A festa junina e a cultura idólatra

A festa junina e a cultura idólatra

No Brasil e em alguns países da Europa, junho é o mês de Festa Junina, um grande evento de origem católica, influenciado pelo paganismo do povo Celta, que celebrava o solstício de verão próximo ao dia 20 desse mês. Aqui cabe uma pergunta: Seriam os festejos de “São João” prejudiciais a nós, evangélicos, ou deveríamos aproveitá-los para nos alegrarmos em família, como, aliás, fazemos por ocasião do Natal? A bem da verdade, alguns poucos evangélicos que se opõem ao Natal afirmam que não devemos tomar parte em quaisquer festejos religiosos, inclusive os natalinos, exatamente porque se relacionam com a idolatria romanista. Neste artigo, demonstrarei que há uma diferença importante entre as festas do Natal de Jesus e as de “São João”.

A despeito de todo o mês de junho ser festivo, a principal celebração da Festa Junina é a do nascimento de João Batista, em 24 de junho. O motivo para essa celebração é aparentemente justificável, já que se convencionou celebrar o Natal seis meses após o nascimento do precursor de Cristo (cf. Lucas 1.26,36). Alguns católicos acreditam, inclusive, que Isabel, a mãe de João Batista, acendeu uma fogueira para avisar Maria de que seu filho nascera. Ao longo dos séculos, outras práticas pagãs foram sendo adicionadas, como a dança de quadrilha e as roupas caipiras (de origem francesa, possivelmente) etc. A rigor, deixando de lado o paganismo, não haveria problema em nos lembrarmos de João Batista. Mas alguns segmentos evangélicos resolveram ir além: incorporaram à sua liturgia a Festa Junina, adotando quase todos os seus elementos idolátricos, mas chamando-a, jocosamente, de “Festa Jesuína, sem João, mas com Jesus”.

Por que seria um erro ficarmos ao redor de uma fogueira comendo milho e bebendo quentão, sem álcool (é claro)? Não deveríamos distinguir a origem idolátrica da idolatria propriamente dita? Na verdade, nesse caso, o problema não recai apenas na origem dessa festa, que, sem dúvida, é pagã. A Festa Junina não é inofensiva; por trás de fogueira e danças divertidas há, por exemplo, as comidas oferecidas a “São João”, as missas, as rezas, as procissões e os pedidos feitos a santos católicos, como se estes fossem mediadores. Para nós, o único Mediador é o Senhor Jesus (1 Timóteo 2.1-6). Estamos em um país livre, e os católicos têm o direito de celebrar suas festas, ainda que as consideremos idolátricas. Mas, por que nós, que nada temos com a liturgia romanista, deveríamos participar de Festa Junina ou querer imitá-la?

Embora saibamos que determinadas práticas e costumes pagãos já estão incorporados à nossa cultura, é importante termos maturidade para distinguir o simples contato com costumes de origem idolátrica da prática real da idolatria e da associação com o que é pagão. O que é idolatria? De acordo com 1 Coríntios 10.7,14 e 1 João 5.21, à luz do Decálogo (cf. Êxodo 20.4), o termo “idolatria” é uma transliteração da palavra grega eidololatria, a qual denota: “adoração a ídolos; adoração a imagens como divinas e sagradas. [...] Idolatria, então, é prestar honras divinas a qualquer produto de fabricação humana, ou atribuir poderes divinos a operações puramente naturais”.(1) Para os destinatários originais da Lei mosaica, a idolatria se restringia à adoração aos deuses de ouro, prata, madeira, barro etc. No Novo Testamento, esse conceito foi ampliado (Gálatas 5.20; 1 Coríntios 5.11), já que todo e qualquer tipo de idolatria é vedado ao povo de Deus. A avareza, por exemplo, é retratada como uma forma de idolatria (Efésios 5.5), um sentimento que impede o ser humano de amar a Deus sobre todas as coisas (Mateus 19.24; Lucas 12.16-21; 1 Timóteo 6.10).

Há que se observar, entretanto, que o pecado da idolatria nunca é praticado de modo inconsciente. Quem idolatra as riquezas (Mamom) ou o mundo, como se fossem deuses, mesmo por ignorância, faz isso de maneira intencional e objetiva (cf. Mateus 6.19-24; 2 Timóteo 4.9), colocando, de modo consciente, deuses no lugar do Todo-poderoso (1 João 2.15-17; Tiago 4.4-8). Nesse caso, se a idolatria é um pecado praticado conscientemente, por que chamar de prática idolátrica o simples ato de se sentar ao redor de uma fogueira para comer milho e pipoca no mês de junho? Afinal, se pode argumentar que a origem da festa é pagã, mas o cristão não pratica idolatria quando não emprega os elementos da Festa Junina de modo idolátrico. Paulo encontrou questionamentos similares aos nossos na igreja de Corinto. Havia ali festivais pelos quais os pagãos ofereciam dádivas aos seus deuses nos templos daquela cidade.

Como Paulo orientou os crentes que vieram do paganismo e estavam acostumados a participar de festas tradicionais? Ele os orientou a não mais visitar o templo pagão para, ali, tomar parte dos festejos comendo carne, especialmente, já que isso seria, objetivamente, parte do culto aos deuses (1 Coríntios 10.19-23). À luz dessa orientação, claro está que, durante o mês de Festa Junina, seria considerado, no mínimo, flerte com a idolatria um crente, conhecedor das Escrituras, visitar igrejas católicas ou quaisquer outros lugares onde há rezas, missas e invocações a santos etc.

Alguém poderá perguntar: “Se um colega de trabalho me convida para o aniversário de seu filho, em sua casa; e, ao chegar lá, percebo que a decoração da festa remete a ‘São João’, sugerindo que tudo ali foi oferecido a ídolos, o que fazer?” Considerando a liberdade que temos em Cristo, Paulo explica que, nesse caso, o crente só não deveria comer o que se oferece na festa caso houvesse ali um cristão fraco que pudesse se escandalizar (1 Coríntios 10.27-31). Esse ensino paulino exemplifica o que dissemos acima: só existe idolatria quando esse pecado é praticado de modo objetivo e consciente. Mas note que a questão de fugir da aparência do mal (cf. 1 Tessalonicenses 5.22) não deve ser desprezada, visto que as comidas típicas do mês de junho estão associadas ao paganismo romanista.

Outro ponto importante: é comum encontrarmos nos mercados, especialmente no mês de junho, guloseimas “idolátricas” que muitos de nós apreciamos: milho, doces de amendoim, pipoca, pamonha etc. O que fazer? Mais uma vez recorramos à resposta de Paulo aos coríntios, segundo a qual, podemos comer, sem perguntar nada, de tudo que se vende no mercado, pois isso não escandaliza a ninguém (1 Coríntios 10.25,26).2 Se Paulo enfatizou a liberdade cristã, permitindo aos coríntios que comessem carne que possivelmente vinha dos templos pagãos para os mercados, ressalvando apenas o cuidado para não escandalizar os irmãos mais fracos, o que isso nos ensina quando à Festa Junina? Ensina-nos que o problema está relacionado, prioritariamente, à associação com o que é idolátrico, e não com a prática da idolatria, propriamente dita.

Vemos uma diferença abissal entre os festejos natalinos e joaninos. Nos primeiros, ainda que haja elementos que, em sua origem, apontem para o paganismo (a própria data não é, de fato, a do nascimento do Salvador), o Natal de Jesus deve ser celebrado por todos os cristãos, visto que seu sentido transcende qualquer idolatria. Já o “São João” não é uma festa de toda cristandade (o que também vale para Carnaval e Halloween), e sim uma festividade eminentemente pagã, não somente em sua origem. Como a Festa Junina preserva os rituais de invocação a João Batista e as comidas oferecidas a ídolos, o crente em Jesus, ainda que não seja idólatra, caso se associe a quem (ou ao que) é pagão, dá mau exemplo para os novos na fé (cf. 2 Coríntios 6.11-18). Portanto, nem tudo o que é lícito convém ou glorifica a Deus (1 Coríntios 10.23,31).

Notas Bibliográficas

(1) PFEIFFER, Charles F. et al. Dicionário Bíblico Wycliffe. 1. ed. Rio de Janeiro: CPAD, 2006. P. 944.

(2) HODGE, Charles. A Commentary on 1 & 2 Corinthians. 1. Ed. Carlisle, PA: Banner of Truth, 1857. P. 193-4.

Por, Ciro Sanches Zibordi.

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