Rota 90 e outros caminhos onde o Senhor nos encontra

Rota 90 e outros caminhos onde o Senhor nos encontra

Ainda estamos bem ao sul, na longa estrada que nos levara de Eilat a Tiberiades. Cai a noite,  são 17h29, quando começo a escrever neste início de Shabat. O merecido repouso espera o  grupo que viaja desde cedo, tendo partido às 3 horas do Cairo. A dura travessia do deserto,  contudo, não apagou a alegria dos irmãos que viajam à terra santa.

Presente em todo tempo esteve a lembrança da peregrinação dos filhos de Israel. Desde a  passagem pelo aeroporto grego, cujas placas de saída lembravam-nos o nome que à  Septuaginta propôs ao segundo livro da Bíblia, todos nos sentimos próximos da experiência de  Moisés, nos caminhos que ele percorreu nestas terras bíblicas. Aliás, caminhos podem guardar  experiências  surpreendentes. Nesta via de mão dupla, tanto no tempo quanto no espaço, a  saída do povo hebreu leva-nos a pensar nas circunstâncias que levaram ao período em que  esteve estabelecido e depois escravizado no Egito.

No capitulo 37 de Gênesis, lemos sobre a ordem dada a José por seu pai Jacó. Ele é enviado  aos irmãos, a Siquém, onde o grupo pastoreava ovelhas. Jacó pretendia obter notícias de seus  filhos, ausentes devido à distancia imposta pela busca de boas pastagens. José, contudo, não  os encontra no local esperado, encontra outro personagem, cujo nome e procedência não  conhecemos, conforme discorre o texto: “E achou-o um varão, porque ele andava errante pelo  campo, e perguntou-lhe o varão, dizendo: Que procuras? E ele disse: Procuro meus irmãos;  dize-me, peço-te, onde eles apascentam. E disse aquele varão: Foram-se daqui; porque ouvi- lhes dizer: Vamos a Dota. José, pois, seguiu seus irmãos e achou-os em Dota", Gênesis 37.15- 17.

Desconhecemos as razões que levaram o grupo a mudar de direção, porém imaginamos que  questões relativas ao pasto, ou até mesmo à segurança, tenham determinado o procedimento.  Provavelmente boas pastagens foram encontradas mais além. José, talvez frustrado pelo  desencontro, errava pelos campos ate a chegada de um varão. Este personagem fundamental à narrativa orienta o filho de Raquel quanto ao caminho que deve seguir. Não fora o encontro,  quem sabe o jovem tivesse retornado ao seu pai e escapado livre das armadilhas de seus  irmãos? Lançado numa cova, vendido aos mercadores amalequitas, escravizado no Egito,  acusado na casa de Potifar, José pode ter lamentado o dia de seu encontro com o homem no  campo. Mais adiante, porém, conduzido ao segundo posto em autoridade na terra de Faraó,  tornado administrador dos celeiros do mundo em que vivia, dotado de poder para entregar ou  reter aos povos o alimento que faria diferença entre a sobrevivência e a morte, talvez tenha  lembrado, dessa vez com alegria, aquela estranha situação em Dota.

Enquanto revisamos aspectos importantes para a historia de Israel, nesta viagem com outros  dedicados estudantes das Escrituras, mais uma vez fica claro o domínio de Deus sobre os  acontecimentos, conduzindo Seu povo à Sua perfeita vontade. Ainda que por vezes possamos  esquecer, Ele nos esta tomando pelas mãos, guiando-nos pelo caminho e, tantas outras vezes,  criando caminhos para que passemos por eles. Um encontro nos campos pode alterar uma  vida. Os projetos humanos caem por terra quando o Varão nos percebe errantes, isentos de  rumo, precisando ser orientados ao caminho que nos levará ao propósito do Senhor para as  nossas vidas.

Faz parte da literatura e do folclore antissemita a lenda do judeu errante, condenado a vagar até o fim dos tempos por haver rido, sem compaixão, do Homem que seria crucificado. Uma voz  vinda do céu teria, naquela ocasião, proferido a sentença e a pena de seu vagar perpétuo. À  literatura sobre o tema expandiu-se e, no Brasil do século XIX, uma peça teatral de Eugenne  Sue com o personagem Ahasverus, o judeu errante, fez fama nas salas de espetáculo do Rio de  Janeiro. Machado de Assis, escritor brasileiro, narrou em um de seus mais profundos  contos, “Viver””, o drama do fastio na caminhada infrutífera de Ahasverus. O conto faz parte da  coletânea “Várias Histórias” e reflete a dor de alguém que anda sem rumo, destituído de  propósito, e reconhece ser essa uma das maiores aflições que o homem possa enfrentar.

Andar em direção aos irmãos, inda que isso nos traga sofrimento, ou vagar pelo campo? Qual a melhor escolha? Retornar ao pai com o relato dos desencontros seria porventura viável?  Certamente que não. Quando assisto, nestes dias, os noticiários repletos das discussões frutos  das mais variadas opiniões entre aqueles que formam o governo de Israel, na dura tarefa de  chegar a um pensamento que permita tomar atitudes adequadas para a manutenção de um país ainda tão novo e que enfrenta tremendos desafios, penso em quão bela, mas quão árdua, é a  tarefa de formar uma nação a partir de grupos de pessoas com tão diferentes origens. Conciliar os interesses religiosos, as diferenças culturais, os conceitos e valores, tendo ainda de  enfrentar a guerra das armas e a guerra da mídia não é tarefa suave; contudo, faz-se necessária para que se cumpram os projetos de Deus.

Para conduzir-nos em direção aos irmãos, visto que não nos é permitido retornar ao Pai sem  que cumpramos a tarefa a nós confiada, vem ao nosso encontro o Varão que não nos permitirá  errar pelos campos, da mesma forma que não é errante a nação de Israel e não é errante o  povo judeu. Pelo contrário, seguimos em direção à terra onde o Senhor já tem provido a  salvação.

Por, Sara Alice Cavalcante.

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