“Em Êxodo 2.24, lemos que Deus ‘lembrou-se’ da sua aliança. Logo, Deus se esquece?”
É muito comum ouvirmos crentes, em momentos de lutas e adversidades, comentarem: “Deus se esqueceu de mim, por isso estou nesta prova”. É falta de fundamentação bíblico-teológica que leva crentes a afirmarem isso. O evangelho segundo a conveniência, à moda da teologia da prosperidade, e o descaso com o estudo da Palavra de Deus têm produzido enfermidades espirituais no povo cristão.
O texto bíblico, referência para este artigo, retrata um momento
que Israel estava passando no Egito, com a morte de José e o surgimento de um
novo rei que não o conhecia (Êxodo 1.8). A subida desse novo rei ao trono desencadeou
um processo de perseguição a ponto de o povo clamar a Deus por misericórdia. Dentro
desse contexto, entra o versículo chave “lembrou-se Deus da sua aliança com
Abraão, com Isaque, e com Jacó”. A partir daí, surge o questionamento: “Será que
Deus esquece as coisas?”.
Na verdade, o que há nesse e em outros textos é antropomorfismos
e antropopatismos.
Antropomorfismo é um termo que vem das palavras gregas
“anthropos” (homem) e “morphe” (forma). Portanto, um antropomorfismo, no que diz
respeito a Deus, é quando Deus aparece ou se manifesta para nós em forma humana
ou mesmo em características humanas atribuídas a Ele mesmo. Vemos isso por toda
a Bíblia. Apesar de tudo, não podemos ascender onde Deus está, mas Ele pode descender
até onde estamos.
Já os termos antropopatismo ou antropopatia são provenientes
de duas palavras gregas: “anthropos” (homem) e “pathos” (afeto ou paixão).
Antropopatismo é atribuir a Deus sentimentos e paixões humanas. Exemplo: Deus se
arrependeu, Deus se lembrou. Ora, como a própria Bíblia diz, Deus não é homem para
se arrepender e se esquecer. Quanto à forma humana, Deus é Espírito, e pode usar
a forma humana apenas para aproximar o homem do Seu entendimento.
Outrossim, para compreendermos melhor o processo da lembrança
de Deus no versículo referenciado, é interessante resgatarmos um dos atributos de
Deus que é a onisciência, palavra esta que vem do latim “ominis” (toda) e
“scire” (saber). Isto é, onisciência é a qualidade da natureza de Deus que dá a
Ele a condição de saber todas as coisas possíveis, todas as coisas reais, conhecer
todos os eventos, todas as criaturas, no quer tange ao passado, ao presente e ao
futuro. A Bíblia diz que Deus conhece perfeitamente todos os pormenores da vida
dos seres que há no Céu, na Terra e no Inferno.
Na língua hebraica, o verbo lembrar é “zakar” (רכוז) e é um dos verbos mais importantes
no Antigo Testamento. Moisés, no propósito de formar a identidade do povo de Deus,
utilizava-o com frequência (Êxodo 13.3; Números 15.39-40; Deuteronômio 6.5-9). Há
outras passagens bíblicas que retratam a lembrança de Deus (Gênesis 8.1; 19.29;
30.22). Ele sabe todas as coisas (1 João 3.20).
Assim sendo, poderemos afirmar que Deus nunca esquece, mas,
sim, utiliza de Sua soberania para determinar e agir dentro da Sua vontade.
Ele permite que no Seu silêncio o homem possa refletir nas
suas ações e atitudes. Foi um silêncio providencial de Deus o que se viu no
Egito.
No versículo referenciado, podemos ver o trabalhar de Deus no
meio de Seu povo. A promessa estava de pé, mas Moisés precisava ainda estar bem
preparado, e isso levou quarenta anos no deserto.
O povo de Israel no Egito precisava ver e reconhecer em Deus
a possibilidade de libertação e salvação para eles. Hoje, não é diferente:
quando Deus se cala em nossa vida, é o tempo dEle para nos amar, cuidar e ensinar
a depender só dEle.
por Agissé Levi da Silveira
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