O termo “cultura” é derivado do latim colere, que literalmente traz o significado de “cultivo”, “cuidado com as plantas, com os animais e tudo o que se relaciona com a terra, como a agricultura”. O seu significado abrange também a palavra “culto”, relacionada à crença em determinados deuses. Da palavra cultura vem o termo “puericultura”, porquanto está relacionada com a educação das crianças e seus cuidados (ARANHA; MARTINS, 2009, p. 409). Em resumo, o conceito etimológico da palavra cultura é um tipo de humanização que se encontra constantemente em um estágio de processo dando sentidos e significados, significados que tanto esclarecem a modificação aplicada ao mundo e às pessoas que convivem nele.
À medida que o curso da história foi se desenrolando, foram
se formando grandes tradições que construíram e marcaram civilizações
conhecidas até hoje, como as civilizações grega, ocidental e chinesa. Ao longo
da história, homens como Alexandre, o Grande, implantavam a cultura helênica através
da espada. Do mesmo modo, nações como Roma implantavam seu império e cultura
com o poder bélico. Só que quando Roma conquistou a Grécia, foi a Grécia que
envolveu os romanos na sua filosofia, ética, moral e até mesmo na sua religião
politeísta. Paroschi (2012) disse: “Quando
a Grécia caiu sob o domínio
romano, foi Roma que acabou sucumbindo ante a influência da cultura e dos ideais
gregos” (PAROSCHI, 1012, p. 7). Foi assim que surgiu a cultura greco-romana.
Foi em meio a essas duas culturas fundidas que o
cristianismo, através dos seus pregadores, teve o grande desafio e o trabalho
de se expandir, influenciando com a sua cultura o paganismo das nações
provinciais envolvidas na cultura greco-romana. As nações pagãs, uma vez feitas
províncias do Império Romano, começaram a serem impactadas com outra cultura,
desta vez totalmente projetada dentro dos aspectos morais e éticos e
espirituais do cristianismo. E isso somente passou a acontecer quando a Igreja
de Cristo saiu dos limites geográficos de Israel.
Com esse avanço do cristianismo em boa parte do Oriente e em
todo o Ocidente, criou-se uma cultura exatamente fundamentada nos ensinos de
Cristo Jesus, onde o amor a Deus acima de todas as coisas e ao próximo foram
difundidos através dos séculos, o que terminou formando tradições e marcando antigas
e atuais civilizações, em especial a região ocidental.
Os ensinos teológicos de Paulo, espalhados sistematicamente
por suas cartas, estão fundamentados categoricamente na teologia de Cristo.
Tem-se o exemplo de ensinamentos éticos: 1 Coríntios 9.14 com Mateus 10.10 e com Lucas 10.7; 1 Coríntios 7 com Marcos 10.2-12; Romanos 12.14
com Lucas 6.28; Romanos 13.7 com Marcos 12.17; Romanos 14.13 com Mateus 7.1 e
com Lucas 6.37. Esses textos paulinos em paralelo com os ditos de Jesus são
apenas uma pequena parte de uma vasta gama de provas de outros textos éticos de
Paulo fundamentados nos ensinos de Cristo e assim transmitidos metodicamente
aos povos gentílicos para a formação de suas culturas.
Quando os primeiros cristãos saíram dos limites geográficos
de Israel, em contraste com o politeísmo, eles pregavam e ensinavam a respeito
de um único Deus (1 Coríntios 6.4-6). Antes, em Israel, sua mensagem era para
monoteístas como eles. Logo, a pregação missionária cristã no mundo gentílico
não podia ser simplesmente o querigma cristológico; ela teve que começar antes com
o anúncio do único Deus. O trabalho missionário cristão alcançou aquelas
camadas em que o politeísmo ainda era uma força viva (BULTMANN, 2008, p.108).
Os missionários cristãos, depois de desembarcarem no mundo
gentio,, em sequência se depararam com cultos prestados a vários deuses com
apresentações cerimoniosas litúrgicas por prostitutas em atos sensuais e
pornográficos. A comunidade cristã, então, veio falando sobre os tempos da
ignorância (Atos 17.30; Efésios 4.18). Quando Paulo chega à cidade dos
tessalonicenses, encontra um cenário totalmente idólatra com relação a deuses
falsos e mortos, pois a sua mensagem em primeira instância foi anunciada com a
temática de um único Deus vivo e verdadeiro (1 Tessalonicenses 1.9). Do mesmo
modo em uma cidade grega por nome Corinto, onde pregou alertando que seus
deuses eram mudos. O apóstolo lhes apresentou um Deus que fala mediante a revelação
de Seu Filho (1 Coríntios 12.2). Ainda em Corinto, o apóstolo dos gentios
proclamou em meio àquela gente que por trás de seus ídolos havia demônios (1 Coríntios
10.19,20). Na cidade da Galácia, situada na região da Ásia menor, Paulo pregou
para os gálatas afirmando que seus ídolos não eram deuses, mas invenções e criações
da mente humana (Gálatas 4.8).
Além de as mensagens cristãs estarem em contraste com o politeísmo,
elas revelavam Deus como o Criador e Arquiteto do universo. Por sua vez, quem
garantia essa revelação era o Antigo Testamento, a Bíblia usada até então pelos
primeiros cristãos. A tradução das Escrituras veterotestamentárias, até muitas
vezes usada pelos apóstolos para recitar seus textos no Novo Testamento, era na
realidade a Septuaginta (LXX). Era um texto traduzido do hebraico para o
grego por 70 grandes eruditos judaicos a mando de Ptolomeu Filadelfo entre 275 e
250 a. C. Segundo a lenda, esses mestres, em dupla, foram confinados em quartos
ou salas separadas para produzirem o texto grego, e quando saíram foi constatado
como um milagre, pois haviam produzido respectivos textos semelhantes. “A lenda
é, sem dúvida, incorreta, pois é muito mais provável que a tradução fosse feita
para o uso de colonizadores judeus no Egito do que meramente como um artigo de
colecionador para alguma biblioteca” (MERRILL, 2010, p. 39). Os ensinos dos
cristãos a respeito do Messias
baseados nos textos sagrados judaicos fez surgir os ensinos morais e éticos da
cultura judaico-cristã.
Paulo sempre procurava apresentar aos povos das religiões politeístas
um único Deus e Criador. Atenas, capital da Grécia, foi um desses lugares onde
ele apresentou esse ensino. Lucas, em Atos dos Apóstolos, narrou quando Paulo
se encontrou cercado por uma grande quantidade de ídolos (Atos 17.10-34). A
cidade estava dominada pela idolatria (17.16). Vincent (1834-1922) registrou as
seguintes palavras: “Plinio nos informa que, na época de Nero, Atenas continha mais
de três mil estátuas públicas, além de um número incontável de imagens menores,
no interior de casas particulares. Deste número, a grande maioria em estátuas
de deuses, semideuses ou heróis. Em uma rua, havia, diante de cada casa, uma
coluna quadrada, que sustentava um busto do deus Hermes. Outra rua, chamada de
Rua dos Trípodes, era margeada por trípodes, dedicados a vencedores dos jogos nacionais
gregos, e ostentando, cada uma delas, uma inscrição a uma divindade. Cada porta
e cada pórtico tinha seu deus protetor. Cada rua, cada praça, ou melhor, cada
canto da cidade tinha seus santuários, e um poeta romano notou amargamente que
era mais fácil encontrar deuses em Atenas do que homens” (Davies apud
Vincent, 2012, p.437).
Com seu espírito revoltado em meio àquela terra de deuses,
Paulo pregava para os judeus em sinagogas e para os gregos em ágoras. Os judeus
falavam muito de ressurreição, mas pouco da imortalidade, e os gregos acreditavam
no fim do corpo e na imortalidade da alma. Sobretudo, o apóstolo mostrou a
superioridade do cristianismo em comparação à religião judaica e ao paganismo grego,
no sentido de não só acreditar na ressurreição do corpo, mas na sua
imortalidade (Atos 17.17,18,31).
Em meio àquela grande quantidade de ídolos, Paulo encontrou
um altar atribuído ao “Deus Desconhecido” (17.23). O Deus Desconhecido era uma forma
dos gregos dizerem que ainda poderia haver outras divindades e, para evitarem
supostas maldições, levantaram um altar a esse deus. Sabiamente, então, Paulo
aproveitou a oportunidade para descortinar o entendimento sobre o Deus do qual
pregava – Ele era o Criador do mundo (17.24), o que refutava duas classes de
filósofos: os epicureus e os estoicos (17.18). Os primeiros, além de
acreditarem na aniquilação da alma por intermédio da morte, ainda eram ateus,
no sentido de não acreditarem na providência e na supremacia divina. Os
segundos eram panteístas, pois acreditavam que o mundo era Deus. Logo, Paulo,
para refutar os epicureus, disse que Deus existe e é o Provedor e o supremo
Criador de tudo, assim como ao mesmo tempo refutou os estoicos quando afirmou
que Ele não é o mundo, mas o Criador e o Governador deste.
Os deuses das nações politeístas eram ídolos limitados, no
sentido de atuar apenas em determinadas funções. Com relação aos deuses da Grécia
não eram diferentes, pois cada um atuava limitadamente em cidades ou
equivalentes áreas da vida, por isso a superstição e a crença dos gentios em
grande quantidade de deuses. Porém, Paulo, para refutá-los, disse que o Deus Desconhecido
o qual ele pregava havia, através de um homem, criado toda a raça humana (17.26).
Em outras palavras, o apóstolo estava falando do poder ilimitado desse Deus.
Enquanto os respectivos deuses gregos se prendiam em atuar apenas em
determinados pontos da vida do ser humano e da natureza, o Deus Desconhecido de
Paulo era Deus para cada situação da vida.
A cultura cristã, uma vez formada no Ocidente, está sendo
modificada hoje, pois os povos de culturas de outras religiões estão invadindo as
nações e as transformando com sua cultura religiosa pagã. Isso não é uma
previsão, mas o pluralismo religioso já é uma realidade nos países cristãos,
porque, de acordo com acumulação de estrangeiros de outras religiões em nações
cristãs, estão aos poucos mudando a característica da formação da cultura nesses
países em que predominava antes o cristianismo. Em muitos países, o crescimento
da diversidade empírica de religiões e ideologias está, em parte, ligado aos
novos padrões de imigração (com frequência de suas ex-colônias) e com o
declínio geral da influência da tendência judaico-cristã na visão de mundo e
nos valores (CARSON, 2013, p.16).
A predominância do pluralismo religioso nos países cristãos
resultará na mudança do conceito de tolerância religiosa. E aquilo que já era
difícil em relação à proclamação do Evangelho se tornou mais difícil ainda, porquanto
o pluralismo propaga que não existe mais o absoluto, mas tudo é interpretado
dentro do subjetivo. Isto é, não tem uma única religião verdadeiramente
correta, mas todas do aspecto de vista dos seus respectivos devotos podem ser
verdadeiras. Ao contrário das outras religiões, o cristianismo ensina que a Salvação
não se encontra no esforço da pessoa, mas, sim, na graça de Deus manifestada na
pessoa bendita de Cristo Jesus. Então, o que a Igreja deve fazer com a pregação
do Evangelho, se todas as religiões são supostamente tidas como verdadeiras no
sentido de seus valores éticos, morais e espirituais? Na realidade, o único
meio para quebrar este pluralismo religioso é a Igreja acreditar no poder da
Palavra, pois ela é a única que tem o poder para transformar vidas e culturas
(Romanos 10.17; Hebreus 4.12).
Referências bibliográficas
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando.
Introdução à Filosofia. São Paulo: Editora Moderna, 2009.
CARSON, D. A. Deus Amordaçado. O Cristianismo Confronta o
Pluralismo. São Paulo: Editora Shedd, 2013.
BLOMBERG, Craig L. Questões Cruciais do Novo Testamento.
Rio de Janeiro: editora CPAD, 2010.
BULTMANN, Rudolf. Teologia do Novo Testamento. Santo
André, SP: Editora Academia Cristã, 2008.
DAMIÃO, Valdemir. História das Religiões. Sua Influência
na Formação da Humanidade. Rio de Janeiro: Editora CPAD, 2010.
LATOURETTE. Kenneth Scott. Uma História do Cristianismo.
Volume 1. São Paulo: Editora
Hagnos, 2006.
PAROSCHI, Wilson. Origem e Transmissão do Texto do Novo
Testamento. Barueri, SP: Editora Sociedade Bíblica do Brasil, 2012.
por Natanael Diogo Santos
Compartilhe este artigo. Obrigado.
Por favor, esse artigo foi publicado em qual ano?
ResponderExcluirObrigado.
Este artigo foi originalmente publicado no MP em junho de 2019
ExcluirA paz do Senhor!
ResponderExcluirQuando esse artigo, O EVANGELHO E A FORMAÇĀO DE CULTURA, foi publicado no Jornal Mensageiro da Paz?
OBRIGADO.
Por favor, você poderia me enviar a foto da primeira capa jornal e a página que saiu esse artigo. Obrigado. Mande para esse email: natanaeldiogosantos64@gmail.com
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