Hungria toma posição a favor de Israel

Hungria toma posição a favor de Israel


Corria o século dezoito, quando o Rabino Isaac Taub de Kalov (1751-1821) ouviu, nas terras da Hungria, uma canção, entoada por um jovem pastor, e identificou nela uma das melodias cantadas no antigo Templo de Jerusalém. Tendo comprado a canção, acrescentou às palavras tradicionais em iídiche chassídico algumas outras em hebraico.

Também reconheceu, na letra original que retrata a história de um pássaro multicolorido, uma parábola sobre o exílio do povo judeu e a importância de esperar que Deus aja, interferindo na História e fazendo justiça ao Seu povo. Diz um trecho da canção: “Espere, passarinho, espere! Espere, passarinho, espere! Até que Deus decida que é o momento certo, então você irá para casa. Quando será? Mas quando será? Quando o Templo for reconstruído e, então, a cidade de Sião for preenchida. É quando será. Por que está demorando tanto? Por que está demorando tanto? Por causa dos nossos pecados, fomos exilados de nossa terra, é por isso que é. Por causa dos nossos pecados, fomos exilados de nossa terra, é por isso que é” (Trad. De Yitzchak Kolakowskii).

A canção – Szol a Kakas Más – é, hoje, considerada o “Hino Nacional” dos judeus húngaros e revela o anseio de um povo pelo retorno a Sião e pela chegada do Messias. Os cerca de 80 mil integrantes da comunidade judaica da região, ainda que se dividam em ortodoxos, neologs e status quo, são unânimes em expressar sua esperança através dos tristes acordes da melodia.

Foi a partir da destruição de Jerusalém e a dispersão que se seguiu que os judeus ocuparam as terras da Europa. Passaram por um longo processo de assimilação, até o século dezenove. Após o Holocausto nazista, o comportamento ganhou características mais próximas ao ocultamento de origens, por questões de proteção, o que dificulta encontrar o número exato dos componentes da comunidade judaica húngara nos dias atuais. Houve um tempo, no passado, em que os judeus se organizavam conforme a região ocupada. Dessa forma, os Oberlanders eram os que se fixaram nas terras altas do Oeste, semelhantes aos judeus da Áustria e da Alemanha; já os Unterlanders residiram nas planícies orientais e alinharam-se às comunidades chassídicas da Galícia. Embora os primeiros judeus fossem de origem sefarditas, depois de sua dizimação, no fim do Império Otomano, os atuais judeus húngaros têm origem asquenazita e falam o iídiche. Quando considerada a presença judaica na região precisam ser consideradas as terras da Ucrânia, Romênia, Eslováquia, Áustria e Sérvia, naquilo que é chamado de Hungria Judaica.

O país em questão tomou lugar de destaque nos últimos dias após seu posicionamento contra uma decisão do Tribunal Penal Internacional (Haia), do qual é signatário do documento fundador, o Estatuto de Roma. O TPI reúne 124 países, todos, em teoria, obrigados a seguir suas determinações. No entanto, a aplicação está sujeita à colaboração dos Estados-membros. O não cumprimento de qualquer determinação faz com que o caso seja remetido de volta à assembleia dos Estados-membros do TPI e, em última instância, encaminhado ao Conselho de Segurança da ONU.

Estados Unidos, China, Israel e Irã não são signatários do TPI. A Rússia, outrora participante da assembleia (2000), retirou-se em 2016 por conta de acusações referentes à guerra contra a Criméia. Em março de 2023, o tribunal emitiu mandado de prisão contra Putin, acusando-o de crimes de guerra pela deportação de centenas de crianças da Ucrânia. Emitida uma ordem dessa natureza, o TPI obriga todos os países signatários a entregar qualquer indivíduo à prisão caso ele pise em seu território. Deve, então, enviá-lo à corte. Karim Khan, promotor do TPI, anunciou os mandados de prisão do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, além do ministro de defesa de Israel e de três líderes do Hamas. Como Israel não está sujeito ao Tribunal, tal pena não foi reconhecida pelo país. O espanto deveu-se a que a Hungria, país fundador do TPI, tenha formalizado convite, no dia seguinte ao mandado de prisão, para que Netanyahu visitasse seu território. Foi a primeira viagem do premier a um país europeu desde 2023. Na Hungria, foi recebido com honras militares pelo primeiro-ministro húngaro, Viktor Orban, que criticou a decisão da corte, classificando-a como uma intervenção “num conflito aberto por razões políticas”. O chefe de gabinete de Orbam, Gergely Gulyas, anunciou que o país está “deixando o TPI”, e que, em breve, “o governo iniciará o processo de retirada, de acordo com o marco legal internacional”. A decisão de Budapest foi considerada por Netanyahu como “corajosa” e ambos os países concordam em que o Tribunal tem comportamento político corrupto e antissemita.

Ainda que a decisão não tenha partido da comunidade judaica húngara, que representa apenas cerca de 1% da população, é preciso lembrar que 60% dos ganhadores húngaros do Prêmio Nobel fazem parte desse pequeno grupo, num singelo exemplo da cooperação inegável ao desenvolvimento humano nas mais variadas áreas do conhecimento. Naquelas terras onde se entremeiam histórias doces e terríveis, os filhos de Abraão têm construído um legado para a humanidade, aguardando o momento de partir para uma terra ainda mais desejada.

O jovem pastor insistia em que o pássaro esperasse até que o Senhor decidisse sobre o momento de voltar para casa. É hora. É hora de os judeus húngaros retornarem a Sião. A Europa, casa provisória de tantas peregrinações, ainda que, eventualmente, aja em defesa dos judeus, está fortalecida por pensamentos antissemitas, prontos a emergirem em atos cruéis. É tempo de voar.

Voa, pássaro, o Senhor é contigo e pleiteia tua causa. Quando as vozes de acusação se multiplicam, um sopro de justiça vem alentar Sião e renovar as esperanças em seu futuro. Mas a resposta ao mundo e a efetiva justiça, somente o Ungido trará. É tempo de aguardá-lo nas terras do Oriente. E que o Deus de Israel derrame Suas bênçãos sobre a Hungria.

por Sara Alice Cavalcanti

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