O fator antropológico na adoração bíblica

O fator antropológico na adoração bíblica

A genuína adoração a Deus é motivada por devoção sincera e banhada pela verdadeira piedade, como fruto de um espírito voltado ao Criador. Ao adorador requer-se o exercício da fé para o reconhecimento da glória de Deus bem como de Seu domínio sobre todas as coisas criadas. A adoração deve ser essencialmente um estilo de vida e não se restringir ao momento litúrgico (1 Coríntios 10.31). O Dicionário Teológico (CPAD, 2008) define a palavra adoração como oriunda do latim adorationem, significando veneração elevada que se presta a Deus, reconhecendo-lhe a soberania sobre o Universo, o governo moral, a força de Seus decretos e o Seu redentivo amor através de Jesus Cristo. 

Etimologicamente, tanto a palavra hebraica sãhâ quanto a grega proskyneo denotam o ato de prostração e reverência. A palavra hebraica sãhâ ocorre mais de 170 vezes na Bíblia hebraica. Seu primeiro registro está em Gênesis 18.2, onde lemos que Abraão “inclinou-se à terra” diante dos três mensageiros que anunciaram que Sara teria um filho. MacArthur (2018) conceitua proskyneo como um termo comumente usado no Novo Testamento, significando o ato de “mandar um beijo” ou “beijar a mão”. Por sua vez, a palavra latreuo sugere render honra ou prestar respeito. Ambas as palavras transmitem a ideia de dar, porque adoração é dar algo a Deus.

Desta maneira, entendemos que sob a ótica divina só há adoração de fato quando a criatura se prostra espiritualmente diante de seu Criador, atribuindo a Ele a devida honra. Contudo, a legítima adoração é acompanhada de abnegação e espírito quebrantado por parte do adorador, pois este deve estar disposto a renunciar a si mesmo em favor de Deus (Mateus 16.24; Marcos 8.34; Lucas 9.23; Salmos 51.17). 

Nestes tempos pós-modernos, a adoração está mais ligada a “forma” do que a “essência”. A palavra “adoração” por parte de muitos perdeu sua pureza e sacralidade para assumir ações desprovidas de reverência e temor. Dizem que “quem adora tem tudo”, como se adoração fosse uma forma de barganha com o Todo-Poderoso. Não devemos esquecer que a verdadeira adoração leva o homem a se prostrar reverentemente perante seu Criador e, portanto, não há lugar para a glória e soberba humanas, pois a glória de Deus não é compartilhada (Isaías 42.8). 

Quando o antropocentrismo floresce no arraial dos santos, o perigo de pecarmos na intenção é iminente. Começa-se a ir ao culto “buscar” ao invés de “levar”. É importante lembrar que Moisés, ao repetir a Lei aos ouvidos do povo, declarou que eles deveriam comparecer perante Deus três vezes ao ano nas Festas dos Pães Asmos, das Semanas e dos Tabernáculos, “porém não aparecerá vazio perante o SENHOR; cada qual, conforme o dom da sua mão, conforme a bênção do SENHOR, teu Deus, te tiver dado” (Deuteronômio 16.16,17). A concepção de ir ao culto “para buscar” é egoísta e centrada no homem, pois despreza os parâmetros bíblicos ao adotar formas contemporâneas em detrimento da perfeita vontade do Senhor (Romanos 12.1). Aqueles que vão apenas para “buscar” agem na contramão da genuína adoração e declaram que estão com as mãos vazias. Mãos vazias, por sua vez, denotam uma vida devocional superficial e, desta forma, jamais se vivencia a plenitude da presença de Deus.

É preciso observar que na adoração estão envolvidas a pessoa de Deus e a pessoa do adorador. Deus é adorado por Sua perfeição e glória e não depende em nada do ser humano. Por sua vez, o ser humano, com sua imperfeição e insuficiência, presta a devida honra ao seu Criador sempre em estado de dependência dEle. Nestas condições, evidencia-se o fator antropológico no culto, ou seja, a participação do homem na adoração como aquele que se prostra perante o Todo-Poderoso.

Por outro lado, a história bíblica registra que o homem sempre se reportou a Deus para o adorar ao mesmo tempo em que buscava respostas para seus dilemas e soluções para seus dramas. O homem como adorador possui necessidades físicas, espirituais e emocionais. Sendo assim, a igreja não pode fechar os olhos para esse aspecto da adoração onde o adorador clama pela compaixão divina. A mulher cananeia procurou socorro em Cristo ao mesmo tempo que O adorou: “Então, chegou ela e adorou-o, dizendo: Senhor, socorre-me” (Mateus 15.25). O pai do jovem lunático buscou em Cristo a libertação de seu filho “clamando, com lágrimas” (Marcos 9.24). Um dos exemplos mais evidentes de que o Todo-Poderoso se preocupa com os dramas de Seus adoradores é o caso do cego Bartimeu. Estava este mendigando junto ao caminho quando Cristo passou e ele clamou: “Jesus, Filho de Davi, tem misericórdia de mim!” (Marcos 10.47). Jesus parou a multidão, o chamou e lhe perguntou: “Que queres que te faça?”. Era a declaração de que enquanto adoramos a Deus Ele se compadece e nos atende com Sua benignidade. 

Sabemos que a Palavra de Deus é capaz de ir no mais profundo do ser humano e tratar das questões da alma e do espírito (Hebreus 4.12). O profeta Isaías ratificou essa verdade quando verberou: “[...] assim será a palavra que sair da minha boca; ela não voltará para mim vazia; antes, fará o que me apraz e prosperará naquilo para que a enviei” (Isaías 55.11). Quando necessário for, Jeová Rafha (Yahweh-roph’ekha) agirá para curar as feridas do Seu povo (Êxodo 15.26). Fiquemos tranquilos que o Bom Pastor conhece Suas ovelhas (João 10.14) e o estado delas (Provérbios 27.23).

Não se pode perder o foco nem a motivação correta no momento da adoração, seja na congregação ou até mesmo nas devoções pessoais. Toda liturgia deve conduzir o homem à presença de Deus sem querer inverter os polos na relação com o Criador. As questões emocionais do adorador devem, sim, ser tratadas do púlpito por meio da Palavra, mas também, em outros momentos específicos de aconselhamento, seguidas de visitas. Com o auxílio do Espírito Santo, nossos cultos devem ter como alvo Deus e nossa pregação deve glorificar a Cristo.  A Deus seja a Glória!

por Josiel de Lima Torres

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