Nas décadas, temos acompanhado, com preocupação, como a nossa sociedade vem adoecendo, especialmente quanto às questões que envolvem relacionamentos interpessoais. E nos dias atuais, em que as postagens em redes sociais são compartilhadas em ritmo acelerado, somos alimentados diariamente por vídeos que causam ainda mais assombro e indignação.
Há pouco tempo, uma postagem movimentou especialistas em direito,
psicólogos, pais, influencers e viajantes. Um vídeo viralizou nas redes sociais
mostrando uma mulher filmada em um avião da companhia Gol por não ceder seu lugar
a uma criança que estava chorando. Contudo, a postagem, feita inicialmente com
o intuito de reprovar a postura da passageira, acabou gerando discussões sobre
a psicologia infantil e a maternidade, os direitos pessoais adquiridos, a exposição
indevida de imagem e o compartilhamento de conteúdos na internet.
Mantendo os limites entre o eu e os outros
A mulher que gravou o vídeo não era a mãe da criança que estava
chorando. Quem gravou foi outra passageira, com a intenção de constranger a
passageira que estava assentada na janela para que esta cedesse seu lugar para
a criança. Ela chega a falar: “Estou gravando a sua cara porque você não tem
empatia com as pessoas...”. Ao chegar em casa, a mulher que gravou o vídeo o
mostrou para a sua filha, e foi então que esta postou o vídeo com um texto
afirmando: “E minha mãe que encontrou uma pessoa sem empatia com criança”.
Vale ressaltar que empatia não é um sentimento, mas um comportamento
intencional de compartilhar vivências. A empatia é uma competência que precisa
ser desenvolvida e exercitada, preferencialmente na infância, apurando a escuta
e o desejo sincero de se colocar no lugar do outro. Assim sendo, ser empático
não é uma atitude determinada pelo sexo ou idade do outro, mas uma decisão interna
racional e inteligente. A empatia requer, portanto, uma análise cuidadosa da
situação do outro, de modo a não reforçarmos atitudes ou sentimentos errôneos, trocando
o bem por mal. Entender isso é importante, pois, num primeiro momento, muitos podem
julgar que a pessoa que filmou teve empatia com a criança, mas o desenrolar da
história mostrou que tanto a mãe quanto a filha que gravaram e postaram o vídeo
se precipitaram quanto ao juízo que fizeram quanto à passageira que não cedeu
seu lugar: Houve invasão nos limites dos direitos do outro, além do fato de que
a intromissão incluiu desdém e agressões morais.
Fato é que são muitos os que se interessam pela vida alheia.
Todos nós convivemos com pessoas que abandonam suas próprias vidas para se
intrometer na vida de outras pessoas, muitas vezes complicando ainda mais as já
complexas relações conjugais, familiares ou profissionais.
Como psicóloga, já atendi inúmeros casais que acabaram se
divorciando por conta de intromissões de terceiros. Alguns ouviram pessoas que
ensinaram inverdades bíblicas, como dizer que mulher evangélica não faz sexo
com marido descrente, contrariando o ensino de Paulo em 1 Coríntios 7.12-14. E
também são muitos os pais que convivem com familiares e professores que
interferem na educação de seus filhos, deformando os valores morais e bíblicos,
e deseducando os filhos que Deus lhes outorgou.
Precisamos avaliar melhor nossos julgamentos sobre o que vemos
ou ouvimos. Necessitamos compreender que há momentos em que precisamos permitir
que casais conversem sozinhos e se acertem. Minha mãe já dizia: “Em briga de
marido e mulher não se mete a colher”. Como psicóloga, sei que a interferência
em casamentos precisa acontecer quando há riscos de agressão física ou forte
abuso moral, mas precisamos deixar espaço para que as pessoas conversem e se
acertem, fazendo seus próprios acordos.
Todos nós temos deveres e direitos, sendo que os nossos
direitos terminam quando começam os dos outros. Portanto, é fundamental que
respeitemos o espaço do outro: o espaço do exercício ministerial e dos talentos
usados na Obra de Deus, que podem ser diferentes dos nossos. O espaço da maternidade
e da paternidade a serem construídas por casais interessados em criar bem seus
filhos. O espaço de uma forma correta, bíblica e lícita, porém diversa, de
pensar, analisar e proceder.
Agir de forma inconsequente, sem analisar antecipadamente e com
clareza as consequências das ações, tem sido uma característica marcante das
redes sociais. Pais postam diversas fotos de filhos pequenos, gerando material para
pedófilos. Viajantes compartilham todos os minutos de viagens, ocasionando
inveja em muitos com quem convivem. E pessoas postam restaurantes, bolsas,
carros e imóveis caríssimos, expondo seus bens e sua moradia, e estimulando
planos maléficos de homens maus.
Infelizmente, no meio chamado gospel, não tem sido
diferente. Há membros de igrejas postando partes de ensinos e/ou pregações fora
do contexto, distorcendo o evangelho genuíno. Encontramos pastores brigando e
denegrindo a imagem de outros pastores ou denominações. E assistimos pessoas
ditas evangélicas que postam atitudes inapropriadas e escandalosas de muitos
que também se intitulam evangélicos, cantores, pastores ou líderes, causando
discussões dentre crentes e descrentes sobre formas de culto, uso indevido de ofertas
e dízimos, e até mesmo sobre doutrinas bíblicas – mesmo a Bíblia nos orientando
sobre não causar escândalos, principalmente entre os descrentes.
A precipitação em julgar, o hábito de se intrometer em causa
alheia ou o vício de ter que postar tudo o que vemos ou fazemos estão gerando
mais escândalos, menos conversões e problemas de relacionamento sérios,
revelando nossa insensatez, nossa sede por desgraças e nosso afastamento de
Deus!
Os limites e regras da boa educação
Não há como educar sem regras e limites expostos de forma clara,
repetitiva e objetiva. E estas regras e limites, quando avaliamos o mundo em
que vivemos, não podem ter como paradigma a cultura pecaminosa, egoísta e inconsequente
dos nossos dias. Afinal, a boa educação sempre será embasada na hierarquia:
sendo bíblica, será a partir de uma premissa dada por Deus e compartilhada geralmente
a partir da família, que é a primeira organização social em que o homem é
inserido para conhecer e treinar suas habilidades e competências morais,
sociais psicológicas e individuais.
A Bíblia afirma de forma categórica e veemente: “A vara da
correção dá sabedoria, mas a criança entregue a si mesma envergonha a sua mãe”
(Provérbios 29.15); “Não evite disciplinar a criança; se você a castigar com a
vara, ela não morrerá. Castigue-a, você mesmo, com a vara, e assim a livrará da
sepultura” (Provérbios 23.13-14). Assim sendo, a disciplina, aplicada a partir
do diálogo, do uso coerente da vara, do castigo inteligente, e do afeto
insistente e direcionado, são importantes para a formação do bom caráter e da
construção de uma vida interior saudável e sociável, em que um indivíduo sabe
apreciar e se conter dentro dos seus direitos e limites.
por Elaine Cruz
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