Prenúncio de louvores no Monte do Templo

Prenúncio de louvores no Monte do Templo

Quando o rei Davi negociou com Omã, o araúna dos jebuseus, a compra das terras da eira localizada onde, mais tarde, seu filho Salomão ergueria um Templo para Deus, certamente não imaginava a sequência de disputas de que aquele lugar ainda seria alvo. As discussões sobre a legitimidade da posse e da administração do local permanecem atuais e, para confirmar a posição de Israel na questão, o primeiro-ministro Naftali Bennett declarou, nos primeiros dias de Maio, que “todas as decisões sobre o Monte do Templo e Jerusalém serão tomadas pelo governo de Israel, que é soberano sobre a cidade, sem nenhuma atenção e considerações externas”. Opinião diversa possui a Jordânia, que tem solicitado mais controle sobre a cidade e sobre o Monte do Templo, pedidos que apresenta ao governo Biden, juntamente com o pedido de uma delimitação policial mais intensa, o aumento do controle jordaniano no local e a diminuição da presença judaica. Para lembrar, os judeus podem visitar o Monte do Templo, mas seu acesso está restrito a uma única entrada e, mesmo por ela, a segurança não é total, mesmo porque sua presença costuma incitar os ânimos dos árabes presentes.

Sobre as pretensões do Rei Abdullah II, da Jordânia, as opiniões estão divididas em Israel. Mansour Abbas é chefe do partido islâmico Ra’am, integrante do Knesset e parte de uma coalizão com Bennett, mas, quando a questão é o Monte do Templo, está pronto a limitar ou cessar sua coalizão com o primeiro-ministro para defender a guarda jordaniana e o seu poder exclusivo quanto a decisões administrativas. Aryeh Savir, em artigo de 8 de maio para o The Jewish Voice, fez um breve relato histórico que nos ajuda a compreender a ingerência jordaniana sobre o local: “Depois que Israel libertou a Cidade Velha de Jerusalém na Guerra dos Seis Dias em 1967, permitiu que o Waqf muçulmano mantivesse a autoridade sobre o Monte do Templo, onde antes ficavam os dois templos judaicos. Sucessivos governos israelenses permitiram à organização apoiada pela Jordânia um nível de autonomia lá. Ao longo dos anos, o Waqf foi autorizado a implementar políticas que discriminam não-muçulmanos no Monte do Templo. Por exemplo, embora existam muitos portões que permitem o acesso ao local, os não-muçulmanos só podem entrar por um deles. As visitas dos judeus ao Monte do Templo são limitadas no tempo, no espaço, bem como no número de visitantes em um determinado momento. Embora os direitos dos judeus ao culto no local tenham melhorado nos últimos anos, ainda falta muito, e a plena liberdade de culto ainda não foi concedida pelo Estado de Israel aos judeus que visitam o Monte do Templo. Em várias ocasiões, os judeus foram banidos do Monte do Templo após agitação muçulmana ou por temores de que uma presença judaica no local pudesse agitar os muçulmanos. Enquanto os muçulmanos entram livremente no local sagrado, os judeus são rastreados por detectores de metal, passam por buscas de segurança e são proibidos de trazer objetos religiosos judaicos para o local”.

O conceito de ‘waqf’ demandaria uma extensa explanação, o que não é nosso propósito, por isso, mesmo deixando enormes lacunas, apenas para lançar algumas luzes e despertar pesquisas mais aprofundadas, lembramos que o significado é posterior ao advento do Islã na Arábia. No entanto, os fundamentos éticos ligados à caridade e à separação de propriedades com fins religiosos e humanitários estavam presentes nas comunidades da península e apenas foram, mais tarde, normatizados. O conceito de ‘waqf’ sob a lei muçulmana considera a extinção da uma propriedade como posse de um proprietário e sua detenção como propriedade implícita de Deus, de tal forma que seja revertida em benefício de muitos. “Significa, portanto, a vinculação da propriedade à propriedade de Deus, o Todo Poderoso, e a devoção dos lucros em benefício dos seres humanos” (sugiro a leitura do trabalho de Aparajita Balaji, “O conceito de Waqf sob a lei muçulmana”). O ‘waqif’ seria o administrador responsável pelo território separado; os elementos principais do ‘waqf’ seriam: a propriedade de Deus, a extinção do direito do fundador e o benefício da humanidade.

Estivéssemos tratando apenas de conceitos éticos e sua normatização, não contemplaríamos as seguidas divergências e violências relativas ao território sagrado. Jerusalém é, para os judeus, sua capital eterna e indivisível, enquanto árabes reivindicam a cidade como capital de um futuro Estado. Portanto, não estamos tratando apenas do uso comum de um território pertencente a Deus, mas da definição da existência ou não de dois estados soberanos, tendo Jerusalém como sua capital. Em 2018, o Parlamento de Israel aprovou lei que dificulta a cessão de qualquer parte da cidade em acordos de paz. A lei foi aprovada por uma maioria de 64 parlamentares contra 52 e a legislação definida aumentou para 80 o número de votos necessários para aprovar a entrega de alguma porção da cidade a “uma parte estrangeira”. O Knesset é composto por 120 assentos e o número de 80 permissões para que uma conceção de terra aconteça é praticamente impossível. Por isso, a deputada Shuli Moalem Rafaeli confirmou, na ocasião, que “o objetivo do projeto é evitar concessões nas negociações diplomáticas”. Shuli pertence ao Lar Judaico, partido de extrema direita israelense. Também se pronunciou o então ministro da educação Naftali Bennett: “nós asseguramos a unidade de Jerusalém”. Já o oposicionista Dov Henin declarou ser aquela a “lei para impedir a paz”. Dov faz parte da Liga Árabe Unida. Naquele mesmo ano, o presidente Trump havia tomado a decisão unilateral de reconhecer Jerusalém como capital israelense, suscitando na ONU a rejeição de tal reconhecimento em sua Assembleia Geral.

Quatro anos depois, o debate prossegue e a recente declaração do hoje primeiro-ministro Bennett demonstra firme disposição: “Certamente rejeitamos qualquer interferência estrangeira nas decisões do governo israelense. É claro que o Estado de Israel continuará a manter uma atitude respeitosa para com os membros de todas as religiões em Jerusalém, como fizemos e continuaremos a fazer. Jerusalém Unida é a capital de apenas um estado – o Estado de Israel”.

Há algo, no entanto, que precisa ser considerado quando tratamos do Monte do Templo: aquela propriedade é de Deus. Sim, toda a Terra a Ele pertence, mas, por aquisição, dedicação, confirmação e, sobretudo, escolha, o local foi estabelecido para o culto ao Seu Santo Nome. A presença inegável da Glória selou a dedicação feita pelo filho de Davi e as promessas relativas ao futuro incluem a propriedade e estabelecem sua destinação. Não acredito que as partes discutam a propriedade de Deus, apenas alteram pressupostos importantes: não há que se fazer pertencer, pois já pertence; não há possibilidade de extinção do direito do proprietário, pois aquela propriedade especificamente não é de Israel, mas de Deus, sendo Israel responsável, como povo sacerdotal, por seu cuidado e manutenção; o território adquirido não o foi para o benefício da humanidade, intenção louvável, porém equivocada – aquela propriedade foi adquirida para o culto ao Senhor de todas as terras e de todos os homens, HaShem, diante de quem todos devem prestar louvores.

Juízes da História talvez concluam que Israel cometeu um erro em 1967, durante a Guerra dos Seis Dias, ou em 1980, quando anexou a cidade, contra a opinião internacional. Mas é necessário lembrar que o assunto Jerusalém sempre permaneceu sendo uma pendência diante das cortes internacionais, como um assunto delicado, a ser resolvido nas – sempre futuras – negociações de paz. Deixando o juízo, consideremos a possibilidade de até mesmo Israel compreender que o pedacinho de terra mais cobiçado dentre toda a extensão de nossa casa comum seja objeto do cuidado particular de Seu Verdadeiro Possuidor.

Deixando de lado o calor das discussões e as mentiras narradas nos últimos dias (os ‘coquetéis’ lançados não o foram na direção da Mesquita Al-Aksa, mas na direção contrária, portanto, de dentro da Mesquita para fora) que somente acirram ânimos, uma palavra de esperança precisa ser proferida: quando o culto ao Eterno for restabelecido no lugar que Ele escolheu na Terra, gente de todos os povos para lá acorrerá, sem barreiras, sem impedimentos, sem constrangimentos, entoando louvores ao Senhor em todas as línguas de todas as nações – ouvir-se-ão louvores em árabe, ouvir-se-ão louvores em hebraico – e o coração do Altíssimo se alegrará.

Por, Sara Alice Cavalcanti.

Se você gostou deste artigo compartilhe com seus amigos.

Comentário

Seu comentário é muito importante

Postagem Anterior Próxima Postagem