Existe alguma contradição com a doutrina do livre arbítrio quando vemos o conteúdo de João 6.44 e 17.9?

Existe alguma contradição com a doutrina do livre arbítrio quando vemos o conteúdo de João 6.44 e 17.9?

Afinal, a salvação também depende da vontade pessoal ou Deus a desconsidera e impera a Sua vontade na vida humana?

A resposta de Jesus aos murmuradores galileus, citada em João 6.44, precisa ser contrastada dentro do contexto da resposta de Jesus um pouco antes, em João 6.40, onde Jesus está fazendo o contraponto: “Porquanto a vontade daquele que me enviou é esta: Que todo aquele que vê o Filho, e crê nele, tenha a vida eterna; e eu o ressuscitarei no último dia”. Percebe-se que é preciso ver e crer em Jesus para receber a vida eterna e nem todos querem receber a revelação e exercer a fé (resposta humana) para receber a salvação. A segunda questão nesta mesma perícope é o contexto da murmuração dos galileus. Se eles murmuravam contra Jesus (sendo essa uma escolha deles), logo, o Pai não iria trazê-los para o Filho, não porque Ele não quisesse, mas porque eles O rejeitavam no ato da murmuração, sendo isso juízo contra eles.

No texto de João 17.9, ao Jesus se expressar quanto a “aqueles que me deste”, Ele está se referindo especificamente aos apóstolos, pois foram escolhidos para uma missão especial da parte de Deus. Mas aqui também é necessário ver o contexto, pois, um pouco adiante (João 17.20), ainda dentro do mesmo texto, Jesus diz: “E não rogo somente por estes, mas também por aqueles que pela tua palavra hão de crer em mim”. Percebe-se novamente a decisão humana e o livre arbítrio em ação na frase “hão de crer em mim”. Desse modo, novamente não há contradições, apenas é necessário entender o contexto geral.

A aparente ambiguidade dos dois textos em apreço revela o que na soteriologia arminiana chama-se sinergismo: a cooperação divino-humana para a salvação, na qual Deus atua de forma unilateral (monergismo) concedendo a sua graça preveniente, esta gera a capacidade de arrepender-se e ter fé para ser salvo e, por conseguinte, faz surgir o desejar real da salvação no ser humano que, com a ajuda convencedora do Espírito Santo, pode aceitar ou rejeitar a salvação (sinergismo). É a graça que inicia a salvação, promovendo-a, aperfeiçoando-a e consumando-a, pois é ela que ordena e inspira a vontade e as intenções. Vários textos bíblicos apontam para o fato de que o ser humano é livre para escolher (João 3.16; 6.37; Romanos 1.16, 5.18, 10.13; 1 Coríntios 1.21; Gálatas 5.13; etc.).

O calvinismo tem sérios problemas quanto ao amor de Deus pelos Seus filhos. Embora eles afirmem essa verdade bíblica, a negam na doutrina da predestinação como é vista pelo calvinismo, pois Deus não cria alguns para a perdição eterna; isso seria um ato contrário à Sua misericórdia e à Sua justiça demonstrada em Cristo, além de desonrar o sacrifício de Cristo, oferecido a toda humanidade (João 3.16). Ora, se a salvação de alguns já tinha sido preordenada, sem a interferência da vontade humana, Cristo teria morrido em vão, pois quem fosse predestinado se salvaria do mesmo jeito. Deus, de antemão, decidiu que o ser humano deve acreditar em Jesus Cristo para a Sua salvação. Assim, tanto a soberania de Deus quanto a participação humana são contempladas. Cabe ao sujeito consentir com a determinação divina (livre-arbítrio).

Referências:

ARMÍNIO, Jacó. As Obras de Armínio. Vol. 1 e 2. Rio de Janeiro: CPAD, 2015a e b.

POMMERENING, Claiton Ivan. A Obra da Salvação. Rio de Janeiro: CPAD, 2017.

Por Claiton Ivan Pommerening.

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