Quando o Eterno confronta seus escolhidos

Quando o Eterno confronta seus escolhidos

Que houvesse uma hospedaria no deserto, na região entre Midian e Mizraim (Egito) não chega a parecer estranho. Não sabemos se ela já existia nas décadas anteriores, quando Moisés deixou a terra de seu nascimento e terminou por encontrar as tendas de Jetro, que viria a ser seu sogro, mas o texto de Êxodo 4.24 faz-nos cientes desse conforto para o viajante quando o filho de Anrão e Joquebede é comissionado a dirigir-se a Faraó para requerer a libertação dos hebreus. Para o hóspede, no entanto, a experiência revela-se perigosa e transformadora. Lá na hospedaria o Eterno marcara um encontro com Moisés. Ali, no caminho, estando o homem empenhado em fazer o que lhe fora ordenado, a justiça de Deus o alcançaria.

São muitas as discussões a respeito do gesto de Zípora ao circuncidar o filho e a narrativa parece remontar a tradições midianitas antigas, pois apenas essas explicariam o fato de uma mulher tomar a iniciativa da consagração do filho varão. As dúvidas estendem-se a respeito da causa, do sentido exato das palavras da mulher e até mesmo sobre quem seria o esposo sanguinário, uma vez que, naquelas regiões, na antiguidade, o termo noivo ou esposo poderia ser atribuído ao menino de dois ou três anos ainda não circuncidado. No entanto, o Targum de Jerusalém e o Targum de Jônatas concordam em que o ocorrido resume um rito de expiação da culpa de Moisés pela não observância do ato de obediência requerido por Deus aos filhos de Abraão. Como seria possível falar em nome dAquele que se apresentou como o Elohim de Abraão sem, primeiramente, cumprir o que fora ordenado ao patriarca. No dizer de André Chouraqui em seu comentário, “ninguém pode reclamar uma tradição sem começar por obedecê-la”.

A passagem deixa, ainda, outra severa advertência, qual seja a de que não adianta – apenas – fazer aquilo que nos foi ordenado por Deus, mas importa fazê-lo segundo e de acordo com a Sua Palavra. No Reino do Deus puro e santo a quem servimos, meios não justificam fins e intenções valem tanto quanto os atos em si. O Eterno contempla o coração dos homens antes de contemplar o resultado das obras de suas mãos. A determinação de livrar o povo do Egito seria cumprida pelo método divino e era necessário que o instrumento humano do qual Deus se valeria fosse-lhe, em tudo, sujeito. Ainda que se advogue que o libertador não estivesse consciente da gravidade do descuido, atraso ou desobediência, tal desconhecimento não lhe valeu como escudo e pôs em perigo sua própria vida. Um legislador precisa ser, primeiramente, um cumpridor das leis.

Israel possui um ‘príncipe’, um ‘nasi’ ou presidente, que detém as funções de chefe de estado e que representa a democracia parlamentar que é o Estado de Israel nos deveres formais e cerimoniais. No site da Embaixada de Israel no Brasil encontramos a explicação de que “o cargo simboliza a unidade e a soberania do Estado”. Sendo o chefe do Sinédrio, supremo órgão judicial do povo judeu, evoca a unidade da nação, como valor posto acima dos partidos políticos. O presidente é eleito por seu histórico pessoal, segundo os critérios do prestígio e da contribuição para o crescimento e desenvolvimento de Israel, com um mandato de sete anos. Hoje, Reuven Rivlin ocupa a posição, tempo por porta-voz Yuli-Yoel Edelstein.

O primeiro-ministro é o chefe do parlamento unicameral, com posto por 129 membros operando em reuniões plenárias e através de 12 comitês. Sua sede encontra-se em KiryatHaMemshalah, em Jerusalém. Os membros do ‘knesset’ são escolhidos para mandatos de quatro anos em eleições nacionais e costumam agrupar-se partidariamente em coalisões para decidir sobre os principais assuntos. Cabe ao primeiro-ministro a administração dos assuntos internos e externos do Estado e é de suma importância que obtenha para seus atos a aprovação do ‘knesset’, por vezes prejudicada pelos arranjos das citadas coalisões. Ocupa o cargo de primeiro-ministro de Israel nosso visitante recente, Benjamin Netanyahu. Podemos somar às atribuições do primeiro-ministro a de articulador dos partidos políticos locais, procurando manter e criar o espaço necessário para que os projetos nacionais possam ganhar concordância que leve à execução. 

Tenha sido para o premier israelense a nossa humilde hospedaria como aquela na qual Moisés pernoitou – um lugar de confronto. Se algo nos judeus temos aprendido ao longo dos séculos é a não desprezar as lições da História. Se algo o Brasil pode ensinar, ainda contando perdas, é o resultado de nossa história recente, quando as necessidades nacionais se tornaram sujeitas aos ditames de partidos políticos, mais interessados em seu papel na agenda internacional do que com o bem de sua própria gente. A recente guinada política revelou apenas um pouco da dura realidade de uma nação saqueada pelas vis estratégias globalistas e socialistas, que ignoraram os desejos e necessidades mais básicas do povo que aos políticos confiou voz e ação. Mais terrível o quadro se torna quando entendemos que o passo a passo dessa desconstrução da nacionalidade foi ocultado por uma imprensa comprometida com o mesmo projeto, ou vendida conscientemente aos prazeres dos luxos que a ela foram conferidos. Dura lição, triste prova, mas importante testemunho.

Netanyahu teve a oportunidade de ouvir o suspiro de um povo e inferir sobre as grossas cadeias que o detinham. O primeiro-ministro hospedou-se conosco num alegre momento de renovação de esperança. Sobre a esperança Israel pode dar-nos lições. Permitiu-nos o Senhor oferecer a Israel uma lição outra: a de que as vontades das pequenas bandeiras e facções não podem suplantar o bem da pátria; a de que a política externa precisa ser suprapartidária e jamais comprometer os conceitos de soberania, segurança e bem comum. Afinal, é vetado ao legislador ou ao representante de um povo que tem sobre ele uma legislação violar aquilo que defende e representa. Tão jovem é o Estado de Israel para perder-se em discussões partidárias que coloquem em risco sua segurança e existência! Tão antigo é Israel a ponto de ter uma história e tradição que remonte aos tempos de Abraão e de Moisés, tempos em que Deus ia ao encontro de um homem e fazia com que ele mudasse o seu proceder, tempos em que o Senhor fazia juízo a nações, tempos em que legislar e cumprir a justiça eram sinônimos. O Eterno não mudou. Esses tempos são hoje e já. Ele há de encontrar-nos no caminho.

por Sara Alice Cavalcanti

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