Lembremo-nos dos encarcerados

Lembremo-nos dos encarcerados


Ao analisarmos o contexto bíblico do versículo “Seja constante o amor fraternal. [...] Lembrem-se dos presos, como se estivessem na cadeia com eles; dos que sofrem maus-tratos, como se vocês mesmos fossem os  maltratados”  (Hebreus  13.1,3),  percebemos que o texto vai além de uma simples lembrança. A palavra “lembrar” aqui implica agir e se envolver com uma fé ativa na vida daqueles que estão encarcerados. A Igreja de Cristo é chamada a ser um instrumento de transformação e restauração, levando esperança e auxílio aos presos.

O apóstolo Paulo e os cristãos: prisioneiros de Cristo

O apóstolo Paulo foi prisioneiro várias vezes e durante muitos anos (2 Coríntios 6.5). Boa parte das cartas e epístolas que ele escreveu o fez na prisão. Elas são denominadas de “epístolas da prisão”. Mesmo preso injustamente, Paulo encarava seu aprisionamento não como um infortúnio, mas como um privilégio e prova de seu  amor  pelo  Evangelho  (Filipenses  1.14). Ele mesmo se considerava um prisioneiro de Cristo (Efésios 3.1; Filemon 1.1,9; 2 Timóteo 1.8). Além dele, a Bíblia relata que muitos irmãos estiveram presos por causa do seu testemunho de Cristo, bem como o próprio Jesus que, antes de ser crucificado, passou algumas horas preso.

Estes enfrentaram condições insalubres, falta de higiene, violência, fome, frio e solidão. Os prisioneiros eram mantidos em celas escuras, úmidas e sujas, sem ventilação, sem iluminação, sem condições de higiene e sem alimentação adequada; eram expostos a doenças, pragas, vermes e ratos; eram maltratados pelos carcereiros e pelos outros presos.

Acredita-se que no mundo hoje há 360 milhões de cristãos que são perseguidos por causa do Evangelho. De cada sete cristãos, um sofre perseguição; ou seja, 14% dos cristãos, dos quais boa parte sofre encarceramento. Em 2022, havia 9.801 casos conhecidos de cristãos presos, sequestrados ou desaparecidos no mundo, mas não há um número exato de quantos cristãos estão encarcerados atualmente, pois muitos casos são ocultos ou não registrados pelas autoridades. Acredita-se que a China e o Paquistão são os países que mais possuem encarcerados pelo Evangelho.

A Coréia do Norte é o número um na posição de países que mais perseguem os cristãos. Na América Latina o país que mais persegue os cristãos é a Colômbia, ocupando o 22º lugar na posição mundial.

A Igreja precisa lembrar-se de todos os presos

A Igreja de Cristo é chamada a demonstrar amor e compaixão por todos os presos, independentemente das circunstâncias que os levaram à prisão. Seguindo o exemplo de Cristo, a Igreja se preocupa com os marginalizados e pecadores. Ela se lembra dos que estão presos injustamente, como se aprisionados com eles. Ela também precisa fazer tudo o que estiver ao seu alcance para defendê-los, libertá-los e restaurá-los. Ela também se lembra dos que estão presos justamente e deve fazer tudo o que estiver ao seu alcance para evangelizá-los, discipulá-los e reintegrá-los. Ela lembra-se que todos os presos são seres humanos, criados à imagem e semelhança de Deus.

A Igreja é chamada a oferecer apoio espiritual, emocional e material, promover a reinserção social, lutar por justiça e condições humanas dentro do sistema prisional e cuidar daqueles que estão presos injustamente. Isso significa se lembrar das injustiças presentes no sistema judicial. A Igreja tem o papel de denunciar abusos e lutar por uma justiça verdadeira e imparcial.

O  que  Jesus  disse  tem  um  sentido profundo: “Então o Rei dirá aos que estiverem à sua direita: ‘Venham, benditos de meu Pai! Venham herdar o Reino que está preparado para vocês desde a fundação do mundo. Porque tive [...] preso, e foram me ver’” (Mateus 25.34-36). E Ele prossegue afirmando: “O Rei, respondendo, lhes dirá: ‘Em verdade lhes digo que, sempre que o fizeram a um destes meus pequeninos irmãos, foi a mim que o fizeram’” (Mateus 25.40).

No contexto, Jesus não manda perguntar primeiro se o necessitado de algum cuidado prisional era cristão ou se seria um cidadão de bem. Jesus simplesmente afirma que os que se importam com os “pequeninos” receberiam o Reino por herança. “Pequeninos” refere-se à pessoa de menor importância, sem qualificações ou mesmo tão insignificante que seria desprezível. Assim, vencendo preconceitos, os pequeninos de Jesus incluem os presos, de maneira que devemos demonstrar compaixão por eles.

A motivação para o cuidado para com quem está preso não parte de qualquer mérito, mas, sim, da motivação gestada pelo amor, para com todo e qualquer prisioneiro, como no caso dos cristãos perseguidos por causa do Evangelho em países onde o Cristianismo é restrito e proibido, bem como de prisioneiros criminosos que, aos olhos da sociedade, não merecem nenhum cuidado. Devemos nos lembrar destes do mesmo modo que Jesus, que cuidou do ladrão da cruz que estava ao Seu lado e também recebia publicanos e pecadores, comendo com eles (Lucas 15.1, 2).

Essa motivação de cuidado e amor foi o que levou Frida Vingren a trabalhar com presidiários no Brasil durante a década de 1920, oferecendo-lhes apoio emocional, espiritual e material. Ela tinha uma visão social e humanitária, que a levava a se preocupar com os marginalizados e excluídos da sociedade; acreditava que o evangelho poderia transformar a vida das pessoas, independentemente de sua condição ou passado. Seguindo seu exemplo, várias igrejas evangélicas do Brasil têm trabalhos nas penitenciárias e nos presídios atualmente.

A situação dos presídios no Brasil é um grave problema social e de direitos humanos. Segundo os dados mais recentes, o país tem a terceira maior população carcerária do mundo, com cerca de 750 a 900 mil presos, mas apenas 437 mil vagas nos estabelecimentos penais. Isso significa que há uma superlotação de quase 60% nas prisões, o que gera condições precárias e insalubres para os detentos. A superlotação dificulta a garantia dos direitos básicos dos presos, como alimentação, saúde, higiene, educação, trabalho e assistência jurídica. Além disso, favorece a violência, as rebeliões, os maus-tratos e a proliferação de doenças contagiosas. Muitos presos  também  sofrem  com  a  demora na tramitação dos processos judiciais, sendo mantidos em prisão provisória por tempo indeterminado que, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), representam 41,5%. A maior parte dos presos no Brasil são pessoas negras (68%), com idade até 29 anos (43%) e poucos têm a Educação Básica completa (apenas 8%).

De acordo com a compaixão de Jesus e o Artigo 5º da Constituição Federal, é importante a Igreja fazer uma abordagem espiritual ativa e se lembrar de todas as situações que atentam contra a dignidade humana presente nos Evangelhos, se envolvendo espiritualmente, judicialmente, socialmente e politicamente, bem como fomentando a necessidade dos cristãos em posição de lideranças governamentais criarem políticas públicas que vão ao encontro do que Jesus faria pelos presos, aliado ao fato de que o pentecostalismo, com seu foco na atuação do Espírito Santo, pode influenciar a transformação social e individual.

Referências

LACERDA, Lucas. Com 832 mil presos, Brasil tem maior população carcerária de sua história. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano>. Acesso em: 25 nov. 2023.

PORTAS  ABERTAS.  Lista Mundial de Perseguição 2023. Disponível em: https://online.flippingbook.com/view/873345429/. Acesso em: 23 nov. 2023.

SPAGNA,  Julia  Di.  Sistema carcerário brasileiro: entenda a situação dos presídios no país. Disponível em: https://guiadoestudante.abril.com.br. Acesso em: 23 nov. 2023.

VINGREN, Frida. Frida Vingren: Uma biografia da mulher de Deus, esposa de Gunnar Vingren, pioneiro das Assembleias de Deus no Brasil. Rio de Janeiro: CPAD, 2014.

por Claiton Ivan Pommerening

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