Como justificar biblicamente o caso da mentira de Raabe para salvar os espias?

Como justificar biblicamente o caso da mentira de Raabe para salvar os espias?


Vemos em Josué 6.22-25 que Raabe mentiu para esconder os espias israelitas e acabou sendo poupada da destruição de Jericó junto com seus familiares. Qual o limite moral em torno da preservação da verdade nas circunstâncias apresentadas pela vida?

As obras de Deus cumprem bem o papel de refletir o caráter dEle, dando testemunho a respeito de quem Ele é (Salmo 19.1; Romanos 1.18-20). Desde que o homem foi criado, Deus tem buscado falar-lhe de diversas formas (Hebreus 1.1). Além disso, as Escrituras são habilitadas a ensinar a respeito de Deus (2 Timóteo 3.16,17), e dentre os muitos princípios divinos por elas apresentados encontra-se o da verdade. Afinal de contas, a Palavra de Deus é a verdade (Salmos 119.160; João 17.17).

Deus ama a verdade e abomina qualquer tipo de engano ou mentira (Provérbios 12.22), verdade que fica ainda mais clara quando consideradas as seguintes informações: a) somente Deus pode conduzir o homem pelo caminho da verdade (Salmos 25.5); b) Deus só aceita ser adorado se a adoração estiver fundamentada na verdade (João 4.23); c) a verdade é instrumento de libertação; d) Jesus se apresenta como a própria verdade; e) somente os que são da verdade estão aptos a ouvir a voz de Jesus (João 18.37); f) a verdade é o caminho eficaz para o crescimento espiritual da Igreja (Efésios 4.15).

Deus ama a verdade. Aliás, Ele é a própria verdade. Entretanto, o texto de Josué 6.22-25 registra que Raabe mentiu na intenção de esconder os espias de Israel, razão pela qual ela foi poupada da destruição que ocorreu em Jericó logo em seguida. Nesse caso, como explicar o limite moral na preservação da verdade em circunstâncias nas quais a vida está em risco?

A resposta a esta questão passa, inevitavelmente, pela compreensão e reafirmação de que Deus abomina qualquer natureza de engano e de mentira, e no caso específico de Raabe esse princípio se mantém. Sendo assim, não foi a mentira dela que a salvou, mas a sua fé em Deus, conforme o seu testemunho aos espias (Josué 2.10,11).

Algo a ser destacado ainda é o testemunho que o escritor da carta aos Hebreus dá de Raabe ao afirmar que foi “pela fé” que ela escolheu proteger os espias, atitude que a protegeu de ter sido morta com o seu povo (11.31). Além disso, Tiago afirma que a sua decisão em proteger os espias foi uma ação resultante da fé (2.25). Portanto, fica evidente que, embora ela tenha sido preservada pelo exército de Israel porque havia – ainda que mentindo – protegido aqueles dois espias, todavia o seu testemunho diante de Deus foi em face à sua fé e não à sua mentira.

Acerca disso, em seu comentário sobre o livro de Josué, Chester O. Mulder oferece uma excelente explicação: “O que se poderia dizer em relação às mentiras que ela disse para enganar os mensageiros do rei (4.5)? Raabe disse abertamente àqueles representantes do palácio real: eu não sabia de onde eram (v.4) e nem para onde aqueles homens se foram (v.5). Primeiramente, é preciso lembrar a situação daquela mulher no momento em que ela recebeu a visita. Talvez ela fosse apenas uma das prostitutas da cidade. Segundo, é preciso reconhecer que a consciência obscurecida só é iluminada gradualmente. Em terceiro lugar, Raabe estava apenas no começo do processo de mudança de todo seu modo de vida; começava a participar da sorte do povo de Deus”.(1)

Deus, certamente, não precisa da mentira e nem do engano de quem quer que seja para fazer alguma coisa ou mesmo preservar a vida de alguém; isto é, por vontade divina, aqueles espias seriam poupados, mesmo que Raabe não lhes desse abrigo. A fé dessa mulher no Deus de Israel foi a causa de sua salvação e do testemunho que alcançou diante de Deus e na história.

Conclui-se, portanto, que não há nenhum limite autorizativo para a mentira, sob quaisquer circunstâncias. É preciso confiar no Deus da verdade e viver em verdade em todo o tempo.

Nota

(1) O. MULDER, Chester. Comentário Bíblico Beacon (Josué a Ester). Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus, 2005, p. 31.

por Elias Torralbo

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