Mantendo o compromisso com os fundamentos doutrinários pentecostais

Ao chegarmos à celebração do Centenário do Movimento Pentecostal no Brasil, chegamos também a um tempo de maturidade, de avaliação, de revisão de nossa teologia. Queiramos ou não, esse é um tempo em que a igreja de Cristo deve refletir, histórica e teologicamente, sobre o seu papel no mundo em que vivemos.

Chegamos hoje ao Movimento Pentecostal moderno como um dos grandes acontecimentos do século 20. Ele surgiu com um pequeno grupo de pessoas interessadas em tornar o cristianismo anêmico e seco em um cristianismo forte e espiritual com as mesmas características da Igreja Primitiva. Esse pequeno grupo começa um movimento espiritual com ênfase na liberdade do Espírito Santo para operação de sinais e prodígios e a manifestação dos dons espirituais no começo do século 20. Um vento espiritual soprou na Europa foi para os Estados Unidos da América do Norte, cresceu e se tornou uma força significativa dentro da cristandade.

O surgimento do Movimento Pentecostal moderno inicia-se em janeiro de 1901, na cidade de Topeka, Kansas, EUA, quando Agnes Ozman experimentou o batismo com o Espírito Santo manifestado com o falar em línguas entre tantos outros. O movimento espiritual de caráter pentecostal vinha sendo experimentado com intensidade desde 1850, mas foi a partir da experiência da senhora Ozman, que era aluna da Escola Teológica de Charles F. Parham, chamada Charles Parham's Bethel College, que o Movimento ganhou força. Foi nesta Escola que abriu-se no coração de Parham o desejo de conhecer mais profundamente a experiência do batismo com o Espírito Santo com o falar em línguas como evidência externa desse batismo. Posteriormente,  Parham abriu uma Escola Bíblica em Houston, Texas, e foi através dela que surgiu o pregador do movimento de santidade (Movimento Holiness) chamado William J. Seymour pregando a mensagem pentecostal. Depois de dois anos ali, Seymour foi para a Califórnia. Em 1906, em Los Angeles, após ter sido rejeitado pelos líderes do Movimento Holiness, Seymour começou a realizar reuniões de oração na famosa Rua Azuza, tornando-se, a partir de então, o grande popularizador do Movimento Pentecostal. Pessoas de várias partes dos EUA e de outros países visitavam a igreja da Rua Azuza, espalhando a chama pentecostal no mundo inteiro.

A partir desse movimento, o Espírito Santo inflamou o coração de homens e mulheres, os quais passaram a levar a mensagem pentecostal pelo mundo. Foi desse modo que o Espírito Santo trouxe para o Brasil alguns homens, entre os quais Gunnar Vingren e Daniel Berg, de nacionalidade sueca, mas vindos dos EUA em 1910.

O Movimento Pentecostal moderno, portanto, tem suas raízes no final do Século 19, quando cristãos desejosos por uma vida de santidade e espiritualidade plena entraram no século 20 com força total rompendo com as amarras eclesiásticas e denominacionais que impediam a operação livre do Espírito Santo nas igrejas.

Fundamentos

A palavra fundamento ganha um sentido especial na linguagem bíblica. Ela pode referir-se a “tudo aquilo em que se assenta alguma coisa”, e pode significar “motivo, razão, base, alicerce etc”. Em ambos Testamentos, essa palavra ganha significados distintos, com linguagem literal e figurada, mas é no Novo Testamento que a palavra grega themélios surge com o sentido figurado de alicerce (Lucas 6.48,49; Romanos 15.20; 1  Coríntios 3.10-12; Efésios 2.20 e outros). Neste artigo, a palavra se refere aos princípios fundamentais do Evangelho e aos ensinos dos apóstolos e profetas (Hebreus 6.1,2 e Efésios 2.20).

Da palavra fundamento deriva outra palavra que é fundamentalismo. Esta última tem servido para significar movimentos radicais, especialmente no mundo religioso. O fundamentalismo tem sido identificado como um movimento contra o liberalismo. Do ponto de vista positivo, o fundamentalismo preserva os princípios básicos da fé, para os quais se atribui o termo conservadorismo. Não é só no mundo religioso que se vê o fundamentalismo. Também existem outras formas de fundamentalismo: o cultural, o político e o religioso.

Desenvolveu-se no mundo moderno uma cultura extremista e negativa quanto ao termo fundamentalismo, mas é necessário que se coloque cada coisa no seu lugar. Nas últimas décadas, por exemplo, o islamismo é apresentado pela mídia mundial como uma religiosidade extremista e violenta. Na historia do cristianismo, no período da chamada “santa inquisição” da igreja romana, cometeram-se atrocidades e guerras em nome de Cristo que eram, de fato, fruto de uma espécie de fundamentalismo fanático e brutal. Entretanto, a despeito de distorções acerca dessa palavra, não podemos fugir ao fato de que o verdadeiro fundamentalismo cristão refere-se à defesa dos pontos considerados fundamentais da fé cristã.

Em relação ao pentecostalismo, nossa preocupação está, essencialmente, em preservar os fundamentos teológicos da fé pentecostal contra o espírito do liberalismo teológico e contra as influências filosóficas e místicas que deturpam a genuinidade e simplicidade do Evangelho que pregamos.

O fundamento principal da fé pentecostal

O ponto de partida para respondermos a essa pergunta está em dois textos do Novo Testamento: Mateus 16.18 e Efésios 2.20. No primeiro texto, o Senhor Jesus se identifica como “a pedra principal” sobre a qual toda a Sua Igreja seria edificada. No segundo texto, o apóstolo Paulo reforça a construção desse edifício declarando que o mesmo seria edificado sobre “o fundamento dos apóstolos e dos profetas”.

Na construção doutrinária da igreja, as doutrinas da fé cristã seriam edificadas sobre “o fundamento” de tudo quanto os apóstolos receberam de Cristo. Esse fundamento é a teologia cristã e sobre o mesmo todas as verdades do Evangelho de Cristo seriam construídas. Essas verdades se constituem de elementos doutrinários de nossa crença cristã. Ele, Jesus, é o que edifica e Ele mesmo é a pedra principal desse edifício. Nós, os crentes, somos pedras vivas edificadas sobre Ele. No texto de Efésios 2.20, encontramos o termo “fundamento dos apóstolos e dos profetas”. Que fundamento é esse? É todo aquele material que os apóstolos receberam pessoalmente de Cristo. Não havia diferença entre o que Jesus ensinou e o que Seus discípulos passaram a ensinar, porque eles foram comissionados a ensinarem a mesma doutrina. À doutrina dos apóstolos não era a doutrina particular de Pedro, de João, de Tiago, nem, posteriormente, de Paulo ou Apolo, mas era a mesma doutrina ensinada por Jesus. Os ministros de Deus têm a missão pastoral de ensinar a mesma doutrina dos apóstolos. Ninguém tem o direito de torcer a verdade revelada nas Escrituras, mas deve construir a doutrina sobre o mesmo fundamento, sem “colocar outro fundamento além do que já está posto”.

O Movimento Pentecostal não é uma nova doutrina nem alguma inovação teológica. O Movimento Pentecostal é um movimento de renovação espiritual que existe dentro da Igreja de Cristo na Terra e que dá lugar ao Espírito Santo, que tem sido relegado por grupos cristãos, dando lugar a uma eclesiologia humanista e seca. O movimento não é outra igreja, mas é a mesma do Dia de Pentecostes procurando preservar os mesmos princípios que nortearam a Igreja Primitiva, dando lugar ao Espírito Santo para reger a Igreja de Cristo. Quais os principais elementos do pentecostalismo?

Quando falamos de fundamento nos referimos à base de sustentação de uma construção. Em relação às doutrinas bíblicas que regem a nossa fé e o comportamento ético cristão, nos referimos, de fato, aos elementos teológicos que são os pilares (colunas, baluartes 1 Timóteo 3.15) que dão equilíbrio e sustentação às paredes (“pedras vivas”- 1 Pedro 2.5) construídas para dar forma e beleza arquitetônica.

Em relação aos fundamentos doutrinários pentecostais, nos referimos aos elementos constitutivos da fé cristã, ou seja, as doutrinas principais que norteiam o autêntico pentecostalismo. Esses elementos formam o pensamento pentecostal acerca de, pelo menos, seis doutrinas principais. Às demais doutrinas estão atreladas a estas seis, porque são como afluentes de um mesmo rio caudaloso. Estas seis principais doutrinas dão corpo à teologia pentecostal:

1) A Doutrina da Revelação e Inspiração plena das Escrituras, como base da fé pentecostal (2 Timóteo 3.14-17; Hebreus 4.12; 2 Pedro 1.21).

2) A Doutrina da Salvação, mediante a justificação pela fé na obra expiatória de Cristo. Uma doutrina que envolve três outras tão importantes como justificação, regeneração e santificação (Romanos 5.1; Tito 3.5; João 3.3; 1 Tessalonicenses 4.3,4; 2 Coríntios 7.1; Hebreus 4.12).

3) À Doutrina do Batismo com o Espírito Santo, com a evidência física do “ falar em línguas espirituais”, como experiência distinta da obra regeneradora do Espírito Santo, e como uma experiência contínua desde o Pentecostes (Atos 2.4,38; Atos 11.12-17).

4) A Doutrina dos Dons Espirituais, como dotações do Espírito Santo aos crentes, para edificação da Igreja, em termos de fé e unidade (Romanos 12.6-8; 1 Coríntios 7.7; 1 Coríntios 12.1-11,28-31; Efésios 4.11-13; 1 Pedro 4.10,11).

5) A Doutrina da Cura Divina mediante a operação sobrenatural do Espírito Santo para curar os enfermos (Marcos 16.17,18; 1 Coríntios 12.8-10).

6) A Doutrina da Segunda Vinda de Cristo, precedida pelo Arrebatamento dos vivos e a Ressurreição dos mortos em Cristo, antes da Grande Tribulação (Zacarias 14.5; 1 Tessalonicenses 4.16,17; 1 Coríntios 15.51-54; Apocalipse 20.4).

Essas doutrinas formam o “fundamento da fé pentecostal” sem menosprezar todas as demais doutrinas bíblicas. Elas, tão somente, são a maquinaria do Espírito Santo para fazer a Igreja viver e cumprir sua missão.

Ameaças corrosivas aos fundamentos

Torna-se inevitável para o chamado “pentecostalismo clássico”, ou seja, o pentecostalismo bíblico, refutar toda e qualquer ideia de doutrina que possa corroer os fundamentos do pensamento pentecostal. O apóstolo Paulo deparou-se com esse problema naqueles dias de seu ministério e, então, exortou os efésios : “Olhai, pois, por vós e por todo o rebanho que o Espírito Santo vos constituiu bispos, para apascentardes a igreja de Deus, que ele resgatou com seu próprio sangue. Porque eu sei isto: que, depois da minha partida, entrarão no meio de vós lobos cruéis, que não perdoarão o rebanho. E que, dentre vós mesmos, se levantarão homens que falarão coisas perversas, para atraírem os discípulos após si”, Atos 20.28-30.

Já naqueles tempos da igreja do primeiro século, os líderes enfrentavam problemas de ordem doutrinária no seio da igreja. Eram novas doutrinas insufladas com heresias perigosas advindas do gnosticismo da época e eram cheias de persuasões que desviavam muitos cristãos da fé genuína em Cristo. Surgiam de homens malignos, que Paulo os compara a lobos cruéis que entravam no seio da igreja para destruírem as ovelhas do rebanho de Cristo. Eram pessoas sem escrúpulos e capazes de subverter crentes e obreiros imaturos com ideias bonitas, conceitos triunfalistas e a comercialização das coisas do Evangelho.

Doutrinas como confissão positiva, maldição: hereditária, doutrina da prosperidade, falsa teologia da fé, utilização de hipnose e regressão, o sopro de poder, a unção do riso, unção do leão, unção do cordeiro, doutrina do pacto do segredo, a supervalorização de símbolos e tipos em detrimento da literalidade da Palavra de Deus, a espiritualidade egolátrica etc são problemas que enfrentamos em nossos dias. O pentecostalismo autêntico (clássico) refuta essas idéia do chamado neopentecostalismo. O pentecostalismo autêntico se firma sobre os fundamentos bíblicos da Palavra de Deus e rejeita toda e qualquer ideia que esteja fora da Revelação Bíblica.

Queremos uma igreja atual que mantenha seus vínculos com a história. Queremos uma igreja contextualizada com os fundamentos da Palavra de Deus. Queremos uma igreja cheia do Espírito e que fuja dos excessos do neopentecostalismo.

Por, Elienai Cabral.

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