A Eleição de/em/por Cristo

A Eleição de/em/por Cristo


Antes da eleição da Igreja, houve a eleição de Cristo, sem a qual não há aquela; a eleição só se torna possível por meio da obra de Cristo, e ela se dá em Cristo; a Doutrina Bíblica da Redenção sublinha ainda mais o fato de que a Eleição da Igreja se dá nEle

A Doutrina da Salvação elabora-se na tradição cristã através de uma teia complexa de conceitos que mutuamente implicam-se. Temas como Propiciação, Santificação, Glorificação, Regeneração, Conversão etc., são todos temas conexos que de uma forma bem evidente, e em alguns casos de maneira mais difícil de compreender, estão interligadas.

A Eleição e a Redenção, por sua vez, são duas doutrinas relacionadas na Soteriologia e que estão intimamente ligadas em virtude da ênfase na pessoalidade em ambos os casos. Os aspectos da Doutrina da Salvação podem concentrar-se mais no debate sobre os impactos advindos da graça de Deus sobre o pecado, relacionar-se à questão da vitória sobre o maligno ou ainda refletir sobre as consequências cósmicas – isto é, relativas ao impacto na natureza do nosso sistema planetário e no universo como um todo. Eleição e Redenção, no entanto, são conceitos que se associam às consequências da salvação na vida individual de cada pessoa.

Desta forma, mesmo sendo a questão da Eleição o tema mobilizador deste artigo, este autor entende como imprescindível esclarecer, ainda que introdutoriamente, o conceito de Redenção.

A redenção no Antigo Testamento: uma obra que enfatiza a libertação pessoal

Em categorias bíblico-teológicas, o conceito de “Redenção” é polissêmico, sendo sempre necessário considerar o contexto de seu uso para que não se corra o risco de anacronismos, do uso literal de metáforas ou ainda de uma apropriação indevida do termo. Além disso, as palavras derivadas desta – ou seja, de uma mesma raiz etimológica – também exercem um relevante impacto no desenvolvimento da lógica teológica interna do pensamento bíblico. Um exemplo clássico é o termo hebraico Go’el (Resgatador/Redentor/Vingador), que originalmente tem uma forte conexão com assuntos jurídico-civis.

No Levítico 25.25,26 o “redentor” é apresentado como uma espécie de protetor familiar, isto é, uma figura instituída legalmente por aquele sistema social cuja responsabilidade primordial seria garantir que não existissem abusos contra membros mais vulneráveis das famílias hebreias. Diante da falência econômica de uma determinada família, cabia ao “redentor” evitar que os bens e as pessoas fossem objetivadas de modo mercantil.

Já em Números 5.6-8, o “resgatador” é o representante legal daquele que sofreu algum determinado tipo de violência – física, moral, patrimonial – e que terá o direito de receber a restituição paga pelo violentador/pecador no caso da morte da vítima. A legislação do povo judeu trata ainda da hipótese de não existir ninguém que se apresente como “resgatador” da vítima; neste caso, o ressarcimento deveria ser feito ao sacerdote, o qual permaneceria como digno representante da falecida vítima.

Um terceiro aspecto relativo à figura do go’el no Antigo Testmaneo está associado à questão da aplicação material da justiça. Essa acepção do conceito é discutida em textos como Números 35.12-27 e Deuteronômio 19.6,12, e define as responsabilidades do “vingador”, isto é, a função jurídico-penal do indivíduo imbuído da tarefa de “vingar” a honra/vida de uma determinada vítima. A justiça estaria estabelecida se, e somente se, o vingador agisse em favor do indivíduo vitimado.

Por estes três exemplos fundantes da atividade do “resgatador”, podemos já ter uma ideia inicial de que a “redenção” – como ato jurídico-social na comunidade judaica antiga – tem aspectos importantíssimos, mas bem diferentes entre si. Algo que se poderia identificar como uma postura ativa e outra passiva; contudo, o que chama a atenção é a forte relação existente entre os conceitos de “redenção” e justiça. Assim, seria correto afirmar que a redenção, no Antigo Testamento, aponta para um esforço divino no que diz respeito ao estabelecimento de uma sociedade mais justa para todos.

A aplicação do conceito de redenção do Antigo Testamento em associação com a Obra de Cristo no Novo Testamento

O Novo Testamento apropria-se desse conceito – redenção – já atravessado por múltiplas camadas discursivas e muito mais relacionadas a uma questão teológico-espiritual do que legal-condenatório. A compreensão dessa diversificação semântica do conceito de “redenção” será muito importante para o entendimento que este terá ao ser relacionado com o Cristo e a sua obra salvífica. Assim, podemos encontrar nos textos do Novo Testamento o uso das imagens do “redentor”, “resgatador” e “vingador”, tão comuns ao contexto social judaico – e sempre absolutamente relacionadas a indivíduos da própria comunidade –, associadas agora à própria divindade.

Em grego, o termo bíblico majoritário para definir a Redenção é πολύτρωσις.(1) Na Septuaginta, o vocábulo é utilizado em Êxodo 21.8 para designar a multa reparatória que o marido que repudiasse a esposa deveria pagar. Naquele contexto histórico, este também era um termo corriqueiro no dia a dia daquela sociedade escravocrata, pois πολύτρωσις era uma expressão técnica utilizada para designar parte do processo de negociação para aquisição de um escravo.

Dessa forma, πολύτρωσις tem uma forte associação com um aspecto comercial, com a ideia de “pagar um preço”; ou seja, o conceito de redenção tem uma conexão indissociável com a imagem de alguém com condições – políticas, sociais ou financeiras – agindo em favor de um outro – vulnerável, depontencializado, fragilizado.(2) Além de “assumir a dívida” do outro, πολύτρωσις também pode significar “garantir a liberdade a outro”. É evidente que esses dois sentidos gerais do termo estão intrinsecamente conectados, não sendo possível um sem o outro.

Em uma das perícopes mais profundas da literatura paulina, o apóstolo dos gentios explora de maneira magistral a metáfora entre escravidão-pecado e redenção (alegoricamente como ato de comprar um escravo e teologicamente como a graciosa ação de prover a salvação aos perdidos). Em Romanos 7.7-25, Paulo define-se como um miserável pecador “vendido debaixo do pecado” (v.14). A escravidão a qual ele está submetido é a do pecado – amplamente apontada pelo modus operandi da Lei. O reconhecimento da manifestação da graça, por outro lado, é o que dota de sentido à vida e enche cada filho de Deus de esperança com relação ao amanhã.

Ao lidarmos, então, com o conceito de redenção precisamos levar em consideração todos estes aspectos – diacrônicos e síncronos –, além de toda riqueza literário-narrativa do texto bíblico. Assim, poderemos ter pelo menos um vislumbre da riqueza argumentativa daquilo que os escritores neotestamentários pretendiam transmitir aos seus leitores através da adoção de um vocabulário tão específico.

No Novo Testamento, “Redenção” tanto pode ser entendido como a obra que Cristo realiza (Romanos 3.24), como o próprio fim, isto é, a finalidade em si do ministério jesuânico (Efésios 4.30). Por isso, podemos falar sobre o “Dia da Redenção” como a culminância da carreira cristã. Paulo, escrevendo aos Coríntios, chega a afirmar que, dentre outras virtudes que podem definir o que Jesus é para nós, Ele pode muito bem ser entendido como a perfeita síntese da redenção.

A redenção da humanidade – como necessidade reconciliatória derivada do colapso edênico – sempre esteve diretamente associada com Jesus. Tal conexão deve ser entendida em dois aspectos fundamentais: tanto com relação ao protagonismo de Jesus em assumir voluntariamente tal tarefa como quanto à natureza necessária e suficiente do sacrifício redentor do Salvador.

Dito de outra forma: Jesus, como o Cordeiro de Deus redentor de nossas vidas, nunca foi uma opção, mas sempre foi o plano amoroso da Trindade. Ele assumiu nosso lugar para nos resgatar do ciclo infernal do pecado (Gálatas 3.13). A voluntariedade de todos os atos de Jesus é um fato inconteste no Novo Testamento (João 10.17; 15.13; 1 João 3.16), e isso não seria diferente com relação à questão da Redenção (Tito 2.14). Apenas a obra redentora do Cristo poderia estabelecer um ponto final na tragédia da escravidão pecaminosa de todos os filhos de Adão. Deve-se lembrar que, ainda no contexto da narrativa que aborda os acontecimentos do Éden, foi anunciada a promessa redentora (Gênesis 3.15).

A Redenção – como grande doutrina da salvação que se apropria de uma imagem comercial-escravocrata – pode ser melhor compreendida quando ampliamos os elementos da metáfora e os aplicamos a outros aspectos da obra salvadora: a universalidade do pecado escravizava todos debaixo da mesma condição miserável (João 8.34; Romanos 6.20), mas ele comprou-nos de todos os povos, línguas e nações (Apocalipse 5.9); a redenção oferecida pelo Cristo é de grande valor (1 Coríntios 6.20) e por isso não deve ser em hipótese alguma menosprezada (1 Coríntios 7.3); o ato redentor concede-nos o privilégio de sermos “propriedade exclusiva” do bom Deus (1 Pedro 2.9), e foi pelo ato da cruz do Calvário que o “registro acusatório” do maligno foi desabilitado e ganhamos liberdade em Cristo (Colossenses 2.13-15). Pode-se perceber que, em vários momentos do Novo Testamento, a correlação imagética entre redenção e libertação da escravidão é muito exuberante.

Para fundamentar ambos os corolários da Doutrina da Redenção supracitados, pode-se apresentar a afirmação petrina em 1 Pedro 1.19,20, onde o apóstolo afirma que, por sua presciência – desde antes da fundação do mundo, o mistério oculto desde o princípio nas palavras de Paulo (Efésios 3.9,10) – o Filho já estava decidido a oferecer, como preço de redenção, o sacrifício de seu sangue inocente. Aquilo que se apresentava prefigurado no Antigo Testamento como um anúncio da redenção – através dos sacrifícios cerimoniais de animais – torna-se real por meio do evento do Calvário. Na linguagem apocalíptica joanina, o sacrifício do cordeiro já era um propósito eterno existente (Apocalipse 13.8).

Mas, o texto de Pedro não se limita a registrar o sempiterno comprometimento de Jesus com nossa redenção. Ele também o apresenta como necessário e suficiente. Nada, além do sangue de Cristo, poderia evitar que fôssemos condenados a uma eternidade infernal; e uma vez realizado o sacrifício, não existe nada mais que opere providencialmente em nosso favor. Na expressão do escritor aos Hebreus, o amor de Jesus libertou-nos da escravidão do pecado para nos oferecer uma eterna redenção (Hebreus 9.12). Aquilo que os sacerdotes humanos apenas prefiguraram – como sombras e imagens – tornou-se completamente real pelo grande amor do Cristo.

Jesus e a sua insuperável implicação na obra da redenção

Tomando como referência o grande contexto da querela entre Graça versus Lei na Epístola aos Gálatas, Paulo apropria-se do conceito de redenção para proclamar que a morte de Jesus de Nazaré não apenas comprou-nos a liberdade como também transformou nosso status existencial, pois deixamos de ser apenas filhos de Adão para tornarmo-nos Filhos de Deus por adoção (Gálatas 4.4).

A redenção é o elemento mais pessoal da obra da salvação, tem a ver diretamente com o pecador e sua condição existencial. Graças a Cristo, somos apresentados a um novo modo de compreender a trajetória pessoal de vida, não mais controlada pelos impulsos animalescos ou pelo apetite pecaminoso decadente. Nossa nova vida, concedida pela liberdade em Cristo (2 Coríntios 5.17), leva-nos para uma experiência de espiritualidade centrada no fruto do Espírito, nos dons e vocações da graça.

A Doutrina da Eleição nas Escrituras

A palavra grega para definir o verbo escolher é ἐκλέγομαι, já o substantivo “eleição” – uma variante do verbo – é ἐκλογ. Ambos os vocábulos estão associados a um conceito de “livre escolha”, isto é, de uma decisão tomada previamente na direção de seleção de alguém ou algo.

Chama a atenção o fato de o verbo ἐκλέγομαι ser um vocábulo frequente na literatura lucana, uma vez que, das 25 vezes que o verbo aparece no Novo Testamento, em 15 delas o verbo e suas variantes registram-se em Lucas ou em Atos. Esses termos são utilizados para descrever o ato de seleção dos apóstolos por Cristo (Lucas 6.13), como também a escolha de uma equipe de apoio para auxiliar Barnabé e Paulo na missão evangelizadora que eles estavam empreendendo (Atos 15.22,25). A escolha a que designam essas palavras não diz respeito apenas a pessoas, mas também a objetos e lugares (Lucas 14.7).

Em Lucas 9.35, no Monte da Transfiguração, a voz que brada das nuvens anuncia aos atônitos discípulos do Mestre que ele é “O Escolhido” ( ἐκλελεγμνος), ou seja, aquele que foi eleito desde a eternidade para cumprir a missão salvífica em favor da humanidade. Como afirma-nos Paulo em Efésios 1.4, não apenas Cristo é o eleito para realização da salvação, como nós, os santos, estamos desde a fundação do mundo eleitos nEle. Essa condição dos santos apontado pelo apóstolo em Efésios pode muito bem ser associada à referência da afirmação escatológica do Cristo em Marcos 13.20, que aponta a abreviação de tempos caóticos em virtude do amor do Eterno aos “escolhidos”. Por fim, em Tiago 2.5, a escolha sábia do Criador faz com que aqueles que enfrentam adversidades materiais na terra sejam fortalecidos no coração, de modo a permanecerem firmes na fé, mesmo diante das mais adversas crises.

Também é comum na literatura do Novo Testamento o uso do epíteto “eleito” (εκλεκτος) e seus variantes para designar a universalidade daqueles que experimentam as bênçãos oriundas da salvação, ou seja, os membros de uma comunidade. Textos como 2 João 1.13 e 2 Timóteo 2.10 expressam bem essa ideia de a coletividade dos santos serem denominados de “eleitos”. Já em outros textos, a designação “eleito” parece revestir-se de um significado espiritual bem mais específico, denotando o conjunto daqueles que foram chamados por Deus para seu Reino eterno (Apocalipse 17.14; 1 Timóteo 5.21; Romanos 8.33).

Diante desse amplo uso dos termos ἐκλέγομαι, ἐκλογ e εκλεκτος no Novo Testamento, faz-se necessário distinguir, em termos teológicos, o significado daquilo que denominamos de “Eleição para a Salvação” em contrapartida àquilo que prosaicamente encontra-se nas páginas do Novo Testamento como sinônimo de uma mera seleção de pessoas, objetos, lugares.

Encontramos nas Escrituras eleições pessoais, familiares, étnicas e coletivas. Personagens como Abraão, Davi, Eliseu, Paulo etc., são pessoas cujas vidas são confrontadas pelo chamado divino para viverem de modo bem específico e, na maioria das vezes, de forma completamente diferente daquilo que o movimento ordinário da vida os levaria a experimentar. Já a casa de Abraão, a família de Jacó, os filhos de Arão, a descendência de Davi, são escolhidos por Deus para cumprirem tarefas que são impossíveis a um homem só – pois são grandes e longas demais. Por sua vez, o povo de Israel é uma coletividade étnica que foi eleita por Deus para manifestar às nações Sua glória e poder, a qual não está limitada a um lugar ou a um ato, mas é dinâmica, assim como o é o desenvolvimento histórico de um povo. Por fim, mas não menos importante, a Igreja como corpo espiritual do Cristo, como comunidade mística do Redentor, constitui-se como a própria prefiguração da eleição – pois assim são denominados seus partícipes, os eleitos.

Algumas verdades precisam ser compreendidas a partir desses vários tipos de eleição existentes. A eleição coletiva jamais será afetada por atitudes individuais ou de partes específicas da coletividade. Demonstra-se isso através da condição histórica do povo de Israel, o qual, mesmo diante de inúmeros fracassos geracionais, anos de afastamento do plano divino, ainda permanece digno das promessas divinas (Isaías 41.8). Outra verdade a ser confirmada é que a fidelidade de Deus à Sua palavra e os dons por Ele ofertados são sem arrependimento (Romanos 11.29; 2 Timóteo 2.12,13); os filhos de Adão, todavia, são volúveis, mutáveis, herdeiros da fragilidade de seus pais.

Façamos, então, alguns esclarecimentos conceituais que nos ajudarão de modo importante para a compreensão plena daquilo que é a Doutrina da Eleição: só pode realizar uma escolha/eleição aquele que tem conhecimento prévio das opções a serem selecionadas. Uma escolha/eleição que esteja limitada quanto ao acesso às informações sobre aquilo/aqueles que será/serão escolhidos não passará de mera arbitrariedade, para não definir também como efetivação do caos e da aleatoriedade. Com relação à questão da salvação, deve-se ter em mente que o Eterno é completamente habilitado para exercer a eleição, uma vez que seu conhecimento é ilimitado quanto à amplitude, e exaustivo com relação a tudo que existe. Em face de sua onisciência e de sua presciência, o Altíssimo pode julgar todas as coisas de modo reto e verdadeiro, conduzindo, assim, no campo da salvação, a eleição graciosa de todos os salvos.

Aqui cabe-nos uma nota de esclarecimento imprescindível: a obra da salvação foi de proporções universais e o desejo de Deus é a salvação de todos (1 Timóteo 2.4; Tito 2.11); desse modo, a eleição nunca foi um ato de exclusão arbitrária de alguns em detrimento de outros, mas, ao contrário, sempre foi uma ação de inclusão da humanidade perdida no plano eterno da salvação. Tal afirmação torna-se ainda mais evidente quando levamos em consideração afirmações como as que Paulo faz um 2 Tessalonicenses 2.13.

Por sua presciência, Deus elegeu em Cristo (que é bem diferente da hipótese daquilo que alguns definem como “decreto eletivo”, que se constitui muito mais como um instrumento perverso e arbitrário) a unanimidade daqueles que seriam feitos um povo dedicado a Ele, a fim de obedecerem a Jesus Cristo e ficarem purificados pelo seu sangue, para finalmente viverem eternamente em glória no céu. É isto que nos afirma Pedro, de modo inconteste, logo no início de sua primeira epístola (1 Pedro 1.2).

Destaque-se ainda que a vocação para eleição é uma determinação divina, nunca uma arrogante prerrogativa humana; ela tem uma condicionalidade estabelecida por Ele, por isso aqueles que creem e aguardam o cumprimento da obra da eleição em suas vidas devem trabalhar diuturnamente para viverem como dignos da vocação que receberam do Senhor (2 Pedro 1.10). A comunicação da eleição ao coração do salvo – obra realizada pela comunicação do Espírito Santo com nossas interioridades (João 15.16) – jamais desenvolverá um senso de soberba e falsa segurança, mas antes nos guiará em humildade e persistência na luta cotidiana contra o Diabo e suas artimanhas. Se para Deus a eleição é um fato, em nossa perspectiva humana ela sempre deve ser compreendida como um processo que teve seu início na eternidade pré-cósmica e concluir-se-á na eternidade escatológica que já se aproxima.

O papel de Cristo no amplo processo da salvação – e mais especificamente na Doutrina da Eleição – relaciona-se diretamente ao ato sacrifical do Calvário. É por meio da morte substitutiva e redentiva de Jesus de Nazaré que a eleição dos santos – projeto oriundo da graça manifesta desde a eternidade – tornou-se concreta (2 Timóteo 1.9).

A Eleição é produto da graça (Romanos 11.5), a qual opera eficientemente em favor dos filhos de Deus, daqueles que vieram a Cristo sinceramente, para garantir-nos o acesso ao Reino eterno de Deus. Nossa eleição não é fruto de um protocolo religioso rígido – determinado por algum tipo de coisa que fazemos (Colossenses 2.20-23) –, mas do amor do Eterno que extravasa a lógica humana, objetivando elevar-nos a um outro padrão de vida.

Da perspectiva de Deus, a eleição é um ato incondicionado promovido exclusivamente pela onibenevolência do Criador que opera potencializado pelo amor (1 Tessalonicenses 1.4). Já no que diz respeito ao usufruto humano, a eleição é condicional – tudo está atrelado à continuidade do relacionamento dos cristãos com o Salvador. A eleição se dá nEle. Um texto-chave para fundamentar essa condicionalidade é Efésios 3.11. No versículo em análise, fica evidente que é por meio do Cristo que alcançamos tudo o que diz respeito à obra da salvação, e sem Ele nada o que diz respeito ao Reino eterno pode acontecer.

Notas

(1) Um termo correlato a πολύτρωσις e que também tem uma profunda relação com as práticas comerciais do mundo antigo é λτρον, que designava o valor a ser pago por um escravo, o preço do resgate a ser pago pela liberdade de alguém. Esse é o termo que Mateus utiliza para falar sobre o preço de resgate pago pelo Salvador (Mateus 20.28).

(2) É importante ressaltar que a tradição pagã, de um modo geral, faz raríssimo uso do termo πολύτρωσις, sendo este difundido prioritariamente pelos textos bíblicos e seus comentadores.

por Thiago Brazil

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