Como suportar o jugo da mocidade

Como suportar o jugo da mocidade


A juventude é uma fase da vida cheia de alegria, descobertas e conquistas, mas também é marcada por expectativas, frustrações, dúvidas, crises de identidade, angústias e ansiedade, um quadro negativo que, infelizmente, tem se agravado muito nos últimos tempos. Na verdade, há muito os problemas de saúde mental e emocional são apontados como o mal do século, representando um grande desafio para toda humanidade, inclusive a igreja. O que fazer para ajudar o jovem a suportar e vencer essa estação da vida que é tão bela, mas também tão desafiadora e conflituosa?

Preocupados com o bem-estar emocional e espiritual de seus liderados, líderes de adolescentes e jovens vivem às voltas com a demanda das muitas atividades em suas igrejas. Geralmente dedicados e bem-intencionados, eles se esforçam em busca de novidades que envolvam o grupo que lideram. Nesse processo, contudo, correm o risco de se transformarem em meros promoters ou terapeutas. Afinal, não são poucos os problemas que surgem e exigem atitudes e respostas do líder diariamente. Como desenvolver um estilo de liderança que atenda às reais necessidades da juventude de nosso tempo?

Discernir as causas das inquietações é passo fundamental. Ressalvados casos de transtornos que requerem psicólogos e psiquiatras, o que fazer no âmbito eclesiástico para ajudar jovens e adolescentes a vencerem crises comuns dessa etapa da vida? “Se conseguirmos envolvê-los com muitas atividades, o tempo vai passar depressa e logo tudo estará resolvido. Vamos estimular o desenvolvimento de seus talentos com artes, música, esportes e muita cultura. Isso vai ajudá-los a vencer a solidão. Vamos dar vazão às suas imaginações, toleremos as fraquezas, sejamos condescendentes com os fracassos. Essa fase vai passar e, lá na frente, tudo se ajeita”. Será?

Embora o envolvimento de jovens e adolescentes com atividades saudáveis contribua para a superação de dificuldades próprias de suas vivências (isso não pode ser desprezado), a Palavra de Deus tem uma mensagem muito mais profunda que essa visão humanista secular que costuma nos envolver. Há um processo espiritual (pessoal e individual) a ser vivido no tempo da juventude, do qual ninguém deve fugir. Essa realidade não pode ser ignorada. Não há um jeitinho de livrar o jovem do jugo da mocidade.

Lamentações 3.27-29 diz: “Bom é para o homem suportar o jugo na sua mocidade; assentar-se solitário e ficar em silêncio; porquanto Deus o pôs sobre ele. Ponha a boca no pó; talvez assim haja esperança”. Nesse texto, há um padrão inverso ao modelo de culto ao ativismo e à autonomia do ser, e ele transmite lições espirituais fundamentais:

1. Deus pôs um jugo específico sobre o jovem: Não se trata de uma circunstância opcional, da qual se possa escapar esperta e furtivamente. Há um jugo posto por Deus. E tudo o que Deus faz é bom. Mesmo o que para nós parece ser mal, se vem de Deus é porque é necessário à vida. Servirá para produzir bons frutos em nós e através de nós. Negar essa realidade, fantasiá-la e rejeitá-la não nos fará bem (Jó 2.10; Salmos 18.30-35).

Precisamos ter o cuidado de não “psicologizar” o que é espiritual, da mesma maneira que não podemos espiritualizar todas as reações humanas. O jovem deve ser ensinado que há circunstâncias comuns da vida que podem levá-lo ao abatimento, assim como existem questões espirituais que como tais devem ser discernidas e enfrentadas. Nesse contexto estão os conflitos de sua própria natureza pecaminosa com o padrão de vida ético, moral e espiritual que Deus estabeleceu.

O jovem não pode dar vazão a seus desejos. Há um jugo divino posto sobre ele. Deve conservar-se puro, obedecendo à Palavra de Deus (Salmos 119.9). A natureza carnal jamais aceitará isso sem impor fortes reações. De toda sorte, o jugo está posto.

2. O único caminho para a bênção é suportar o jugo. As Escrituras não apresentam outro caminho de vitória para o jovem, senão suportar o jugo da mocidade (Lamentações 3.27). O verbo suportar aponta para a necessidade de enfrentar, com resiliência e perseverança, as adversidades típicas da idade, os combates interiores, as tentações, as provações etc. O jugo tem o seu peso e pode ferir os ombros. Ainda assim deve ser suportado. Enquanto suporta o jugo, o moço e a moça vão vencendo suas irritações. O orgulho vai sendo quebrado. O Senhor vai trabalhando em seu temperamento e caráter. Aprendem a se submeter às autoridades, a serem humildes, a obedecer, honrar e servir. Ganham disciplina e crescem em todas as áreas da vida com extraordinários reflexos em seu futuro. O apóstolo João se dirigiu a um grupo de jovens bem treinados nesse processo: fortes, cheios da Palavra de Deus e espiritualmente vitoriosos (1 João 2.14).

Tentar tirar esse jugo dos ombros da juventude, apesar das dores que causa, é um grande equívoco. Isso impediria que a obra de Deus fosse completa. O que os líderes devem fazer, então? Acompanhar o processo com apoio e orientação espiritual é o mais importante. Os pais não podem ficar de fora. Os líderes não substituem os pais, que, na verdade, são os principais responsáveis. Um estilo de liderança que não considere isso pode causar maiores problemas para os jovens. Aproximá-los da família e não os afastá-los dela. Esse é o desafio. Os pais precisam ser concitados pela igreja a dedicar tempo e atenção aos filhos, seguindo-os de perto com amor em cada estágio da vida; intercedendo, corrigindo, orientando e apoiando. Tentar dispensar o jovem de suportar o jugo, jamais. Bom é suportar.

3. Condutas pessoais inafastáveis. O tempo do jardim de infância já passou. Ser líder não é ser babá. Líderes babás colocam maus costumes nos liderados e impedem que amadureçam. Em alguns casos, criam conflitos coletivos com a liderança da igreja, quando esta não os atende da maneira como previamente idealizaram no clube que compartilham com seus liderados. A segregação e a mentalidade de centro das atenções são facetas de estilos de liderança que não contribuem para que o adolescente e o jovem alcancem crescimento espiritual. O texto bíblico atribui uma responsabilidade pessoal ao jovem para que se conduza no processo de resistência do jugo. Enquanto nos tempos modernos se acredita que o caminho seja encher a agenda de adolescentes e jovens de atividades e mais atividades, a Palavra de Deus aponta para um sentido contrário: atividades são importantes, mas o jovem deve aprender a assentar-se solitário, ficar em silêncio e pôr a boca no pó. Que diferença da visão que predomina na sociedade atual, envolta pela modernidade líquida, descrita por Zygmunt Bauman! Uma sociedade que se guia pela cultura do entretenimento. É a civilização do espetáculo, no dizer de Vargas Llosa. Se até pensadores seculares há muito perceberam o quanto a frivolidade está corrompendo a vida humana, quanto mais nós, os cristãos, precisamos entender a gravidade do risco que corremos quando tentamos fugir de nossas responsabilidades pessoais, de nossa realidade existencial individual, mascarando a vida real com o frenesi da utópica vida moderna. É preciso valorizar a pedagogia do silêncio. Um pouco de introspecção não faz mal a ninguém. Pelo contrário: é da essência da vida humana.

4. Mudança de comportamento. O jovem cristão precisa ser conscientizado da necessidade de ter um estilo de vida diferente da geração atual. Não é viver alienado da realidade que o cerca, mas ter a consciência de que não é possível obter vitória espiritual sem dedicar-se aos meios de obtenção da graça que Deus providenciou para nós. Disciplina espiritual é fundamental. É uma questão de sobrevivência para alma (Salmos 42). Tirar um tempo para oração, leitura e meditação nas Escrituras – de preferência sem a interferência de qualquer engenho tecnológico – continua sendo a maneira mais eficaz de ser fortalecido no espírito, condição indispensável para vencer este mundo tão mal e hostil, onde atuam os agentes das trevas (1 João 5.19; Efésios 3.14-16; 6.10-18).

É preciso “assentar-se solitário e ficar em silêncio”. Desligar-se de todos os aparelhos eletrônicos, inclusive do smartphone. Deixar as redes sociais. Ficar offline. Refletir sobre si mesmo. Não com uma visão existencialista, restrito às próprias potencialidades do ser, mas, acima de tudo, voltado para o Criador (Eclesiastes 12.1), rogando que Ele nos sonde, veja se há em nós algum caminho mal e nos guie por um caminho eterno (Salmos 139). Andar pelos desejos do coração é caminhar para tragédia, pois nosso coração é enganoso e perverso (Jeremias 17.9). Pôr a boca no pó, em sinal de dependência e profunda rendição. “Talvez assim haja esperança”.

5. A bênção não tarda vir. Enquanto nos aflige com o jugo, provando nossa fé, Deus está produzindo em nós as virtudes da esperança e do amor, para que o fluir de Sua graça seja completo. Ele sempre tem um caminho mais excelente para nós (1 Coríntios 12.31; 13.13). “Porque o Senhor não rejeitará para sempre. Pois, ainda que entristeça a alguém, usará de compaixão segundo a grandeza das suas misericórdias. Porque não aflige nem entristece de bom grado os filhos dos homens” (Lamentações 3.31-33).

Há sempre uma esperança para os que esperam em Deus (Salmos 40). Que o Senhor continue usando líderes de adolescentes e jovens na difícil tarefa de mentorear pessoas tão valiosas para Deus, cheias de dons e talentos preciosos, mas que vivem ebulições e conflitos internos próprios da idade. Que a graça de Deus seja sobre cada um. Que tenhamos sabedoria para exercer uma liderança espiritual responsável e equilibrada, não nos deixando levar pelo ativismo religioso, mas vivendo e proporcionando momentos propícios para rendição e quebrantamento, com a boca no pó. Que os pais compreendam quão imprescindível é a missão que têm, como os primeiros e principais responsáveis por auxiliar seus filhos em uma fase tão fundamental da vida, levando-os a compreender e aceitar com humildade e resignação o jugo da mocidade, perfilhando o caminho correto para suportá-lo. No futuro, saberão que todo o processo valeu a pena (Salmos 119.71).

por Silas Queiroz

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