada”.(2)

Todas as vezes que o texto bíblico se refere à promessa do Pai, quer no Antigo, quer no Novo Testamento, o sentido prioritário é a capacitação que Deus quer dá ao seu povo por intermédio do Espírito Santo para o cumprimento de uma missão na terra. E é o livro de Atos dos apóstolos que vai detalhar esse revestimento de "poder do alto" sobre a vida dos discípulos, com as manifestações visíveis de diversas ações do Espírito Santo, que podiam ser reconhecidas tanto com a evidência das línguas glossolalia como também pela adoração revitalizada, com a mensagem profética e a realização de sinais e prodígios, bem como pela ousadia na proclamação da Palavra de Deus. Um dos objetivos de Lucas na redação do seu livro foi exatamente o de instruir a Teófilo sobre a pessoa, os ensinos e as obras de Jesus ressuscitado, realizadas por intermédio do Espírito Santo, entre os primeiros discípulos do Senhor Jesus Cristo. Assim, ele faz um levantamento geral das coisas que se sucederam na igreja de Cristo, iniciando por Jerusalém (Atos 2.1-47), e continua relatando as manifestações dos carismas e outras operações do Espírito Santo em Samaria (Atos 8.1-25), em Damasco (Atos 9.10-22), em Cesareia marítima (Atos 10.34-48), em Éfeso (Atos 19.1-20), em Corinto (1 Coríntios 2.1-5), em Tessalônica (1 Tessalonicenses 1.5) e até chegar em Roma, a capital do império romano (Atos 28.16-31; Romanos 15.14-19). Jesus é aquele que efetua essa capacitação e o Espírito Santo é a pessoa divina que expõe e disponibiliza o seu poder, isto é, a força capacitadora que se manifesta para a execução da missão dos discípulos a serviço do Reino de Deus.

Para reafirmar a importância e enorme necessidade da igreja em conhecer, receber e exercitar no seu dia a dia essa graça divina, esse poder que é disponibilizado à Igreja de Jesus Cristo, o teólogo Stanley Horton pontua acertadamente que “os pentecostais acreditam que cada crente deve receber esse revestimento de poder especial para o serviço cristão. Por exemplo, a declaração doutrinária das Assembleias de Deus [nos Estados Unidos] a respeito do batismo no Espírito Santo começa assim: 'Todos os crentes têm direito à promessa do Pai e devem aguardá-la ardentemente e buscá-la com sinceridade. [...] Juntamente com ela vem o revestimento de poder para a vida e para o serviço'. Não basta ler a respeito da experiência em Atos dos Apóstolos. Nem é suficiente reconhecer como sã essa doutrina e saber que a experiência é para os cristãos hoje. Se a Igreja estiver operando dentro dela a dimensão dinâmica da vida no Espírito, os crentes individuais deverão receber pessoalmente esse batismo no Espírito Santo”. (3)

No Antigo Testamento, as Sagradas Escrituras, apresentam cerca de cem versículos que mencionam a pessoa e as obras do Espírito Santo na vida daqueles que foram chamados por Deus para a realização de alguma tarefa específica dentro dos propósitos divinos. As expressões mais comuns para essa capacitação do Espírito no período da antiga aliança, podem ser facilmente identificadas: “E o Espírito de Deus se movia” (Gênesis 1.2); “E o Espírito de Deus o encheu de sabedoria” (Êxodo 35.31); “Veio sobre ele o Espírito de Deus” (Números 24.2); “E o Espírito do Senhor revestiu a Gideão” (Juízes 6.34); “E o Espírito do Senhor tão possantemente se apossou dele” (Juízes 14.19); “E o Espírito do Senhor se apoderou de Davi” (1 Samuel 16.13); “E o Espírito de Deus revestiu a Zacarias” (2 Crônicas 24.20); “Entrou em mim o Espírito, e me pôs em pé e falou comigo” (Ezequiel 3.24). Em todas essas descrições, nota-se uma ação definida, proposital e específica da pessoa do Espírito Santo com relação aos personagens envolvidos. No entanto, o que se tem no Novo Testamento com relação ao revestimento e o viver no Espírito é incomparavelmente maior. É uma operosidade tão extraordinária, conforme podemos ver tanto em Lucas quanto no apóstolo Paulo e outros escritores do Novo Testamento, ao fazerem menções diretas e indiretas a esse poderoso derramamento, enchimento e revestimento do Espírito de Deus na vida dos verdadeiros seguidores de Jesus Cristo.

Os propósitos do revestimento do Espírito Santo são inequívocos para a vida daqueles que o recebem. Na antiga aliança, Deus fez a promessa usando vários dos Seus profetas (Joel 2.28,29; Isaías 44.3; Ezequiel 36.27; Zacarias 12.10), falando acerca de um futuro derramamento do Seu Espírito; e no período da nova aliança, depois da ressurreição e ascensão do Senhor Jesus Cristo, o Espírito foi enviado à Igreja pelo Pai e pelo Filho (João 14.16,26; 15.26), com propósitos definidos, conforme se pode constatar no ensino geral do Novo Testamento. O saudoso pastor e teólogo Antônio Gilberto sintetizou esses divinos propósitos do revestimento do Espírito Santo: “(1) Edificação espiritual pessoal, mediante o cultivo das línguas estranhas (1 Coríntios 14.4,15; (2) maior dinamismo espiritual, mais disposição e maior coragem na vida cristã para testemunhar de Cristo e proclamar o evangelho (comparar Marcos 14.66-72 com Atos 46-20); (3) um maior desejo e resolução para orar e para interceder (Atos 2.42; 3.1;4.24-31; 6.4; 10.9; Romanos 8.26); (4) uma maior glorificação do nome do Senhor ‘em Espírito e em verdade’ (João 4,24), nos atos e na vida do crente (João 16.13,14); (5) uma maior consciência de que Deus é o nosso Pai e que nós somos Seus filhos (Romanos 8.15,16; Gálatas 4.6); (6) o batismo é também um meio para a outorga por Deus dos dons espirituais – ‘falavam línguas e profetizavam’ (Atos 19.6)".(4)

Esse fenômeno espiritual é apontado por João, o Batista, como uma obra futura de Jesus, conforme os textos de Mateus 3.11; Marcos 1.8 e Lucas 3.16. Lucas, retoma a mesma terminologia em Atos 1.5, ao descrever as palavras de Jesus a Seus discípulos: “Vós sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias”. O mesmo escritor usa os mesmos termos ao descrever como Pedro interpretou a experiência pentecostal na casa de Cornélio. Ele afirma que, em sua pregação, o apóstolo Pedro relembrou as palavras do Senhor Jesus: “Sereis batizados no Espírito Santo” (Atos 11.16). Essa gloriosa ação divina do revestimento de poder do Espírito Santo é um acontecimento tão extraordinário que o Espírito Santo inspirou os sacros escritores da Bíblia com uma série diversificada de palavras, uma variedade de expressões linguísticas e termos conhecidos na época, para que não houvesse nenhuma dúvida de que Deus realmente estava operando algo novo na terra, enquanto tornava possível esse derramamento do Seu Espírito sobre toda a carne (Atos 2.16-39; 4.31; 8.14-17; 10.44-47; 11.24; 13.2; 19.1-6 etc.). De acordo com J. Rodman Williams, “a vinda do Espírito Santo para revestir o povo de Deus, a igreja, é um ato extraordinário e poderoso de Deus. É uma dádiva, um ato gracioso de Deus (João 7.37-39; João 16.13; 15.26; 16.7). Os evangelhos a apontam, o livro de Atos dos Apóstolos a descreve (Atos 2, 8, 10, 19) e as epístolas a pressupõem. O ato de Deus é dar e o do povo é receber. Esse é o ensino claro do Novo Testamento”.(5)

É preciso lembrar que as epístolas foram escritas a pessoas que já haviam recebido o batismo com o Espírito Santo. Essa é uma das razões por que a maior parte das epístolas não apresenta, por exemplo, grande incentivo para que seus destinatários desejassem ou estivessem orando pelo recebimento do batismo no Espírito Santo. A perspectiva de Paulo difere da perspectiva de Lucas, pois enquanto Paulo enfatiza o viver no Espírito, Lucas, por sua vez, enfatiza o revestimento do Espírito. Viver no Espírito Santo, de acordo com as Santas Escrituras, significa não satisfazer os desejos da carne: “Digo, porém: andai em Espírito e não cumprireis a concupiscência da carne” (Gálatas 5.16, ARC).

Assim, pode-se afirmar que, embora a Bíblia inteira esteja repleta de exemplos que testemunham a plenitude do Espírito Santo na vida humana para o desempenho de algum serviço designado por Deus em favor do Seu Reino na terra, é o Novo Testamento que descreve de um modo específico e inconfundível o agir dinâmico e poderoso de Deus por meio do Espírito Santo vindo sobre os discípulos de Jesus Cristo, capacitando-os para a proclamação do evangelho no mundo inteiro. Ainda que, por um tempo considerável, a maior parte dos cristãos esteve sem conhecer e nem experimentar esse poder divino, nos últimos séculos, no chamado movimento de renovação espiritual, também conhecido como Movimento Pentecostal Moderno, que alcançou seguidores de Cristo em todas as partes do mundo, um número incontável de pessoas dão testemunho da realidade de estar cheias do Espírito Santo. Um dos exemplos mais contundentes, nesse aspecto do pentecostalismo, é a história centenária da Igreja Assembleia de Deus no Brasil (2011-2024), que, desde a sua fundação e organização, tem feito ouvir no mundo inteiro a sua voz com uma mensagem solidificada na ortodoxia bíblica, assegurada por uma hermenêutica saudável e por uma ortopraxia equilibrada, cuja mensagem, de forma simplificada, pode ser assim sintetizada: Jesus salva! Jesus cura! Jesus batiza com o Espírito Santo! Jesus breve voltará!

Considerações finais

Dentre as verdades apreendidas a partir do estudo desse tema, pode-se afirmar que, assim como a descida do Espírito Santo com poder sobre a igreja cristã do primeiro século conferiu a esta uma qualidade extraordinária de vida espiritual, assim também os verdadeiros cristãos pentecostais contemporâneos podem testemunhar que realmente podem viver, à luz da doutrina bíblica, essa mesma experiência hoje. É da vontade de Deus que o Espírito Santo continue infundindo poder, dinâmica, vida perene e visão espiritual à Sua Igreja a fim de que todos os propósitos delineados por Cristo a ela sejam plenamente alcançados.

É de extrema importância que o ministério do Espírito Santo e a Sua plenitude, bem como as suas ações carismáticas, continuem sendo evidenciados poderosamente assim como são demonstradas no livro de Atos dos Apóstolos, bem como na história do Movimento Pentecostal. Este é, sem dúvida, um dos grandes desafios da igreja contemporânea. Vivemos em dias nos quais o Espírito Santo age com o máximo de atividade no mundo para a conversão dos pecadores e quando também os crentes em Jesus podem ser cheios do Espírito e viver no Espírito, através da experiência do batismo no Espírito, do exercício dos dons do Espírito e da produção do Seu fruto (Atos 2.1-4; Efésios 5.18; 1 Coríntios 12.1-8; Gálatas 5.16,22,23).

A pessoa e a obra do Espírito Santo não devem jamais ser negligenciadas. Deus está realizando uma grande obra no mundo em nossos dias e, para tanto, Ele conta com uma igreja cheia do Seu Espírito, pois somente assim será possível que a missão dada por Jesus à Igreja seja plenamente cumprida (Mateus 28.19,20). Cristãos que vivem no Espírito são pessoas que receberam o revestimento de poder do Espírito e permanecem no altar de Deus, andando com Deus, guerreando em oração, guiados pelo Espírito e, assim, motivados pelo serviço ao Reino de Deus, se santificam até que Cristo volte!

BIBLIOGRAFIA

HORTON, Stanley M. Teologia Sistemática: Uma perspectiva pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2019.

RICHARDS, Lawrence. Comentário Bíblico do Professor. São Paulo: Editora Vida, 2004.

CABRAL, Elienai. Comentário Bíblico Efésios. Rio de Janeiro: CPAD, 1999.

PETERS, George W. Teologia Bíblica de Missões. Rio de Janeiro: CPAD, 2000.

OSBORNE, Grant R. Comentário Expositivo Novo Testamento: Atos dos Apóstolos. São Paulo: Editora Carisma, 2022.

YANCEY, Philip. Oração: Ela faz alguma diferença?, São Paulo: Editora Vida, 2007.

WHITNEY, Donald S. Disciplinas Espirituais. São Paulo: Editora Batista Regular, 2021.

por Rayfran Batista da Silva

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