A tradição judaica extra-bíblica era extremamente rigorosa em relação ao uso ou não do fermento. De acordo com a Enciclopédia Judaica na noite precedente da Páscoa, é exigido de todo lar judeu que observe, o que denominam de cerimônia do Bedikat Chametz, isto é, a “A Busca do Fermento”. O ritual extremamente meticuloso orienta o chefe da família a andar por toda a casa a procura de pedacinhos de pão fermentado — o “chametz”, durante os dias que dura a cerimônia pascal. O propósito de tal rito é certificar-se de que somente o “matzar”, isto é, o pão sem fermento pode ser comido. O cerimonial detalha ainda que aquele que foi encarregado dessa missão deve munir-se de uma vela, uma colher de pau, e um espanador de penas de galinha ou de ganso para que caso encontre algum resíduo de pão possa espanar para dentro da colher. Tendo feito isso então ele pronuncia a bênção: “Abençoado seja tu, (...) que ordenaste que removêssemos o fermento”. No dia seguinte ele queima o fermento encontrado! Se porventura alguém fosse encontrado com fermento durante esse período era punido com a pena de 39 chicotadas! O ritual, portanto, era em extremo rigoroso no antigo judaísmo a ponto dos utensílios da cozinha serem banhados em água fervente, ou vigorosamente esfregados na areia.
Embora essa tradição hebraica revele vários aspectos de um judaísmo posterior, e que em muitos aspectos difira dos costumes adotados pelo cerimonial mosaico (Êxodo 12), todavia mostra como o povo judeu ao longo do tempo levou a sério a simbologia por trás do uso do fermento em suas cerimônias religiosas. No contexto bíblico observamos que o uso do fermento possui dois sentidos:
1) Um sentido prático ou literal — o pão recém preparado era posto em contato com um restante de massa fermentada deixada de uma porção anterior que posto com a nova massa passava a fermentar tudo. Os textos de Êxodo 12.15, 34 e 39, revelam que a pressa dos israelitas saírem do Egito não deixou tempo suficiente para o pão inchar e dessa forma eles levaram consigo os objetos de fazer os pães, tais como gamelas e amassadeiras. O ritual judaico que mandava lançar fora no décimo quarto dia do primeiro mês todo o fermento estocado em casa e a comer pão sem fermento por sete dias, se originou na saída dos israelitas no êxodo. Posteriormente esse evento foi usado como símbolo para ensinar os israelitas que haviam saído do Egito que eles precisavam abandonar as práticas relacionadas à velha vida para abraçar a nova — a entrada na terra da promessa.
2) O sentido metafórico ou figurado — aqui o fermento é um símbolo do bem ou do mal. Neste aspecto tanto o uso como o não uso do fermento vem carregado de valor ético e de significado religioso. Está relacionado, portanto, com a moralidade.
O hebraico “mahmetset, um termo derivado de “hames”, possui o significado de qualquer coisa fermentada. O significado desse termo que foi emprestado para à religião é que o fermento deve ser excluído de certas práticas religiosas dos hebreus. Dessa forma o uso do fermento passou a ser sinônimo de corrupção e impureza.
De fato encontramos esse sentido nos ensinos de Jesus (Mateus 16.2; Marcos 8.15). Warren W. Wiersbe comenta que o fermento é tido como um símbolo do pecado porque fica escondido, trabalha de forma silenciosa e secreta; possui uma enorme capacidade de se espalhar, poluir e fazer com que a masca inche. Essa figura do inchaço da maça é usado por Paulo com o sentido de “ensoberbecer-se” (1 Coríntios 14.18; 5.2). Observa-se ainda no Novo Testamento que esse sentido aplicado ao uso do fermento é usado por Jesus e Paulo tanto para se referirem ao falsos ensinos (Mateus 16.6-12; Marcos 8.15; Gálatas 5.19), como à hipocrisia e a uma vida de pecado (Lucas 12.1). É nesse sentido que encontramos o apóstolo Paulo exortando a igreja a buscarem uma vida pura e se apresentarem diante de Deus como “um pão sem fermento” (1 Coríntios 5.6-8).
O Comentarista Bíblico John J. Davi, ainda comentando sobre esse sentido ético do fermento, destaca que o uso do fermento conforme estipulado em Levítico 2.4,6.16 e 7.12, possui uma conotação ética. Era excluído do ritual porque o seu processo sugeria corrupção e dessa forma o seu sentido também estava ligado à impiedade.
Por, José Gonçalves.
Se este artigo foi útil para você compartilhe com seus amigos.
Postar um comentário
Seu comentário é muito importante