Preocupados com o bem-estar emocional e espiritual de seus liderados,
lÃderes de adolescentes e jovens vivem à s voltas com a demanda das muitas
atividades em suas igrejas. Geralmente dedicados e bem-intencionados, eles se esforçam
em busca de novidades que envolvam o grupo que lideram. Nesse processo,
contudo, correm o risco de se transformarem em meros promoters ou terapeutas.
Afinal, não são poucos os problemas que surgem e exigem atitudes e respostas do
lÃder diariamente. Como desenvolver um estilo de liderança que atenda à s reais
necessidades da juventude de nosso tempo?
Discernir as causas das inquietações é passo fundamental.
Ressalvados casos de transtornos que requerem psicólogos e psiquiatras, o que
fazer no âmbito eclesiástico para ajudar jovens e adolescentes a vencerem
crises comuns dessa etapa da vida? “Se conseguirmos envolvê-los com muitas
atividades, o tempo vai passar depressa e logo tudo estará resolvido. Vamos
estimular o desenvolvimento de seus talentos com artes, música, esportes e
muita cultura. Isso vai ajudá-los a vencer a solidão. Vamos dar vazão às suas imaginações,
toleremos as fraquezas, sejamos condescendentes com os fracassos. Essa fase vai
passar e, lá na frente, tudo se ajeita”. Será?
Embora o envolvimento de jovens e adolescentes com atividades
saudáveis contribua para a superação de dificuldades próprias de suas vivências
(isso não pode ser desprezado), a Palavra de Deus tem uma mensagem muito mais profunda
que essa visão humanista secular que costuma nos envolver. Há um processo
espiritual (pessoal e individual) a ser vivido no tempo da juventude, do qual
ninguém deve fugir. Essa realidade não pode ser ignorada. Não há um jeitinho de
livrar o jovem do jugo da mocidade.
Lamentações 3.27-29 diz: “Bom é para o homem suportar o jugo
na sua mocidade; assentar-se solitário e ficar em silêncio; porquanto Deus o
pôs sobre ele. Ponha a boca no pó; talvez assim haja esperança”. Nesse texto,
há um padrão inverso ao modelo de culto ao ativismo e à autonomia do ser, e ele
transmite lições espirituais fundamentais:
1. Deus pôs um jugo especÃfico sobre o jovem: Não se
trata de uma circunstância opcional, da qual se possa escapar esperta e
furtivamente. Há um jugo posto por Deus. E tudo o que Deus faz é bom. Mesmo o
que para nós parece ser mal, se vem de Deus é porque é necessário à vida. Servirá
para produzir bons frutos em nós e através de nós. Negar essa realidade,
fantasiá-la e rejeitá-la não nos fará bem (Jó 2.10; Salmos 18.30-35).
Precisamos ter o cuidado de não “psicologizar” o que é espiritual,
da mesma maneira que não podemos espiritualizar todas as reações humanas. O
jovem deve ser ensinado que há circunstâncias comuns da vida que podem levá-lo ao
abatimento, assim como existem questões espirituais que como tais devem ser
discernidas e enfrentadas. Nesse contexto estão os conflitos de sua própria
natureza pecaminosa com o padrão de vida ético, moral e espiritual que Deus
estabeleceu.
O jovem não pode dar vazão a seus desejos. Há um jugo divino
posto sobre ele. Deve conservar-se puro, obedecendo à Palavra de Deus (Salmos
119.9). A natureza carnal jamais aceitará isso sem impor fortes reações. De
toda sorte, o jugo está posto.
2. O único caminho para a bênção é suportar o jugo.
As Escrituras não apresentam outro caminho de vitória para o jovem, senão
suportar o jugo da mocidade (Lamentações 3.27). O verbo suportar aponta para a
necessidade de enfrentar, com resiliência e perseverança, as adversidades
tÃpicas da idade, os combates interiores, as tentações, as provações etc. O
jugo tem o seu peso e pode ferir os ombros. Ainda assim deve ser suportado.
Enquanto suporta o jugo, o moço e a moça vão vencendo suas irritações. O
orgulho vai sendo quebrado. O Senhor vai trabalhando em seu temperamento e
caráter. Aprendem a se submeter às autoridades, a serem humildes, a obedecer,
honrar e servir. Ganham disciplina e crescem em todas as áreas da vida com
extraordinários reflexos em seu futuro. O apóstolo João se dirigiu a um grupo
de jovens bem treinados nesse processo: fortes, cheios da Palavra de Deus e espiritualmente
vitoriosos (1 João 2.14).
Tentar tirar esse jugo dos ombros da juventude, apesar das
dores que causa, é um grande equÃvoco. Isso impediria que a obra de Deus fosse
completa. O que os lÃderes devem fazer, então? Acompanhar o processo com apoio
e orientação espiritual é o mais importante. Os pais não podem ficar de fora.
Os lÃderes não substituem os pais, que, na verdade, são os principais responsáveis.
Um estilo de liderança que não considere isso pode causar maiores problemas
para os jovens. Aproximá-los da famÃlia e não os afastá-los dela. Esse é o
desafio. Os pais precisam ser concitados pela igreja a dedicar tempo e atenção aos
filhos, seguindo-os de perto com amor em cada estágio da vida; intercedendo,
corrigindo, orientando e apoiando. Tentar dispensar o jovem de suportar o jugo,
jamais. Bom é suportar.
3. Condutas pessoais inafastáveis. O tempo do jardim
de infância já passou. Ser lÃder não é ser babá. LÃderes babás colocam maus costumes
nos liderados e impedem que amadureçam. Em alguns casos, criam conflitos
coletivos com a liderança da igreja, quando esta não os atende da maneira como
previamente idealizaram no clube que compartilham com seus liderados. A segregação
e a mentalidade de centro das atenções são facetas de estilos de liderança que
não contribuem para que o adolescente e o jovem alcancem crescimento
espiritual. O texto bÃblico atribui uma responsabilidade pessoal ao jovem para
que se conduza no processo de resistência do jugo. Enquanto nos tempos modernos
se acredita que o caminho seja encher a agenda de adolescentes e jovens de
atividades e mais atividades, a Palavra de Deus aponta para um sentido
contrário: atividades são importantes, mas o jovem deve aprender a assentar-se solitário,
ficar em silêncio e pôr a boca no pó. Que diferença da visão que predomina na
sociedade atual, envolta pela modernidade lÃquida, descrita por Zygmunt Bauman!
Uma sociedade que se guia pela cultura do entretenimento. É a civilização do
espetáculo, no dizer de Vargas Llosa. Se até pensadores seculares há muito
perceberam o quanto a frivolidade está corrompendo a vida humana, quanto mais
nós, os cristãos, precisamos entender a gravidade do risco que corremos quando
tentamos fugir de nossas responsabilidades pessoais, de nossa realidade
existencial individual, mascarando a vida real com o frenesi da utópica vida
moderna. É preciso valorizar a pedagogia do silêncio. Um pouco de introspecção
não faz mal a ninguém. Pelo contrário: é da essência da vida humana.
4. Mudança de comportamento. O jovem cristão precisa
ser conscientizado da necessidade de ter um estilo de vida diferente da geração
atual. Não é viver alienado da realidade que o cerca, mas ter a consciência de
que não é possÃvel obter vitória espiritual sem dedicar-se aos meios de
obtenção da graça que Deus providenciou para nós. Disciplina espiritual é fundamental.
É uma questão de sobrevivência para alma (Salmos 42). Tirar um tempo para
oração, leitura e meditação nas Escrituras – de preferência sem a interferência
de qualquer engenho tecnológico – continua sendo a maneira mais eficaz de ser
fortalecido no espÃrito, condição indispensável para vencer este mundo tão mal
e hostil, onde atuam os agentes das trevas (1 João 5.19; Efésios 3.14-16;
6.10-18).
É preciso “assentar-se solitário e ficar em silêncio”.
Desligar-se de todos os aparelhos eletrônicos, inclusive do smartphone. Deixar
as redes sociais. Ficar offline. Refletir sobre si mesmo. Não com uma visão
existencialista, restrito às próprias potencialidades do ser, mas, acima de
tudo, voltado para o Criador (Eclesiastes 12.1), rogando que Ele nos sonde,
veja se há em nós algum caminho mal e nos guie por um caminho eterno (Salmos
139). Andar pelos desejos do coração é caminhar para tragédia, pois nosso coração
é enganoso e perverso (Jeremias 17.9). Pôr a boca no pó, em sinal de dependência
e profunda rendição. “Talvez assim haja esperança”.
5. A bênção não tarda vir. Enquanto nos aflige com o
jugo, provando nossa fé, Deus está produzindo em nós as virtudes da esperança e
do amor, para que o fluir de Sua graça seja completo. Ele sempre tem um caminho
mais excelente para nós (1 CorÃntios 12.31; 13.13). “Porque o Senhor não
rejeitará para sempre. Pois, ainda que entristeça a alguém, usará de compaixão
segundo a grandeza das suas misericórdias. Porque não aflige nem entristece de
bom grado os filhos dos homens” (Lamentações 3.31-33).
Há sempre uma esperança para os que esperam em Deus (Salmos
40). Que o Senhor continue usando lÃderes de adolescentes e jovens na difÃcil
tarefa de mentorear pessoas tão valiosas para Deus, cheias de dons e talentos preciosos,
mas que vivem ebulições e conflitos internos próprios da idade. Que a graça de
Deus seja sobre cada um. Que tenhamos sabedoria para exercer uma liderança
espiritual responsável e equilibrada, não nos deixando levar pelo ativismo
religioso, mas vivendo e proporcionando momentos propÃcios para rendição e
quebrantamento, com a boca no pó. Que os pais compreendam quão imprescindÃvel é
a missão que têm, como os primeiros e principais responsáveis por auxiliar seus
filhos em uma fase tão fundamental da vida, levando-os a compreender e aceitar
com humildade e resignação o jugo da mocidade, perfilhando o caminho correto
para suportá-lo. No futuro, saberão que todo o processo valeu a pena (Salmos
119.71).
por Silas Queiroz
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